terça-feira, 21 de julho de 2009

Um novo modelo de prosperidade

Folha de S.Paulo - TENDÊNCIAS/DEBATES<br />Charles A. Tang: Um novo modelo de prosperidade - 21/07/2009



São Paulo, terça-feira, 21 de julho de 2009

TENDÊNCIAS/DEBATES

Um novo modelo de prosperidade

CHARLES A. TANG


Será que poderemos finalmente substituir nosso decrépito modelo econômico de pobreza por um capitalismo de riqueza?

DESDE A Segunda Guerra Mundial, metade do mundo vivia sob a hegemonia dos EUA e via esse país como modelo de democracia e de economia, e o "american way of life" era exemplo a ser seguido.
O avanço tecnológico e a prosperidade dos EUA eram indiscutíveis, e o mundo capitalista almejava nível de vida idêntico. O zelo missionário americano, por sua vez, tratava de impor ao mundo um modelo que emulasse sua democracia e sua economia.
A partir da unificação da Europa e da emergência da China como potência econômica mundial, o mundo passou a se encaminhar para uma geopolítica multipolar. Todavia, foi necessário o advento da crise financeira mundial para que se evidenciasse o fim do mundo unipolar e a real fragilidade do modelo econômico baseado no "laisser-faire" de Adam Smith.
A crise financeira fez com que os EUA perdessem o papel de modelo para o mundo. Com isso, o país deve deixar de contar com a comodidade de dispor de créditos ilimitados como senhor da moeda padrão mundial.
Em recente artigo na revista "Economist", a SR Rating, única empresa brasileira de avaliação de crédito, rebaixou a economia americana para meros AA, enquanto o Brasil conquistava o grau de investimento.
Na recente visita do secretário do Tesouro dos EUA à China, a plateia de alunos que assistia a sua palestra na Universidade de Pequim não conteve o riso quando ele assegurou que o dólar não se desvalorizará.
O déficit americano atingirá quase US$ 2 trilhões neste ano fiscal, e os EUA necessitarão de mais de US$ 1 trilhão por ano durante a próxima década. Diante da reticência dos chineses e de outras nações credoras em continuar a financiar os EUA nos volumes de que necessitam, a impressora da Casa da Moeda americana continuará a rodar em ritmo acelerado.
A trajetória de desvalorização do dólar é tão evidente quanto seu aumento de juros. A dívida americana atual é de US$ 11,4 trilhões. O invejado padrão de vida americano sofrerá sérias contrações. Cada novo cidadão dos EUA já nasce com uma dívida de US$ 37 mil. E, nos EUA, teremos pela frente o "subprime" dos imóveis comerciais, avaliado em US$ 1 trilhão, e a dívida dos cartões de crédito.
Em artigo nesta Folha em 22/3/08, prevíamos a trajetória de desvalorização do dólar, dando início à crise do sistema financeiro mundial.
Pela estabilidade de sua moeda e para se tornar menos dependente do dólar, a China já iniciou a internacionalização de sua moeda.
Em Xangai, Shenzhen, Guangzhou, Hong Kong e Macau já está autorizado o uso do yuan no comércio com os países da Asean (Brunei, Camboja, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Cingapura, Tailândia e Vietnã). A China disponibilizou 650 bilhões de yuans (US$ 95 bilhões) em "currency swaps" para o comércio com Argentina, Belarus, Hong Kong, Indonésia, Malásia e Coreia do Sul.
Além disso, o Brasil e a China analisam fazer a liquidação do comércio bilateral em suas próprias moedas.
A prosperidade dos EUA é de grande importância para a economia mundial. A estreita parceria entre os EUA e a China nas últimas décadas criou riquezas jamais sonhadas. Findas as contrações econômicas desta crise, veremos que a riqueza líquida gerada ainda é gigantesca. Mas, ainda por uma década, os EUA estarão concentrados em tirar sua economia da presente crise global.
O Brasil sempre seguiu a prescrição de políticas econômicas do FMI, que impunha seu modelo monetarista e do Consenso de Washington a todos os países que a ele recorreram. Mas, agora que o modelo americano mostrou sua limitação, qual deve ser nosso novo modelo econômico?
Será que, com o fim do capitalismo como foi praticado, poderemos finalmente substituir nosso decrépito modelo econômico de pobreza por um capitalismo de riqueza?
Não é justificável que quase 40% do nosso PIB represente tributos que mantêm um crescente setor improdutivo. A modernização da nossa legislação trabalhista deixará de incentivar a informalidade. É algo encorajador termos finalmente deixado de ser campeões mundiais de juros exorbitantes, mas devemos manter um câmbio favorável ao país.
A nossa visão ambiental poderia refletir mais a preservação do ser humano como bem da natureza. E, para que possa viver com um mínimo de dignidade humana, o homem necessita de emprego. O nosso sistema de entraves burocráticos tornou-se por demais oneroso para ser mantido.
As reformas que ainda temos por fazer poderão ajudar a enfrentar esta crise e promover uma reestruturação que anule o custo Brasil, que tanto pesa contra nosso avanço econômico.
Isso se constituiria numa medida de estímulo econômico que, de uma vez por todas, tiraria o Brasil da pobreza e asseguraria a riqueza da nação.


CHARLES A. TANG é presidente binacional da Câmara de Comércio & Indústria Brasil-China, membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial e membro fundador do Instituto de Pesquisa e Estudo de Desenvolvimento Econômico.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2107200908.htm

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Presidente cobra intensificação das ações do Governo em áreas quilombolas



O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou mais velocidade das ações do Governo Federal nas áreas ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos, e estabeleceu a meta de titular 35 destas comunidades até outubro. A manifestação do presidente ocorreu durante audiência realizada na manhã desta segunda-feira (20/07) em Brasília, na presença do ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, do ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, e do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), Rolf Hackbart.

O presidente Lula anunciou que em breve vai convocar reunião com todos os ministérios e órgãos federais envolvidos na Agenda Social Quilombola. Além de acelerar as titulações, o objetivo é intensificar as ações de assistência e desenvolvimento local. Dentre os grupos quilombolas que deverão receber o título definitivo das terras que ocupam está a maior comunidade do Brasil: Kalunga, em Goiás, cujas 600 famílias serão beneficiadas com 261 mil hectares de área total. Outras comunidades cujos processos de titulação estão praticamente prontos são Mocambo (SE, com 113 famílias), Casca (RS, 85 famílias), Rincão dos Martimiamos (RS, 55 famílias) e São Miguel (RS, 153 famílias).


"Qualquer mudança na questão da demarcação não passa de especulação", afirma ministro em visita a Alcântara (MA)

O ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, visitou na última sexta-feira (17/07) a comunidade quilombola de Mamuna e a agrovila Marudá, ambas situadas no município de Alcântara (MA). O objetivo principal da visita, de acordo com o ministro, foi reafirmar o compromisso do Governo Lula com a melhoria da qualidade de vida dos quilombolas, além de tranquilizar as famílias quanto a sua permanência nas comunidades apesar da possibilidade de expansão da base de lançamento de foguetes.

Em Mamuna, povoado que reúne 227 pessoas, o ministro afirmou que "remoção é uma palavra que não existe no Governo Lula. Qualquer mudança na questão da demarcação não passa de especulação. O Governo não vai tomar nenhuma medida que leve ao retrocesso dos anos 80, quando muitas comunidades foram removidas de forma arbitrária para agrovilas. Isso eu posso assegurar aos senhores e senhoras". Os quilombolas rejeitam as transferências pelo fato das agrovilas não permitirem a manutenção do seu modo de vida, principalmente por estarem longe do mar - desconsiderando a tradição pesqueira das comunidades - e em terrenos de baixo potencial agricultável.

Titulação - Em novembro do ano passado, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) publicou Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTDI) que reconheceu as 110 comunidades quilombolas de Alcântara e determinou a delimitação de suas terras, em área total pouco superior a 78 mil hectares, beneficiando 3.500 famílias. A partir da publicação, o INCRA começou a reunir os documentos necessários para a emissão dos títulos de posse coletivos. O que, de acordo com o ministro Edson Santos, deve acontecer ainda este ano.

O direito de uso da área é disputado entre as comunidades quilombolas e a Agência Espacial Brasileira, que pretende ampliar os sítios para lançamento de foguetes no entorno do centro de Lançamento de Alcântara (CLA). Por reconhecer o inegável desenvolvimento econômico e científico que será trazido pela ampliação dos sítios, houve um entendimento - coordenado a partir da Casa Civil da Presidência da República - no sentido de conciliar o Programa Espacial com os direitos dos quilombolas que há séculos ocupam a região. Com isso, na época ficou definido que os novos sítios serão instalados na área já ocupada pelo CLA.

No entanto, devido ao questionamento da demarcação feito pelo Ministério da Defesa, as comunidades de Alcântara voltaram a sentir-se inseguras. "A presença do ministro Edson Santos nos deixa mais seguros de que vamos permanecer em nossas terras. Aqui é nosso lugar, não queremos sair. Mas só estaremos absolutamente tranquilos quando recebermos os títulos definitivos", afirmou Maria de Fátima Ferreira, uma das lideranças quilombolas. "A comunidade estava apreensiva. Mas o ministro garantiu que não vai haver transferência. De que adianta um grande projeto de desenvolvimento para o país, como é o CLA, sem pensar nas pessoas? Esta sim deve ser a prioridade do Governo", acrescentou João da Mata, presidente da Associação de Moradores de Mamuna.

Marudá - Na sequencia o ministro seguiu para a agrovila de Marudá, que reúne 85 famílias provenientes de 15 comunidades quilombolas. De acordo com as lideranças comunitárias Maria Vitória e Inácio Diniz, em 1987, quando a agrovila foi fundada, eram cem famílias. No entanto, devido a falta de empregos, à distância do mar - cerca de 20 km - e à baixa produtividade do solo, muitos moradores abandonaram suas casas em busca de melhores condições de vida na periferia de São Luis. Atualmente, a renda da comunidade vem principalmente das aposentadorias e do Programa Bolsa Família, que atende 80% dos domicílios.

"A comunidade não se afirma contra a base, mas quer respeito. O projeto já tem 30 anos, mas não trouxe desenvolvimento ao município, que só possui uma ambulância, estradas esburacadas e produção carregada no lombo de burro", afirmou o quilombola Inácio Diniz, que é formado em Agronomia.

Durante a reunião com os moradores de Marudá, o Movimento dos Atingidos pela Base (MABE) entregou ao ministro um documento expressando o temor das comunidades de Alcântara quanto a possibilidade de remoção. "Nada será feito prejudicando a vida das comunidades. Assim como eu falo em defesa dos direitos dos quilombolas, outros ministérios têm o legítimo direito de falar em nome dos interesses que representam. Mas a palavra final será do presidente Lula. E o que o presidente deseja é que Alcântara seja uma vitória de todos, do Programa Espacial e dos quilombolas", afirmou o ministro após receber o documento.



Mais informações:
Coordenação de Comunicação SocialSecretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade RacialPresidência da RepúblicaEsplanada dos Ministérios, Bloco A, 9º andar - 70.054-906 - Brasília (DF)Telefone: (61) 3411-3659 / 4977

HIV é dez vezes mais comum em países africanos entre gays, diz estudo

Atualizado em 20 de julho, 2009 - 18:15 (Brasília) 21:15 GMT

África
Índices de infecção pelo vírus HIV entre homossexuais em alguns países africanos são dez vezes maiores do que entre heterosexuais, segundo pesquisa publicada na revista científica Lancet.
O estudo aponta que o preconceito em relação à comunidade gay leva ao isolamento e à intimidação de homossexuais, o que, por sua vez, contribui para comportamentos sexuais ainda mais arriscados.Mas os riscos não se limitam aos homens gays, já que muitos dos infectados também mantêm relações sexuais com mulheres.O estudo recomenda um maior investimento em educação e pede mais recursos para o combate ao HIV e à Aids na região.Segundo a pesquisa, realizada por especialistas da Universidade de Oxford, a prevalência do vírus entre homens gays na África subsaariana se deve à "recusa cultural, religiosa e política em aceitar (homens homossexuais) como membros da sociedade".O líder do estudo, Adrian Smith, disse à BBC que há "profundo estigma e hostilidade social em todos os níveis da sociedade em relação a comportamentos sexuais entre homens do mesmo sexo ou ao homossexualismo"."Como consequência, esse grupo se torna extremamente difícil de atingir", acrescenta. Smith afirma ainda que o sexo entre homens homossexuais foi sempre reconhecido como particularmente perigoso em termos do contágio pelo HIV.Mas também há maior probabilidade de que homens gays na região tenham outros comportamentos arriscados, como trabalhar na indústria do sexo, manter relações sexuais com múltiplos parceiros e ter contato com usuários de drogas intravenosas.EducaçãoUm militante pelos direitos dos gays em Burundi, George Kanuma, disse à BBC que muitos homens "escondem sua preferência sexual" para se casar e ter filhos, mas continuam a ter relações sexuais com outros homens."A maioria deles sabe que você pode contrair HIV/Aids ou qualquer infecção quando faz sexo com mulheres, mas não quando faz sexo com outros homens", disse.Segundo Smith, "precisa-se desesperadamente de um pacote básico de prevenção contra o HIV" na África, incluindo a garantia de suprimentos adequados de preservativos. O pesquisador acrescenta que também é preciso conscientizar, educar e ensinar técnicas de prevenção na região.A agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para a Aids calcula que há 33 milhões de pessoas no mundo infectadas pelo HIV - dois terços delas vivem na África subsaariana.Grã-BretanhaDe acordo com dados da Health Protection Agency, órgão britânico de proteção à saúde, 77,4 mil pessoas viviam com o vírus HIV na Grã-Bretanha em 2007.Desse total, cerca de 32 mil (41%) eram homens que tinham relações sexuais com outros homens (ou MSM, na sigla em inglês), um termo técnico usado para definir o grupo que inclui bissexuais.O grupo de homens que se relacionam sexualmente com homens também respondeu por 41% dos novos casos de infecção por HIV em 2007, de acordo com a agência britânica.Os dados indicam que o grupo está entre os mais vulneráveis à infecção pelo HIV, mas os índices de incidência da infecção na Grã-Bretanha não chegam perto dos apresentados pelo estudo realizado na África subsaariana.

Constituição pode mudar. Para OAB, sociedade perderá

Rio de Janeiro, 20/07/2009
- Polêmica à vista na Câmara dos Deputados. Proposta de Emenda Constitucional 341/09, que visa a enxugar dos atuais 250 para 76 o número de artigos da Constituição Federal brasileira, promete gerar embates acalorados na Casa. Representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por exemplo, se adiantaram em pedir o arquivamento da proposição. O projeto, entretanto, continua a avançar. Pedido de vista coletivo, feito na terça-feira, pelos integrantes da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, onde a PEC tramita, deverá garantir a apreciação pelos parlamentares da Casa logo nos primeiros dias após o fim do recesso legislativo. É que, pelo regulamento interno, a proposta retirada da pauta com essa finalidade deve ser devolvida no prazo de duas sessões do Plenário.
A proposta é de autoria do deputado Regis de Oliveira (PSC-SP). O projeto original propunha a redução para 71 artigos, mas o relator Sérgio Barradas Carneiro (PT-BA), em substitutivo reviu a quantidade de dispositivos a serem suprimidos. O parlamentar também desmembrou a PEC em dois dispositivos - um sobre as matérias a serem retiradas da Carta e outro com as modificações propostas pelo autor a serem realizadas na Lei Maior, que haviam sido tratadas no mesmo texto.
Barradas sugeriu que as alterações propostas sejam apreciadas em PEC autônoma. No que diz respeito à desconstitucionalização, o deputado encampou a maior parte do texto original em seu dispositivo e emitiu parecer pela aprovação. De acordo com ele, a proposição visa a retirar tudo da Constituição que não tiver natureza constitucional. Ficam apenas as cláusulas pétreas. Ou seja, os dispositivos sobre os direitos sociais; a forma e estrutura do estado; os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário; entre outros.
No parecer, Barradas afirmou que não há vício de inconstitucionalidade formal ou material na proposta, bem como foram atendidos os pressupostos constitucionais e regimentais para sua apresentação e apreciação. De acordo com ele, a proposição vem ao encontro dos anseios de vários segmentos da sociedade e a desconstitucionalização das matérias que não possuem natureza constitucional é tema de suma relevância que merece detalhada análise.
Ele lembrou que a Carta foi elaborada em um período pós-ditadura. O resultado foi um texto extremamente detalhista, uma vez que todos os segmentos da sociedade buscaram ver seus direitos estabelecidos na Constituição. Segundo afirmou, a Lei Maior foi promulgada com 250 artigos, mais 95 artigos dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórios. Além disso, conta hoje com mais seis emendas constitucionais de revisão e mais 57 emendas constitucionais.
O parlamentar destacou que, desde 1988, foram alterados, suprimidos e acrescentados 90 artigos, 312 parágrafos, 309 incisos e 90 alíneas da Constituição. De acordo com ele, ainda há 1.119 propostas em tramitação na Câmara dos Deputados com vistas a alterar o texto constitucional. Outras 1.344 foram arquivadas desde a promulgação da Lei Maior.
O professor de Direito constitucional, doutorando pela universidade de Salamanca e presidente da Comissão de Legislação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coêlho, é contra a proposta de mudança na Constituição.
"Entendo que o Brasil tem uma tradição de Constituição analítica e não sintética. Temos essa tradição de que a Constituição regulamenta todos os aspectos da vida social e não apenas políticos. Então, ela regulamenta a Previdência, a infância e juventude e outros. Isso não é maléfico. O enxugamento proposto, se trouxer algum benefício, trará apenas ao parlamento, que terá mais facilidade para aprovar leis sem o quorum qualificado", disse.
O advogado explicou que a constitucionalização desses temas tem aplicação prática. Ele citou como exemplo a súmula editada pelo Supremo Tribunal Federal que estabelece a ilegalidade da cobrança acerca da taxa de inscrição na rede pública de ensino. "A Constituição diz que a educação é pública. A PEC visa a suprimir isso. Esse tema e outros ficariam para a legislação, mas quando haveria a legislação? Ficaríamos no vácuo, sem qualquer proteção, pelo menos enquanto o Congresso não resolvesse legislar sobre o direito. A sociedade perde com isso".
Para Furtado, os argumentos de quem defende a proposição não são suficientes para o que chamou de drástica intervenção. "Seria uma intervenção drástica apenas porque o Congresso não quer mais ter quorum qualificado. O poder constituinte originário, que fez a Constituição de 1988 e reinaugurou a democracia no País, é muito legítima. Não vejo legitimidade no Congresso atual para enxugar a Constituição feita no momento da redemocratização do Brasil, ainda mais sem ouvir a população", disse.
(A reportagem é de Giselle Souza e foi publicada na edição de hoje do Jornal do Commercio)

Ter colegas de quarto de outras raças reduz preconceito no campus

Vestibular e educação

O Portal de Notícias da Globo
18/07/09 - 12h00 - Atualizado em 18/07/09 - 12h00


Diversidade racial também melhora o desempenho de estudantes negros.Mas relacionamento entre os alunos pode ser mais estressante, diz estudo.
Tamar Lewin Do New York Times

Como calouro da Ohio State University e único estudante negro do seu andar, Sam Boakye estava determinado a tirar boas notas – em parte, para que seu colega de quarto branco não tivesse base para visões racistas. "Se você está cercado de brancos, tem algo a provar", disse Boakye, estudante do último ano, nascido em Gana. "Você é motivado a fazer melhor, a desafiar o estereótipo de que pessoas negras não são inteligentes."

Estudos recentes descobriram que ter um colega de quarto de uma raça diferente na faculdade pode diminuir o preconceito, diversificar as amizades e até melhorar o desempenho dos estudantes negros. No entanto, a pesquisa descobriu também que esses relacionamentos são mais estressantes e têm mais tendência a serem rompidos. Com as universidades cada vez mais diversificadas, e colegas de quarto de diferentes raças mais comuns, cientistas sociais os observaram como experimentos de campo naturais capazes de oferecer esclarecimentos sobre as relações raciais. "De uma perspectiva científica, quando esses colegas de quarto são convocados a compartilhar o dormitório, você tem um experimento natural acontecendo, numa área que é muito difícil de testar de forma empírica", disse Thomas E. Trail, estudante de pós-graduação em psicologia da Princeton University, que estuda colegas de quarto de diferentes raças. "Você não poderia iniciar um experimento determinando que pessoas passem vários meses vivendo com alguém de outra raça." Russell H. Fazio, professor de psicologia da Ohio State e estudioso do tema, descobriu um efeito acadêmico intrigante. Ao analisar dados sobre milhares de calouros da universidade que moram em dormitórios, ele descobriu que os estudantes negros que entraram com notas mais altas em testes padronizados tiveram notas melhores se tinham um colega de quarto branco – mesmo se as notas desse colega fossem baixas. A raça do colega de quarto não tinha efeito sobre as notas dos estudantes brancos ou estudantes negros com notas de admissão baixas. Talvez, especulou o estudo, ter um colega de quarto branco ajude academicamente estudantes negros preparados a se adaptar a uma universidade predominantemente branca. Esse mesmo estudo descobriu que colegas de quarto de raça diferentes alocados de forma aleatória se separavam antes do fim do trimestre com o dobro da frequência de colegas de quarto da mesma raça. Pelo fato de que as relações inter-raciais são geralmente problemáticas, disse Fazio, muitos estudantes gostariam de mudar de quarto, mas as diretrizes de alojamento universitário dificultam essa mudança. "Na Indiana University, onde o alojamento não era tão apertado, mais colegas de quarto de raças diferentes se separaram", disse ele. "Aqui na Ohio State, onde havia uma escassez de dormitórios, eles foram orientados a resolver a situação. A coisa mais interessante que descobrimos foi que, se o relacionamento conseguisse continuar por apenas dez semanas, veríamos uma melhora nas atitudes em relação à raça." O estudo de Fazio descobriu que três vezes mais estudantes de raças diferentes alocados aleatoriamente não estavam mais morando juntos ao final do semestre, em comparação com colegas de quarto brancos. Os colegas de raças diferentes passaram menos tempo juntos e não se envolveram tanto com os amigos do colega de quarto, em relação aos colegas brancos. O estudo ainda descobriu que as atitudes racistas preexistentes dos brancos previam quais colegas de quarto se separariam. Vários estudos mostram que morar com um colega de quarto de raça diferente muda as atitudes de um estudante. Um estudo, realizado na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, descobriu uma redução geral no preconceito entre estudantes com colegas de quarto de outra raça – mas aqueles que dividiram o dormitório com asiáticos-americanos, o grupo com maior grau de preconceito, se tornaram ainda mais preconceituosos. Profissionais que observam as relações entre colegas de quarto afirmam que a alocação de estudantes de raças diferentes no mesmo dormitório é uma parte importante da diversidade no campus. "A maioria deles não tem problemas, e acho que isso pode ser mais interessante, pois eles têm mais a aprender um com o outro", disse Phil Badaszewski, diretor do dormitório da Ohio State. "Quando existem conflitos, geralmente trata-se de ideias diferentes sobre a divisão das coisas, ou música, ou limpeza, ou chegar tarde da noite no dormitório – coisas que também podem representar problemas para colegas da mesma raça."

Às vezes, essas disputas mascaram questões raciais implícitas. "Tive um aluno que escolheu se mudar. Ele disse que simplesmente não gostava dos amigos do colega de quarto, pois eram muito barulhentos", disse Badaszewski. "Achei que havia um pouco de racismo ali, mas não trouxe o assunto à tona. É um daqueles temas – raça, religião e política – sobre os quais seus pais recomendam não falar durante um jantar. E, naquele caso, sabia que não melhoraria as coisas." Ocasionalmente, ocorrem problemas raciais explícitos. "Tive uma aluna negra que ouviu comentários racistas no seu quarto", disse Gina Kozlowski, outra diretora do dormitório da Ohio State. "Ela disse que não queria ser transformada em espetáculo, e que não queria ser a pessoa que educaria suas colegas de quarto em relação a raça." Um novo estudo, realizado com estudantes de Princeton, usou questionários diários para monitorar as interações e percepções entre colegas de quarto. "Nas primeiras semanas de relacionamento, as emoções positivas diminuíram para a maioria dos estudantes com colegas de quarto brancos", disse Trail, um dos autores do estudo. "Não que os estudantes brancos começaram a ser maus ou negativos. Em vez disso, houve uma diminuição de comportamentos positivos, como sorrir ou fazer contato visual, que levaram os estudantes das minorias a se sentirem pior." Um estudo com alunos da Duke University descobriu que os estudantes brancos, com menos probabilidade de terem tido amigos próximos de outras raças, eram os que tinham mais tendência a desenvolver mais amizades diversificadas enquanto calouros – em contraponto, alunos negros, que entravam na universidade com mais amizades inter-raciais, tiveram um declínio nesse tipo de amizade no último ano. O estudo encontrou poucas diferenças entre o primeiro e o último ano de faculdade na diversidade das amizades de alunos asiáticos e hispânicos. Calouros com colegas de quarto de outra raça – ou aqueles que moravam sozinhos num dormitório – foram os que tiveram mais tendência a diversificar suas amizades. "Ter diversidade somente nas salas de aula não aumenta as amizades entre as raças", disse Claudia Buchmann, professora associada de sociologia da Ohio State e autora do estudo da Duke. "Porém, a intimidade de compartilhar residências, sem colega de quarto, ou com um colega de quarto de outra raça, leva a amizades mais diversificadas." Estudantes da minoria, num ambiente predominantemente branco, disse Buchmann, geralmente se encasulam ao andar em grupos. Conselheiros negros e brancos da Ohio State disseram ser comum que calouros negros busquem outros alunos negros. "Existem organizações no campus especificamente projetadas para ajudar estudantes das minorias, e muitas vezes esses estudantes tentam encontrar seus amigos através desses grupos", disse Ellen Speicher, conselheira da Ohio State, branca e mãe de um aluno do penúltimo ano. "Faz sentido, num campus predominantemente branco." Boakye, conselheiro há dois anos, disse haver conforto em andar em grupos. "Sendo uma minoria na Ohio State, tentamos permanecer juntos, nos unir como uma comunidade", disse ele. "É diferente para os brancos." "Muitos deles vêm aqui sem muita exposição à diversidade", disse Boakye, "então, quando a primeira experiência deles com um rapaz negro não é tão ruim, eles vão e fazem mais amigos negros. Acho que causei uma boa impressão no meu colega de quarto no primeiro ano. Quando o vi este ano, ele disse, 'Ei, cara. Você não é o único amigo negro que tenho'. Isso é bom".