COMISSÕES / Direitos Humanos08/07/2009 - 17h41
O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), senador Cristovam Buarque, propôs, em debate nesta quarta-feira (08), que a reparação aos negros descendentes de escravos brasileiros seja feita por meio de uma bolsa de estudos no valor de R$ 3 mil para os filhos das famílias de afrodescendentes.
- A gente sabe que o Estado deveria gastar 10% com educação. Essa reparação custaria 2% da receita - propôs o parlamentar.
Outra proposta apresentada por Cristovam foi a criação de centros de pesquisa de recuperação da história negra. O senador propôs ainda que o Senado realize sessão especial de reconhecimento público de que a abolição da escravatura não teria se completado.
- Seria um depoimento claro, explícito, de que não completamos a abolição. Temos um sentimento racista, que se tenta esconder, e uma desigualdade social que aflige e atinge mais aos negros - avaliou.
Memorial
Cristovam endossou, assim como os demais especialistas presentes ao debate, a proposta de Mário Teodoro, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de criação de um memorial da abolição. Sugeriu ainda a edificação de um monumento de "memória da escravidão e de gratidão à África", semelhante ao existente no Rio de Janeiro dedicado aos pracinhas que lutaram com os aliados na Segunda Guerra Mundial.
Ao final da reunião, Cristovam propôs que seja realizada nova reunião para debater a possibilidade de reparação aos descendentes de escravos, desta vez em Salvador (BA), com a presença de representantes da sociedade civil.
Solicitou também a todos os participantes da audiência que revisem o texto referente às apresentações feitas nesta quarta-feira para que possa elaborar um livro sobre o assunto, aproveitando as suas observações.
Fundo de reparação
Também presente ao debate, o publicitário Roberto Carvalho detalhou petição apresentada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), com o objetivo de criação do Fundo Nacional de Reparação. Conforme explicou, os recursos seriam distribuídos aos estados para a aplicação em políticas públicas de saúde, educação, saneamento básico, entre outras, capazes de promover o resgate dessas populações relegadas pelo Estado. O documento está em exame na OEA desde 2001.
- Não se limitaria [o fundo] somente à questão financeira, mas poderia atuar com políticas compensatórias - defendeu. Para Roberto Carvalho, os negros representam parcela da população empobrecida devido "a uma máquina estatal perversa", resultante de uma "sociedade também perversa", que torna normal o "crime" praticado contra a população afrodescendente.
Posição semelhante foi manifestada por Ailton dos Santos Ferreira, da Secretaria Municipal de Reparação da Bahia. Ele também alertou para a banalização das desigualdades no país e defendeu a adoção de políticas públicas reparatórias. Ferreira salientou ainda que a democracia brasileira não será plena enquanto não houver projetos de distribuição de renda e não se tratar as diferenças de condições de vida e oportunidades "definidas pela etnia e cor da pele".
- Nas cadeias públicas, é normal a presença de negros em quantidade. Temos 94% dos ambulantes de Salvador em luta desigual com o Estado e a economia formal. Subemprego é normal. Subhabitações é normal. Escolas não funcionam. Essas "normoses" precisam ser resolvidas - alertou, referindo-se à banalização dos problemas nacionais e às dificuldades enfrentadas pelos negros no país.
Cristina Vidigal / Agência Senado(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)