quinta-feira, 20 de maio de 2010

Invasão de imigrantes vira problema social na África do Sul

20/05/2010 14h02 - Atualizado em 20/05/2010 14h25

Invasão de imigrantes vira problema social na África do Sul

Estrangeiros são 10% da população, sendo que muitos vivem na miséria.
Maior comunidade é de zimbabuanos com 3 milhões de pessoas.

Rafael Pirrho, Thiago Dias e Zé Gonzalez Do GloboEsporte.com, em Joanesburgo

A terra da Copa do Mundo é também a terra das oportunidades para todo um continente. Ano após ano milhões de africanos cruzam a fronteira da África do Sul, a maior economia da região. Antes mesmo de conforto ou luxo, buscam muitas vezes apenas um emprego e uma perspectiva. A maior comunidade é a dos zimbabuanos, que fugiram da grave crise econômica que devastou o país e elevou o desemprego a inacreditável taxa de 95%. Estima-se que cerca de 3 milhões morem atualmente na África do Sul. Significa que um quarto da população do Zimbábue se mudou para o vizinho.

Acampamento de zimbabuanos na cidade sul-africana de MusinaAcampamento de zimbabuanos na cidade sul-africana de Musina (Foto: Rafael Pirrho/G1)

Há também milhares de nigerianos, moçambicanos e congoleses, entre outros. Estima-se que 10% dos 49 milhões de habitantes da África do Sul sejam estrangeiros. O movimento migratório tornou-se um problema social na África do Sul, país onde o desemprego atingiu 24% segundo a última estatística, de 2009. Muitos sul-africanos acusam os imigrantes de espalharem doenças como a Aids e de roubarem seus empregos, como mostrou uma pesquisa coordenada pelo Instituto de Imigração do Sul da África. De fato é muito comum ver estrangeiros como domésticas ou garçons. Trata-se de uma mão-de-obra em geral mais barata e muito dedicada.

A violência contra os imigrantes parou com a proximidade da Copa do Mundo, mas acho que vai voltar depois. Muitos sul-africanos ainda nos culpam pelos problemas do país"
Senga Thotho, imigrante congolês

A tensão chegou ao ponto máximo em 2008, quando ataques xenofóbicos em várias cidades do país deixaram 62 mortos e outros 13 mil desabrigados. Um zimbabuano de 20 anos, morador de Polokwane (uma das sedes da Copa do Mundo), relembra o dia em que sofreu o ataque.

"Um grupo de pessoas invadiu minha casa e pediu para que eu mostrasse minha identidade sul-africana. Disse que não tinha e eles começaram a me agredir com pedras, socos e chutes. Consegui fugir, mas eles me pegaram de novo e me bateram muito até eu ficar coberto de sangue no chão. Só me deixaram porque acharam que eu estava morto", descreve.

Igreja Metodista no centro de Joanesburgo abriga cerca de 3 mil zimbabuanosIgreja Metodista de Joanesburgo abriga 3 mil
zimbabuanos (Foto: Rafael Pirrho/G1)

O congolês Senga Thotho aposta que os ataques poderão se repetir em breve.

"Foi tudo organizado e com a conivência da polícia. A violência contra os imigrantes parou com a proximidade da Copa do Mundo, mas acho que vai voltar depois. Muitos sul-africanos ainda nos culpam pelos problemas do país ", conta.

Thotho vive em um quarto de 12 metros quadrados próximo ao estádio Ellis Park, em Joanesburgo. Uma moradia suja e mal conservada, como é regra entre os imigrantes africanos que chegam ao país para tentar um futuro melhor.

Os refugiados se acomodam em qualquer canto da Igreja. Há muitas crianças no grupoOs refugiados se acomodam em qualquer canto
da Igreja (Foto: Rafael Pirrho/G1)

Uma Igreja Metodista no centro de Joanesburgo tornou-se símbolo desta desordem. São quase três mil zimbabuanos vivendo permanentemente lá - um prédio de cinco andarem com poucos pontos de luz, vidros e portas quebrados, sujeira, bastante hostil a quem tenta visitá-lo.

"É impressionante ver tanta gente vivendo nessas condições, mas elas me dizem que aqui é melhor que o Zimbábue", explica Sedi Mbelani, psicóloga que atende crianças que moram na igreja.

Small Street, no centro de Joanesburgo, concentra milhares de refugiadosSmall Street, no centro de Joanesburgo, reúne
milhares de refugiados (Foto: Rafael Pirrho/G1)

Em junho de 2009, a organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras (MSF) divulgou relatório sobre a situação alarmante dos imigrantes na África do Sul. Mas pouca coisa mudou desde então. O MSF dá assistência a 2,3 mil pessoas todo mês. Só de 1o de março de 2010 até agora recebeu 71 sobreviventes de violência sexual na cidade de Musina, que faz fronteira com o Zimbábue e é a principal porta de entrada dos zimbabuanos. Todos os dias cerca de 300 passam por lá.

"Os imigrantes arriscam suas vidas quando cruzam a fronteira e os estupros promovidos por gangues ocorrem em números chocantes. Muitos passam a vida em Johanesburgo, onde continuam tendo a saúde ameaçada e ainda enfrentam incertezas sobre seu futuro no país", explica Mickael Le Paih, chefe de missão do MSF na África do Sul.


http://g1.globo.com/especiais/africa-do-sul-2010/noticia/2010/05/invasao-de-imigrantes-vira-problema-social-na-africa-do-sul.html


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