domingo, 2 de maio de 2010

Autor fala do show de James Brown no dia do assassinato de Luther King; leia prefácio

06/04/2010 - 09h16
Autor fala do show de James Brown no dia do assassinato de Luther King; leia prefácio
da Livraria da Folha

Vinte e quatro horas após o assassinato de Martin Luther King, em 4 de abril de 1968, James Brown fez o que sabia de melhor: pegou o microfone e foi à luta. Embora o clima estivesse quente em Boston --com inúmeros focos de revolta contra a morte do líder pacifista negro, o cantor insistiu em subir ao palco, tentando acalmar os ânimos na cidade.

Divulgação

Com show, Brown garantiu a paz no dia da morte de Luther King

O saldo daquele dia, nos Estados Unidos, foi de mais de 40 mortos, centenas de feridos e 20 mil presos. Mas, na capital de Massachusetts, cenário de históricas disputas raciais, o cantor soube fazer prevalecer a paz em um show corajoso e eletrizante.

Centrado nesse concerto inesquecível, o livro "O Dia em que James Brown Salvou a Pátria" reconstrói a vida e a carreira do pioneiro do funk nos Estados Unidos, com destaque para uma faceta pouco conhecida: a relação entre Brown, o movimento pelos direitos humanos e as lideranças negras naquele período conturbado da história americana.

Leia abaixo o prefácio do livro assinado pelo rapper Chuck D, do grupo Public Enemy.

*
Prefácio

Lembro do impacto inicial que o Poderoso Chefão do Soul teve sobre mim. Ainda consigo me ver, com meus colegas do ensino médio, escorregando e patinando nos trechos congelados da rua no inverno do Queens, Nova York. O que nos dava equilíbrio era o ritmo de "James Brown", a dança que Mister JB dizia ter criado para finalizar sua apresentação de "There Was a Time". A energia da música de Mister JB correspondia ao vigor compacto de crianças a escola primária que correm livremente. Basta enfileirá-las no corredor do pátio e abrir a porta. Elas não têm a menor ideia de aonde vão - simplesmente correm. Para mim, isso descreve a força de James Brown. É, James
Brown era um homem adulto, mas possuía a centelha ilimitada de uma criança.

Meus pais tinham muitos discos guardados. Era um casal de negros descolados de vinte e poucos anos, soltos numa época turbulenta. Os álbuns, encomendados de clubes de discos, chegavam aos pacotes pelo correio. Havia vários LPs de jazz e soul. Os de James Brown eram multicoloridos, cortesia do departamento de arte da King Records. Eles praticamente pulavam para cima da gente, mas não chegavam tão perto quanto o grito de JB e aquele trecho só de percussão no meio do álbum. James Brown se destacava do conjunto - pelo visual e pelo som.

Minha avó assinava as revistas Look e Life. Ela e meu avô costumavam amontoar revistas, não discos. Foi a Look que fez a pergunta a respeito de Mister JB: seria ele "o negro mais importante dos Estados Unidos"? A capa era azulada. Isso foi precisamente na metade da Guerra do Vietnã, logo depois dos assassinatos de Martin Luther King e de Robert Kennedy. Ainda havia uma lúgubre reverberação dos assassinatos do presidente John F. Kennedy e de Malcolm X poucos anos antes. O país precisava desenvolver uma linguagem comum sobre a loucura vigente - por que ela não poderia vir de ícones culturais que todos ouviam? Mas, no encalço das revoltas de Newark e Detroit, creio que a dança nas ruas não poderia ser oferecida ao povo pela Motown, pela Stax ou pela Atlantic, tampouco por qualquer outro artista, a não ser JB.

Depois de lançar "Say it Loud - I'm Black and I'm Proud", o governo - especialmente o de J. Edgar Hoover - começou a entender a importância de JB por várias razões, boas e más. O fato de prefeitos, políticos, militares, presidentes e vice-presidentes procurarem JB, enquanto as estações de rádio e o meio musical hegemônico o excluíam, foi de uma ironia inacreditável. Aquela canção sozinha conferiu a Mr. JB sete afortunados anos de amor por parte da comunidade negra, o que não é fácil de conseguir.

Em minha humilde opinião, imediatamente após o assassinato de Martin Luther King, James Brown se tornou o negro mais importante dos Estados Unidos. Os negros estavam em busca de muitas respostas em seguida ao festival de confusões de 1968. Todos os americanos, perplexos, procuravam respostas, mas a disposição dos negros estava em sintonia com Nat Turner.*

Eu soube do show no Boston Garden muito depois de ele ter ocorrido. Com sete anos e vivendo em Nova York, as notícias que chegavam para mim diziam mais respeito aos assuntos da cidade e a seu próprio potencial explosivo. Não fui muito à escola naquela semana. As novidades de Boston chegavam muito mais tarde, ainda mais numa época em que a ênfase estava nas notícias locais, havendo apenas um espaço rápido a cada noite para notícias do país e do mundo. Nos esportes, o Celtics voltou atrás na contratação de Wilt,** do Philadelphia 76ers, mas quando Bill Russell, primeiro técnico de basquete negro, pôs a culpa no racismo, aumentou a especulação de que haveria agitações locais, pois os negros estavam cansados das "branquelices" da Nova Inglaterra.

Hoje vivemos tempos bem diferentes, e não digo isso do ponto de vista racial. Refiro-me à tecnologia. Televisão a cabo, documentários, DVDs, discos e vídeos piratas, YouTube e internet têm permitido que milhares de pessoas vejam a energia do show daquela noite no Boston Garden. Até hoje penso que aquilo foi uma transmissão ao vivo destinada a manter as pessoas fora das ruas de Beantown (Boston). A paranoia ia imperar até que se encontrasse uma resposta - pelo menos era o que eu achava.

Para mim, o show de James Brown representou e ainda representa o incrível poder da música e da força de vontade para cessar tudo em nome da alegria de se divertir. As imagens reproduzem a tensão de um furacão Katrina dos anos 1960. Hipnótico. Paralisante. Provocador. E ainda assim ele parou e conquistou a todos com "Think" - como ainda haveria de acontecer com muitos outros sucessos de James Brown.

Não há dúvida de que o Poderoso Chefão do Soul fazia as vezes do Príncipe da Paz numa época de caos. De fato, ainda nos curvamos diante dessa extraordinária apresentação cujo signifi cado aumenta a cada década.

CHUCK D, Public Enemy

*
"O Dia em que James Brown Salvou a Pátria"
Autor: James Sullivan
Editora: Jorge Zahar Editor
Páginas: 208
Quanto: R$ 39,00
Onde comprar: pelo telefone 0800-140090 ou na Livraria da Folha.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/livrariadafolha/ult10082u716497.shtml

Procuradora é indiciada por tortura qualificada e racismo

29/04/2010 17h41 - Atualizado em 29/04/2010 20h11

Procuradora é indiciada por tortura qualificada e racismo
As penas são de dois a oito anos e de um a três anos de prisão.
Em depoimento de quase três horas, ela negou acusações.
Aluizio Freire
Do G1 RJ

A procuradora de Justiça aposentada Vera Lúcia de Sant’Anna Gomes, acusada de maus-tratos a uma menina de 2 anos, foi indiciada nesta quinta-feira (29) pelos crimes de tortura qualificada e racismo. A informação é da delegada Monique Vidal, titular da 13ª DP (Copacabana), onde a procuradora prestou depoimento por quase três horas.

As penas para os crimes são de dois a oito anos e de um a três anos de prisão. Segundo a polícia, a procuradora nega as acusações.

De acordo com a delegada, o laudo complementar que ela pediu ao Instituto Médico Legal (IML) mostra que a criança sofreu multiplicidade de lesões, em dias diferentes, e por meio cruel.

Já o crime de racismo, segundo a delegada, foi configurado pela forma como a procuradora se referia aos seus empregados.

Ela chegou à delegacia por volta das 14h45, acompanhada de seu advogado, Jair Leite, sem falar com a imprensa. Ao deixar o local, por volta das 17h30, a procuradora foi agredida por cerca de 30 pessoas que faziam um protesto na porta da delegacia. Em meio ao tumulto, ela foi xingada e chegou a ser agredida com um guarda-chuva nas costas.

Ela confirmou chamar a menina de cachorrinha
Acompanhada do advogado, Jair Leite Pereira, a procuradora aposentada não quis falar com a imprensa na saída da delegacia. Em depoimento, ela negou todas as acusações, segundo a delegada Monique Vidal. O inquérito será encaminhado ao Ministério Público estadual (MP) nesta sexta-feira (30).


A procuradora prestou depoimento por quase três
horas (Foto: Wilton Júnior/AE)“Ela negou tudo, disse que desconhece as fotos apresentadas. Apenas confirma ter xingado a menina de cachorrinha, o que ela diz não ser nada demais porque ela gosta muito de cachorro. O resto ela negou”, afirmou a delegada.

Monique Vidal ressaltou ainda que fez questão de ouvir todas as pessoas, inclusive mandando uma equipe para tomar depoimentos de ex-empregados que moram no interior do estado.

Delegada diz que ouviu todas as testemunhas
“O inquérito policial é uma reunião de provas. Nós tivemos todo o cuidado para não cometer nenhum erro. É um crime grave, e por isso tem que ser apurado com técnica e tranquilidade. Ouvimos todo mundo que tinha que ser ouvido. Fomos a Paty de Alferes ouvir os empregados. No total, tomamos o depoimento de oito a nove pessoas”, afirmou.

A delegada disse também que pediu um detalhamento do laudo ao Instituto Médico Legal (IML). “Um perito, que o tempo todo esteve com a gente, nos forneceu todas as explicações. A gente pediu ao IML que explicasse as multiplicidades das lesões, e a idade daquelas lesões. Elas são de dias diferentes, e a menina tem diversas lesões que foram causadas por meio cruel e sevícias (maus-tratos). Isso dito pelo perito”, acrescentou.

Crime de racismo pelo tratamento aos empregados
Monique Vidal não quis adiantar se vai pedir prisão temporária ou preventiva da aposentada. “Isso não vou adiantar para não prejudicar o finalzinho do inquérito policial. Até amanhã ele acaba. As agressões são gravíssimas. Eu não mostrei as fotos que foram apresentadas pela Vara da Infância por que eu acho que as pessoas não merecem ver. Agora é com a Justiça. Nós estamos terminando esse inquérito e amanhã entregamos ao Ministério Público.”

A acusação de crime de racismo foi acrescentada ao inquérito a partir dos depoimentos dos empregados. “De acordo com os depoimentos prestados aqui pelos empregados, ela foi autuada pelo crime de racismo conforme artigo 20, da lei 7716/89 (que trata dos crimes de preconceito de raça ou cor). Não é injúria racial, é crime de racismo, é contra a raça negra. Ela costumava dizer ‘isso é comida de preto, isso é serviço de preto’ ao se dirigir aos empregados”, afirmou a delegada.


Danos morais
O Ministério Público do Rio (MP-RJ), por meio das promotorias de Infância e Juventude da capital, propôs na quarta-feira (28) uma ação contra a procuradora, que sustenta que a acusada infringiu um artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece a pena de multa para o descumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar ou decorrentes de tutela ou guarda.

Nos próximos dias, de acordo com o MP, as promotorias de Infância e Juventude da Capital pretendem entrar, também, com ação de indenização por danos morais contra a procuradora aposentada, considerando as humilhações e ofensas que a criança foi submetida enquanto estava sob a sua guarda provisória.

Início da investigação
Na delegacia, no último dia 15, o Conselho Tutelar registrou queixa de maus-tratos e apontou a procuradora como a única responsável pela violência na criança. Uma gravação que teria sido feita dentro do apartamento da suspeita mostra um dos momentos de agressão. A voz seria da procuradora e o choro seria da menina adotada por ela há pouco mais de um mês.

Segundo o conselho, a criança foi encontrada no chão do terraço onde fica o cachorro da procuradora. De lá, a menina foi levada para um hospital. Com os olhos inchados, ela precisou passar três dias internada. As marcas seriam, aparentemente, consequência de pancadas na cabeça, mas o laudo do IML apontou lesão corporal leve.

Depois de passar quase um mês na companhia da procuradora aposentada, a menina foi levada de volta para a um abrigo pelo Conselho Tutelar.

http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2010/04/procuradora-e-indiciada-por-tortura-qualificada-e-racismo.html

A lesão nos olhos roubou o noticiário envolvendo Neymar.

A lesão nos olhos roubou o noticiário envolvendo Neymar.

Só por isso uma frase solta em uma entrevista para o Estadão escapou.

Não teve a repercussão que merecia.

Nem a colunista social que o entrevistou a destacou.

Questionado, no meio da conversa, se já foi vítima de preconceito racial, Neymar respondeu, sem pensar.

“Nunca. Nem dentro, nem fora do campo. Até porque não sou preto, né?”

Pena que faltou coragem à colunista social para explorar mais o assunto com o talentoso atacante.

Basta possuir uma vista só para ver que ele é mulato.

O brasileiro é fruto da mistura, da miscigenação.

Neymar respondeu como se o preconceito se justificasse se fosse preto.

Uma grande bobagem.

Perdoável em qualquer garoto de 18 anos.

Não em um ídolo de todo o país.

Quantas pessoas leram o Estadão querendo saber mais sobre Neymar?

O estudo fica em último lugar na carreira de qualquer jogador de futebol.

Principalmente quando ele tem um talento impressionante.

Nem há duas semanas, Danilo do Palmeiras chamou Manoel do Atlético Paranense de macaco.

A torcida do Coritiba voltou a chamar Manoel de macaco na final do Campeonato do Paraná.

Exemplos de preconceito acontecem a toda hora.

Alguém precisa urgentemente orientar Neymar.

Sua ignorância a respeito da delicada questão dói, machuca seus fãs.

Qual o problema em ser negro, mulato, mestiço, branco, vermelho?

Uma pena que a reportagem preferiu o caminho mais suave.

Destacar seu desejo por carros importados…

Se houvesse coragem poderia ter exposto de maneira mais clara o quanto Neymar está despreparado para a vida.

Talvez porque a entrevista tenha sido feita por uma colunista social, habituada às futilidades do mundo dos ricos, que ela frequenta.

Alguém precisa acordar Neymar para a vida.

Não vai ser essa colunista…

http://esportes.r7.com/blogs/cosme-rimoli/2010/04/27/neymar-qual-o-problema-em-ser-preto/

Pelo segundo ano consecutivo, Unicamp deve desistir de usar nota do Enem

Pelo segundo ano consecutivo, Unicamp deve desistir de usar nota do Enem
Universidade planejava dar ao Enem 20% do peso da primeira fase, mas notas chegarão "tarde demais", segundo coordenador de vestibular

Pelo segundo ano consecutivo, a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) deverá desistir de usar o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) em seu vestibular. A exemplo do que aconteceu em 2009, as notas chegarão “tarde demais” às mãos da universidade.



É que a Unicamp quer divulgar em 20 de dezembro a lista de aprovados na primeira fase - mas o MEC (Ministério da Educação) só deve terminar de corrigir as provas no início de janeiro, informou a Agência Brasil nesta sexta-feira (30).



- Enem 2010 será aplicado em 6 e 7 de novembro



“Nós não podemos alterar nossas datas. Precisaríamos das notas do Enem até o fim de novembro”, disse Renato Pedrosa, coordenador do vestibular da Unicamp.

Inicialmente, a universidade planejava dar ao Enem peso de 20% na primeira fase. Os candidatos - foram de 55 mil inscritos, no ano passado - poderiam optar por usar essa nota, ou não.

Em entrevista ao GUIA, o coordenador também descartou a possibilidade de usar o Enem na segunda fase, agendada para terminar em 18 de janeiro - data em que as notas do Enem provavelmente já estariam disponíveis. “Não vamos mudar as regras a essa altura do campeonato”, disse.



No ano passado, a Unicamp desistiu de usar o Enem depois de a prova ser adiada devido ao vazamento das questões. Este ano, o MEC planejava aplicar o exame em outubro, mas “empurrou” a data devido ao calendário eleitoral.

http://guiadoestudante.abril.com.br/vestibular/noticias/pelo-ano-consecutivo-unicamp-deve-desistir-usar-nota-enem-554975.shtml

A última instância das cotas raciais

SOCIEDADE
A última instância das cotas raciais
02/03/2010 13:52:27

Rodrigo Martins

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Políticas Sociais: O STF inicia a análise da ação do DEM contra a UnB

A reserva de vagas para estudantes negros foi adotada em universidades públicas há ao menos dez anos, mas somente agora o debate sobre a adoção do sistema de cotas chegará ao Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Ricardo Lewandowski convocou uma audiência pública sobre o tema entre os dias 3 e 5 de março. Trata-se do passo inicial do julgamento de uma ação movida pelo Partido Democratas (ex-PFL) contra a Universidade de Brasília (UnB), que reserva 20% das vagas abertas em seu vestibular para estudantes negros, independentemente da classe social a qual pertençam.

O resultado do julgamento, apostam especialistas, terá impacto sobre o sistema de seleção de todas as universidades públicas do País. Também pode acelerar ou contribuir para a derrocada das iniciativas parlamentares de criar um amplo sistema de cotas sociais e raciais nas universidades federais, uma discussão que patina no Congresso desde que as primeiras propostas do gênero foram adotadas por iniciativa das próprias instituições de ensino.

Para os defensores da medida, a esperança é que os ministros do STF tenham o mesmo entendimento que a maioria dos magistrados da primeira instância e dos tribunais de Justiça, que consolidaram nos últimos anos uma jurisprudência favorável às cotas em vários estados brasileiros. É o que revela um estudo recém-concluído pelo Laboratório de Políticas Públicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). O estudo mostra que, em 2003, quando as universidades estaduais fluminenses adotaram o sistema de cotas, ao menos 400 mandados de segurança foram impetrados por alunos que perderam a vaga no ensino superior para alunos cotistas. Destes, 161 foram concedidos liminarmente pela Justiça. Mas, um a um, acabaram por terra.

Em novembro do ano passado, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manifestou-se pelo mérito da questão: concluiu que as cotas eram constitucionais. “Com o tempo, todas as liminares foram cassadas e os estudantes pararam de contestar na Justiça o resultado do vestibular com base no ingresso dos alunos cotistas”, comenta o advogado Renato Ferreira, pesquisador da Uerj e responsável pelo estudo. “Este fenômeno não se restringe ao Rio. Ao adotar as cotas, a Universidade Federal do Paraná sofreu ao menos 140 ações do gênero. Hoje, os casos são raríssimos. O mesmo identificamos em Alagoas, na Bahia, em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul. O Judiciário, tido como um poder conservador, está reconhecendo a legitimidade das políticas afirmativas.”

Até o fim de 2009, ao menos 93 universidades adotavam algum tipo de cota. Entre elas, as que usavam algum tipo de recorte racial chegavam a 67. A advogada Roberta Fragoso Kaufmann, autora da ação do DEM contra o sistema de cotas da UnB, esclarece que o partido não questiona a legitimidade da reserva de vagas a alunos egressos de escolas públicas ou para estudantes de baixa renda. “Não somos contra as cotas sociais. O que contestamos é a inclusão de critérios raciais, o que abre um precedente perigoso de criação de leis no Brasil baseados na diferenciação pela cor da pele.” Pupila de Gilmar Mendes, Roberta Kaufmann foi orientada pelo próprio presidente do STF no mestrado sobre a necessidade de políticas afirmativas no Brasil.

As cotas raciais encontram resistência mesmo entre representantes do Movimento Negro, como o advogado José Roberto Militão, integrante da Comissão de Assuntos Antidiscriminatórios da OAB-SP. “O Estado não deve legislar sobre o conceito de raça, porque, dessa forma, ele reconhece e outorga uma nova identidade jurídica, baseada na cor da pele, que viola a dignidade humana”, afirma. “As cotas legitimam a segregação racial. E, nessa esdrúxula hierarquia racial, os negros são vistos como inferiores, alvos prioritários da assistência. Isso é degradante, acaba com a autoestima dos jovens negros.”

Para Fábio Konder Comparato, professor aposentado da Universidade de São Paulo, o sistema de cotas é um passo necessário para começar a reparar séculos de exploração e marginalização da população negra. “Os pretos e pardos representam 70% da faixa dos 10% mais pobres. Os trabalhadores negros recebem, em média, a metade do salário dos brancos. Além disso, 58% da população branca tem acesso ao Ensino Médio, ao passo que a participação dos negros é de apenas 37%”, comenta. “Isso significa que estamos descumprindo a Constituição, porque ela prevê a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades. E o Estado tem feito muito pouco para reduzir o abismo social que separa os negros dos brancos.”

Segundo Comparato, é absurda a tese de que o sistema de cotas vai provocar ódio racial. “Justiça é tratar desiguais na medida da desigualdade. É por isso que a Constituição prevê, por exemplo, proteção às mulheres no mercado de trabalho. E ninguém diz que é uma Constituição sexista ou que promove a guerra dos sexos”, afirma. “Ainda se propagandeia essa falácia da democracia racial no Brasil, simplesmente porque o preconceito, aqui, é dissimulado, enrustido. Mas os dados que citei são de fontes oficiais. Isso é real.”

Na avaliação do frei franciscano David Santos, fundador e presidente da ONG Educafro, que oferece cursos preparatórios para negros ingressarem na universidade, as cotas são medidas emergenciais, que devem durar de 10 a 15 anos. “Seu objetivo é o de despertar a sociedade para que se abra e execute a igualdade material, saindo da igualdade formal, que é mentirosa e sempre beneficiou um único segmento da nação”, afirma. “É uma reparação com o nosso passado escravocrata e com a marginalização dos negros até hoje.”

O professor José Jorge de Carvalho, do Departamento de Antropologia da UnB, concorda com a avaliação. “Foi por entender que o racismo é crônico na sociedade brasileira e em todas as classes sociais que a UnB optou por oferecer cotas raciais. E, para comprovar o descompasso, basta observar alguns indicadores. Segundo o censo universitário de 2000, apenas 12% dos nossos alunos eram pretos ou pardos, apesar de os negros representarem mais da metade da população brasileira.” Mas por que cotas raciais, e não sociais? “Nesse mesmo ano identificamos 400 alunos que recebiam auxílio-moradia da universidade, justamente por serem mais pobres. Sabe quantos eram negros? Apenas dez”, explica Carvalho.
http://br.groups.yahoo.com/group/discriminacaoracial/messages?o=1