domingo, 24 de agosto de 2008

Diferentes religiões se unem para combater a crescente intolerância religiosa no Rio

Casos de agressão e ameaça aumentam cada vez mais na cidade


Rio - A liberdade religiosa e o direito de seguir qualquer credo assegurados pela Constituição não saíram do papel para a professora de Sociologia e Geografia Márcia Alves Ramos, 55 anos. Ela vai deixar o prédio onde mora com o filho, no Humaitá, para se livrar das ameaças que a vizinhança lhe dirige. É a quarta vez que Márcia, filha-de-santo da Casa de Candomblé Yaô Oxum Femi do Idacilê Odé, se vê obrigada a fugir em nome de sua crença. Mas a mesma fé inabalável acredita na justiça dos homens para pôr um freio na intransigência e punir agressores.

Márcia é um exemplo do assustador crescimento da intolerância religiosa no Rio, que muitas vezes vira caso de polícia e choca a população, como o depredamento de um centro espírita no Catete por jovens evangélicos em fúria, no início de junho. Essa realidade, no entanto, começa a mudar.

Grande caminhada marcada para o dia 21 de setembro promete reunir representantes de diversos credos e uma delegacia especializada deverá ser criada para investigar esses crimes. Dezoito denominações fundaram a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, que tem o apoio de outras 100.

'Bruxa macumbeira'
Uma das ações foi a implantação, por parte do governo do estado, de uma ouvidoria para receber denúncias. Em pouco mais de um mês, já foram 150 queixas formais.
Emocionada, Márcia diz que não pretendia se mudar do endereço, onde reside há 9 anos. “Temo mais pela vida do meu filho”, justifica a professora. Ela conta que enfrenta deboches por andar de lenço e colares africanos.

No início do ano, quando teve de raspar a cabeça e usar túnica branca, cumprindo ritual de iniciação para se tornar filha-de-santo, os insultos aumentaram. “Uma jovem de 16 anos, apoiada por amigos, gritava: ‘Olha quem vem aí! A negra macumbeira e bruxa!’. Em julho, o pai dela também começou a me ameaçar. Tenho imagens de pretas velhas, fotos e roupas para preservar a cultura de meus ancestrais, mas nunca fiz culto na minha casa”, defende-se.

Caminhada prevê 50 mil no Leme
A Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, que mantém a ouvidoria, e a comissão apostam na caminhada de setembro, batizada de ‘Liberdade Religiosa! Eu tenho fé!’. “Esperamos receber novos relatos de conflitos e incitações ao ódio. Reuniremos 50 mil pessoas.

A passeata sairá do Leme, às 9h, e terminará no Posto 6”, diz Ivanir dos Santos, do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas. Segundo Ivanir, cada um dos cerca de 23 mil terreiros de Umbanda e Candomblé enviará representantes. Um site (www.eutenhofe.org.br) foi criado para orientar os interessados em participar.

Segundo a estudiosa Maria Dolores de Lima e Silva, do Centro de Tradições Afro-Brasileiras, o ato será em favor da cidadania. “Conflitos religiosos estão se tornando cada vez mais freqüentes e isso é muito perigoso. Vamos mostrar para a sociedade que é possível conviver em paz, embora cada um tenha o direito de exercer a crença que lhe convier. O importante é a fé individual e o respeito mútuo”, prega.
Rastreamento de sites com ódio religioso

Os ataques de fanáticos a templos, centros espíritas, igrejas e terreiros preocupam o chefe de Polícia Civil, Gilberto Ribeiro, que pediu ao delegado da Coordenadoria de Informação e Inteligência Policial (Cinpol), Henrique Pessoa, levantamento de casos de intolerância no Rio. Delegacia especializada para cuidar de casos de intolerância deve ser criada.
Henrique também está investigando mais de 30 sites que incitam o ódio religioso. “Alguns fazem questionários absurdos, criticando e discriminando religiões. Outros chegam a prometer curas milagrosas em troca de dinheiro”, comenta o delegado, explicando que as páginas serão retiradas do ar.
A deputada Beatriz Santos, da Comissão de Combate às Discriminações e Preconceitos da Alerj, recebe ao menos 10 denúncias mensais de intolerância religiosa. Há casos até de terreiros fechados por ordem do tráfico. “É um número alto. Tanto que criaremos conselhos em todos os municípios, a exemplo de São Gonçalo e Nova Iguaçu”, ressalta.
Fonte: O Dia, Caderno: Geral, p. 6 e 7. Dia: 24-08-2008
Jornalista: Francisco Édson Alves

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Igreja evangélica é obrigada a devolver dízimo de fiel em Minas Gerais

A Igreja Universal do Reino de Deus em Belo Horizonte foi condenada a devolver valores destinados à congregação desde 1996, em valores ainda a serem apurados na liquidação da sentença, e ainda ressarcir um homem em R$ 5.000 por danos morais. Segundo o TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais), o fiel foi considerado incapaz de tomar decisões por contra própria.Na sentença, desembargadores entenderam que a Igreja Universal fora negligente ao aceitar as doações. "A instituição religiosa que recebe como doação valor muito superior às posses do doador, sem devida cautela, responde civilmente pela conduta desidiosa", disseram desembargadores da 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Segundo laudo pericial psiquiátrico pedido pelo tribunal, o doador das quantias é portador de enfermidade de caráter permanente.Conforme relatos do TJ-MG, o fiel fora compelido a participar de reuniões antecedidas ou sucedidas de pedidos de doações financeiras.No processo, o freqüentador dos cultos, que não teve seu nome divulgado, foi representado pela mãe. O fiel trabalhava como zelador e tivera todo o ordenado tomado pela doação que fazia à instituição religiosa. Em dado momento, com o agravamento da doença, fora afastado do trabalho e, segundo dados do processo, passara a emitir cheques pré-datados para a Igreja Universal. Ainda de acordo com o tribunal, o homem contraiu empréstimo em instituição financeira e chegou a vender um lote por valor aquém do que o terreno valia em prol da Igreja Universal.Com "promessas extraordinárias", segundo o processo, o homem fora induzido a fazer as doações financeiras e, por seu turno, pessoas que tentavam demovê-lo da prática era tachado de "demônio". A mãe seria o principal ente do mal para ele.Inicialmente, o juiz da 17ª Vara Cível de Belo Horizonte havia argumentado que a incapacidade permanente do doador só fora constatada a partir de 2001, isentando assim a igreja de restituir valores anteriores a esse período. Estipulou assim em R$ 5.000 o valor a ser reembolsado e mais R$ 5.000 por danos morais.Tanto a igreja quanto o rapaz, representado pela mãe, recorreram da decisão. Em nova análise, o desembargador Fernando Botelho, relator do recurso, disse entender que a interdição veio apenas corroborar uma situação de incapacidade pré-existente.A igreja e o incapaz recorreram ao Tribunal de Justiça. O desembargador Fernando Botelho, relator do recurso, entendeu que a interdição do incapaz apenas veio confirmar situação pré-existente. "Mesmo antes de 1996, ano em que o autor passou a freqüentar as dependências da igreja e a fazer-lhe doações, já apresentava grave quadro de confusão mental, capaz de caracterizar sua incapacidade absoluta, já que, no laudo pericial, restou consignado que ele não reunia discernimento suficiente para a realização dos atos da vida civil", informou em seu despacho o relator do processo.Ainda cabe recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília-DF.A reportagem do UOL tentou entrar em contato com os advogados da Igreja Universal do Reino de Deus, mais foi informada que um dos representantes da igreja perante o TJ-MG está em viagem a São Paulo e só retorna a Belo Horizonte no sábado.O advogado Luiz Eduardo Alves, que atuou no caso representando a instituição evangélica, não foi localizado por meio dos números telefônicos repassados à reportagem.

Jornalista: Rayder Bragon; Fonte: Especial para o UOL; Em Belo Horizonte