sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Morte de jovens negros tem cenário de 'extermínio'


Morte de jovens negros tem cenário de 'extermínio'

Para cada jovem branco assassinado morrem dois negros; proporcionalmente, número chega a 20 na Paraíba

24 de fevereiro de 2011 | 12h 11

Lisandra Paraguassu, Rafal Moraes Moura e Lígia Formenti - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O Mapa da Violência 2011 mostra que a vitimização juvenil por homicídios continua a crescer. O número de homicídios entre a população negra é explosivo e, o que é pior ainda, a vitimização entre jovens negros tem índices muito altos, beirando um cenário de "extermínio". Após uma década (1998-2008), continua praticamente inalterada a marca histórica de 92% da masculinidade nas vítimas de homicídio.

Levando em conta o tamanho da população, o Mapa mostra que a taxa de homicídios entre os jovens passou de 30 (em 100 mil jovens), em 1980, para 52,9 no ano de 2008. Já a taxa na população não-jovem permaneceu praticamente constante. O estudo concluiu que o incremento da violência homicida no Brasil das últimas décadas teve "como motor exclusivo e excludente a morte de jovens".
Em 1998, a taxa de homicídios de jovens (idade 15 e 24 anos) era 232% maior que a taxa de homicídios da população não-jovem. Em 2008, as taxas juvenis já eram 258% maiores. Essa é média nacional, mas há Estados com índices de vitimização jovem acima de 300%, como Paraná e o Distrito Federal.
Na população não jovem, só 9,9% do total de óbitos são atribuíveis a causas externas (homicídios, suicídios e acidentes de transporte). Já entre os jovens, as causas externas são responsáveis por 73,6% das mortes. Se na população não-jovem só 1,8% dos óbitos são causados por homicídios, entre os jovens, os homicídios são responsáveis por 39,7% das mortes.
O Estado de menor vitimização juvenil, Roraima, no ano de 2008, tinha proporcionalmente 66% mais vítimas juvenis. No outro extremo, Amapá e Paraná e Distrito Federal ostentam quatro vezes mais mortes juvenis do que as outras faixas.
Negros e jovens. A partir de 2002 fica evidente um forte crescimento na vitimização da população negra. Se em 2002 morriam proporcionalmente 46% mais negros que brancos, esse percentual eleva-se para 67% em 2005 e mais ainda, para 103% em 2008. Assim, morrem proporcionalmente mais do dobro de negros do que brancos.
Segundo o Mapa da Violência/2011, isso acontece porque, por um lado, as taxas de homicídios brancos caíram de 20,6 homicídios em 100 mil brancos em 2002 para 15,9 em 2008. Já entre os negros, as taxas subiram: de 30 em 100 mil negros em 2002 para 33,6 em 2008.
Entre os jovens, esse processo de vitimização por raça/cor foi mais grave ainda. O diferencial (índice de vitimização) que em 2002 era também de 46% eleva-se para 78% em 2005 e pula para 127% em 2008. Mas essas são médias nacionais.
"Esmiuçando os dados, vemos que há estados como Paraíba ou Alagoas em que por cada jovem branco assassinado morrem proporcionalmente mais de 13 jovens negros (13 em Alagoas, mas são 20 na Paraíba", descreve o Mapa.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO - PARECER N.º04/2011 - Opina sobre a aplicabilidade do disposto no art.33 da Lei nº 9.394, de 20/12/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) tratando do Ensino Religioso.

DIÁRIO OFICIAL de 24 de fevereiro de 2011

CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
                    ATO DO CONSELHO
                    CÂMARA DE POLÍTICAS SOCIAIS
                    INTEGRADAS À EDUCAÇÃO
                                                                      PARECER N.º04/2011

Opina sobre a aplicabilidade do disposto no art.33 da Lei nº 9.394, de 20/12/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) tratando do Ensino Religioso.

HISTÓRICO

Em 14 de dezembro de 2010, o Conselho Nacional de Educação publicou a Resolução n° 7, que fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos.

A leitura atenta da referida Resolução esteve em pauta neste Conselho, em sessões realizadas nos meses de janeiro e fevereiro do corrente ano, propiciando um substantivo debate. Mereceram destaque o Artigo 15 e seu 6° parágrafo, que tratam do Ensino Religioso na organização dos Componentes Curriculares Obrigatórios do Ensino Fundamental, resultando neste parecer cujo objetivo é apresentar o posicionamento do Conselho Municipal do Rio de Janeiro face ao tema em tela.

Considerando a diversidade que constituiu a sociedade brasileira e a garantia constitucional do direito dos cidadãos em exercer livre e democraticamente seus pensamentos e crenças, todo processo que envolve o campo religioso é de grande complexidade e requer cuidado em sua abordagem, sobretudo quando se refere à normatização do Ensino Religioso pelos Sistemas de Ensino.

Vários fatores se colocam em conflito e contribuem para essa complexidade: a relação entre Estado e Religião; a relação hierárquica entre instituições religiosas hegemônicas e outras de menor visibilidade; o respeito à diversidade e às diferenças religiosas, bem como o direito ao ateísmo ou agnosticismo; o papel da escola e da família na formação das crianças e jovens; o sentido da escola pública. A construção e constante reformulação de documentos legais para este campo são exemplares da complexidade e do reduzido consenso que a temática alcança. Vejamos:

Na Constituição Brasileira, datada de 1988, encontramos:

Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.

§ 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. Em 20 de dezembro de 1996, em conformidade com a Constituição promulgada em
1988, foi editada a Lei 9.394, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sendo o ensino religioso assim tratado :

Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter:

I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou

II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa.

Esse artigo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sete meses depois de sua publicação, sofreu alteração através da Lei 9.475, de 22 de julho de 1997, passando a vigorar com a seguinte redação:

Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.

§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores.

§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso."
Seguindo essa redação, o artigo 15 da Resolução n° 7 do Conselho Nacional de Educação, que “fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos”, apresenta o ensino religioso entre os componentes curriculares obrigatórios do Ensino Fundamental.

Art. 15 “Os componentes curriculares obrigatórios do Ensino Fundamental serão assim organizados em relação às áreas de conhecimento:

I – Linguagens:

a) Língua Portuguesa;
b) Língua Materna, para populações indígenas;
c) Língua Estrangeira moderna;
d) Arte; e
e) Educação Física;

II – Matemática;

III – Ciências da Natureza;

IV – Ciências Humanas:
a) História;
b) Geografia;

V – Ensino Religioso.”

§ 6º O Ensino Religioso, de matrícula facultativa ao aluno, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui componente curricular dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil e vedadas quaisquer formas de proselitismo, conforme o art. 33 da Lei nº 9.394/96.

Entendendo como controversa a matéria em questão, a Procuradoria Geral da República, no dia 2 de agosto de 2010, propôs ao Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4439), solicitando interpretação constitucional do artigo 33 da Lei de Diretrizes de Bases, no sentido de tornar clara a incompatibilidade entre a laicidade da escola pública e o ensino de caráter confessional. A matéria aguarda decisão final do Superior Tribunal de Justiça, estando em tramitação no referido órgão.


VOTO DA RELATORA
O amplo debate que cerca a normatização do ensino religioso afeta este Conselho sob duas perspectivas. Uma, de natureza político-filosófica, que diz respeito a tornar pública para a sociedade a compreensão que este Conselho tem do tema em tela. Outra, de natureza pragmática, refere-se às deliberações necessárias para que as redes de ensino organizem seus currículos e seus quadros docentes.

Muitos pontos polêmicos e conflituosos ainda se fazem presentes, sem que tenham sido tocados pelas alterações dos textos oficiais. Alguns já foram tratados por este Conselho no Parecer 23, de 31 de julho de 2001. Outros permanecem em aberto, reafirmando o caráter polêmico da temática.

Se, como prescreve a lei, o ensino religioso é de matrícula facultativa ao aluno, como pode fazer parte dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental? Farão parte das 800 horas de carga horária mínima estipulada? Como computar a carga horária dos alunos que optarem por não freqüentá-lo?

Estas questões associam-se a outras: Como pensar o estabelecimento de conteúdos que respeitem a diversidade cultural e religiosa, ouvindo entidades civis constituídas pelas diferentes denominações religiosas, sem que isso represente qualquer forma de proselitismo? A consulta a essas instituições religiosas poderia ser interpretada como uma forma de ingerência em matéria que cabe ao Estado? Quais critérios seguir para o oferecimento de aulas/turmas que levem em consideração a diversidade de credos (ou ausência deles) dos alunos?

Como equacionar a representatividade de credos religiosos e os critérios oficiais de organização de turmas pautados na relação adulto-criança/jovem? Quantos e com que formação deveriam ser os professores credenciados para esse cargo?
Quais as implicações jurídicas, administrativas, financeiras e estruturais seriam decorrentes dessa medida?

Considerando os muitos questionamentos que permanecem em aberto e as conseqüências administrativas de uma adequação precipitada numa rede de tamanha extensão, é recomendável que nenhuma decisão seja tomada até que a ação de inconstitucionalidade apresentada pela Procuradoria Geral da República seja votada.

O Conselho Municipal do Rio de Janeiro, reafirmando o caráter laico da escola pública, compreende que o ensino religioso não se constitui em uma área de conhecimento específica que deva ser tratada nos moldes disciplinares.
O Conselho compreende que ele integra o que as Diretrizes Curriculares Nacionais nomeiam como Princípios (éticos, estéticos e políticos), devendo, portanto, ser tratado, na condição de Princípio, como um balizador dos Projetos Políticos Pedagógicos, sem hierarquização face a outros valores que circulam na cultura.


DECISÃO DA CÂMARA
Rita Marisa Ribes Pereira
Iza Locatelli
Sérgio Sodré Peçanha
Marcelo Pereira
Maria de Nazareth M. de B. Vasconcellos
Luiz Otávio Neves Mattos

Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2011.

DECISÃO DO PLENÁRIO
O presente Parecer foi aprovado por unanimidade.

Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2011.