segunda-feira, 6 de junho de 2011

PR e MS já adotam cotas para negros em concursos estaduais


06/06/2011 18h20 - Atualizado em 06/06/2011 19h16

PR e MS já adotam cotas para negros em concursos estaduais

Nesses estados, aprovados passam por 'avaliação visual'.
RJ será o próximo estado a reservar vagas; decreto foi assinado hoje.

Roseane AguirraDo G1, em São Paulo
O Rio de Janeiro passará a reservar vagas para negros e índios em concursos estaduais, segundo decreto assinado nesta segunda-feira (6). Em levantamento feito pelo G1 em governos e assembleias legislativas de 26 estados e do DF, apenas Paraná e Mato Grosso do Sul dizem ter lei estadual que prevê cotas raciais em concursos dessa esfera pública. Além disso, em outras localidades onde não há regra válida para todo o estado, como no Rio Grande do Sul e o Espírito Santo, alguns municípios adotam a prática.
Não há lei nacional sobre reserva de vagas em concursos para determinadas raças, apenas para deficientes físicos. A lei 8112, que rege o servidor público civil federal, determina que sejam reservadas até 20% das vagas para deficientes, desde que as atribuições do cargo sejam compatíveis com a deficiência. O decreto 3298/99 definiu o percentual mínimo de 5%, ao regulamentar a lei 7853/89, que deve ser aplicado em todo o país.
A regra sobre a cota de 20% para negros e índios nos concursos do Rio começará a valer 30 dias após sua publicação -que deve acontecer nesta terça (7). No Paraná, a lei que reserva 10% das vagas para negros em concursos estaduais está em vigor há 8 anos. Em MS, a reserva de 10% dos postos a negros data de 2008 e a criação de cota de 3% para índios ocorreu em 2010. Mas, como a regulamentação só foi feita neste ano, apenas 3 concursos que consideram a regra foram finalizados, nenhum deles incluindo índios.
Teria passado se não fosse da cota. Mas é a lei, não tem o que se questionar nesse caso"
Wlader Celso Bogarim, que entrou
na Sanepar pela cota para negros
Como é a seleçãoNos três estados, os candidatos podem optar por concorrer ou não pela cota. No PR e em MS, os que se declaram negros ou índios cumprem as mesmas etapas dos demais, porém passam por uma banca que faz uma avaliação visual para confirmar se poderão ficar com a vaga reservada. Essa banca considera não só a cor da pele, mas características como tipo de cabelo, formato da boca e nariz. No RJ, esses detalhes ainda não foram divulgados.
O analista de recursos humanos Wlader Celso Bogarim, de 34 anos, entrou na Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) por meio da cota para negros em concurso realizado em 2008 e se lembra de ter respondido a um pequeno questionário. Uma das perguntas era se já tinha sofrido preconceito pela cor. “A maior parte da avaliação é visual mesmo. Gente de olho verde e cabelo loiro geralmente fica mais nervosa, mas não é o meu caso”, afirma, rindo.
Apesar de ter sido aprovado dentro da cota, Bogarim diz que teria passado no concurso mesmo sem ela e defende o benefício. “Teria passado se não fosse da cota. Mas é a lei, não tem o que se questionar nesse caso.”
COTAS RACIAIS EM CONCURSOS ESTADUAIS
 PRMSRJ
Desde quando20032008 para negros e 2010 para índios2011
Quantidade de vagas10% para negros10% para negros e 3% para índios20% para negros e índios
InscriçõesFicha e declaração por escritoFicha e declaração por escritoNão divulgado
SeleçãoProvas e banca examinadoraProvas e banca examinadoraNão divulgado
No mesmo concurso, Elisangela Bezerra Merini, técnica em edificações, também foi chamada pela cota. "Num primeiro momento, havia cinco vagas. Conforme foram precisando, foram chamando mais gente. Fiquei em 61º no geral e em 5º na da cota. Valeu a pena, fiquei bem na frente", conta.
Sobre a banca, Elisangela diz que não houve constrangimento: "Foi um conversa bem tranquila, eu fiquei bem à vontade."
Cor da pele
“A lei é bem clara, o cidadão tem que ser da raça negra e ter características da raça, podendo ser da cor parda ou preta. A melanina pode variar, mas as características são as mesmas”, explica Fátima Aparecida Vieira Techy Bahls, presidente da comissão de concursos da Sanepar. Ela se refere à lei 14.274/03, que estabeleceu a cota racial no Paraná em 2003.
Segundo Fátima, o benefício é para quem tem dificuldade para conseguir um emprego por possuir as características da raça. “Não porque ele [o candidato] é filho de negro ou neto de negro, o foco é ele ter as características e ser desclassificado por elas quando procura uma vaga. Porque, se você for ver o histórico do Brasil, todos nós temos a descendência.”
No Paraná, no momento da inscrição, o candidato pode optar por concorrer pela cota. A confirmação de que poderá obtê-la se dá no momento da contratação, após ele ter sido aprovado no concurso, explica Fátima. "Tem uma banca com integrantes da empresa e, às vezes, convidados de fora."
Declaração por escrito
As cotas para negros no MS constam da lei 3.594/2008. A cota para índios surgiu com a lei 3.994/10. E ambas foram regulamentadas pelo decreto 13.141/11. No ato da inscrição, o candidato negro precisa fazer uma declaração por escrito. No caso do índio, além da declaração, o candidato deve levar no momento da entrevista um documento da Fundação Nacional do Índio (Funai), confirmando ser indígena. Segudo o diretor-geral de seleção e ingresso de pessoal da Secretaria de Estado de Administração, André Luiz Godoy Lopes, quem disputa uma vaga reservada também passa por uma banca, mas isso pode acontecer antes ou depois das provas.
O candidato tem duas classificações, uma geral e outra da cota. De acordo com a nota, ele pode entrar como cotista ou como candidato não cotista"
André Luiz Godoy Lopes, da
Secretaria de Administração de MS
Na maioria dos casos, essa banca é realizada pela empresa ou instituição contratante, próximo ao momento da contratação. A comissão avaliadora, diz Lopes, é composta por integrantes do departamento de recursos humanos e  representantes da coordenadoria da igualdade racial ou associações de defesa de direitos de afrodescendentes. “Há um entendimento sobre quais são as características sobre cabelo, cor da pele, formato de nariz e de boca, então cabe a eles [a comissão] decidir se o candidato se encaixa ou não”, explica o diretor.
Duas classificações
Os inscritos cotistas concorrem duas vezes no concurso, dizem os organizadores. “O candidato tem duas classificações, uma geral [concorrência ampla] e outra da cota. De acordo com a nota, ele pode entrar como cotista ou como candidato não cotista”, afirma Lopes, de MS. O inciso I do artigo 10, do decreto nº 13.141/11 do estado, diz que “a cada fração de 10 candidatos, a décima vaga fica destinada a candidato negro aprovado, de acordo com a sua ordem de classificação na lista específica, em observância ao princípio da proporcionalidade”.
Nos dois estados, caso a cota não seja preenchida, as vagas são distribuídas aos demais candidatos, de acordo com a ordem de classificação. Isso também ocorrerá no RJ.

CONCURSOS ESTADUAIS TERÃO 20% DAS VAGAS RESERVADAS PARA NEGROS E ÍNDIOS

 06/06/2011 - 11:14h - Atualizado em 06/06/2011
 » Por Guedes de Freitas
Governador Sérgio Cabral assinou o decreto nesta segunda-feira que passa a vigorar daqui a 30 dias

O Governo do Estado estabeleceu, a partir desta segunda-feira, um sistema de cotas para negros e índios nos concursos públicos para órgãos do Poder Executivo e da administração do Estado do Rio. Ao assinar, em cerimônia no Palácio Guanabara, o decreto que reserva 20% das vagas para negros e índios nos concursos públicos do Estado, o governador Sérgio Cabral prognosticou o mesmo sucesso da lei de cotas que foi implantado pioneiramente pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), há dez anos.

- Com essa política, reconhecemos que o negro e o índio foram vítimas durante séculos e que as oportunidades ainda não são iguais. O Estado do Rio foi o primeiro a estabelecer cota para negros e índios na universidade, e a política de cotas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) é um sucesso. Agora, a paisagem do serviço público brasileiro começa a mudar a partir do Estado do Rio de Janeiro. Nos nossos órgãos públicos haverá mais negros e índios – apostou Cabral.

Para o governador, o racismo ainda existe no Brasil e deve ser combatido. Portanto, o Governo do Estado entende que é dever da administração pública promover ações que busquem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho, diante da desigualdade proporcional entre negros e índios e o restante da população fluminense em relação a acesso a cargos e empregos públicos.

A ministra da Igualdade Racial, Luíza Bairros, disse que os agentes políticos e a iniciativa privada de outros estados deverão se mobilizar para replicar esta nova experiência do Rio de Janeiro. Ela disse que a iniciativa do governador vai contribuir para a luta contra as desigualdades raciais no país.

– O Rio de Janeiro deu o pontapé inicial e os outros estados virão atrás. A assinatura deste decreto torna mais evidente a importância de termos no Brasil o Estatuto da Igualdade Racial que dá ao Poder Público amplas possibilidades de trabalhar de forma efetiva para a igualdade racial no Brasil – argumenta a ministra.

O secretário de Assistência Social e Direitos Humanos, Rodrigo Neves, exemplificou com o quadro de funcionários da Defensoria Pública, hoje comandada por um negro, Nilson Bruno, como é difícil para representantes desse segmento da população a ascensão a vagas no mercado de trabalho, inclusive público.

– Temos hoje mais de 800 defensores e somente 15 são negros. Não tenho dúvida que esta iniciativa vai reduzir as desigualdades nas oportunidades de trabalho da administração pública com maior presença de negros entre os funcionários de várias secretarias órgãos estaduais, ocupando cargos inclusive nos altos escalões – constata o secretário.

Candidato deve se declarar negro ou índio na inscrição
O decreto, que entra em vigor 30 dias após sua publicação, também leva em consideração o artigo 39 da Lei federal 12.288, de 20 de julho de 2010, que impõe expressamente ao Poder Público a promoção de ações que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra, inclusive com a criação de sistema de cotas.

Para se candidatar reserva de 20% das vagas a pessoa se declarar negra ou índia no momento da inscrição no concurso. Quem optar por não entrar no sistema de cotas fica submetido às regras gerais do concurso. Para serem aprovados, todos os candidatos – inclusive índios e negros autodeclarados – precisam obter a nota mínima exigida. Se não houver negros ou índios aprovados, as vagas de reserva voltam para a contagem geral e poderão ser preenchidas pelos demais candidatos, na ordem de classificação. A nomeação dos aprovados também obedece à classificação geral do concurso, mas a cada cinco candidatos aprovados, a quinta vaga fica destinada a um negro ou índio.

Segundo Afonso Apurinam, um dos representantes dos indígenas na cerimônia, há cerca de 30 mil trabalhadores índios em atividade no estado, segundo o último censo do IBGE, mas o número poderia ser maior se, na hora de preencher os cadastros de empregos, a pessoa se autodeclarasse indígena, o que nem sempre ocorre com medo de ser dispensado. Por isso, ele parabenizou o Governo do Estado pela reserva de mercado para negros e índios.

– O decreto é muito importante para nosso povo aqui no Rio de Janeiro, porque nos dá o direito de lutar por uma vaga no serviço público estadual de igual para igual com todo mundo. Há 500 anos que não nos dão, às vezes, nem o direito de falar – afirmou o líder indígena, que, embora seja do Amazonas,vive no Rio onde participa, no Museu do Índio, no Maracanã, da luta pela preservação da cultura indígena.

Resultados serão acompanhados nos próximos 10 anos

O decreto vai vigorar por pelo menos 10 anos e seus resultados serão permanentemente acompanhados pela Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos. A cada dois anos, um relatório será apresentado ao governador em exercício. No último trimestre do prazo de 10 anos, a secretaria apresenta um relatório final, podendo recomendar a edição de um novo decreto sobre o tema.



Estado assina hoje decreto que cria cota em concursos

06.06.11 às 01h09


Estado assina hoje decreto que cria cota em concursos

Candidato que se autodeclarar negro ou índio terá direito à reserva de 20% das vagas

POR ALINE SALGADO
Rio - No tom das políticas afirmativas, o governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, assina hoje decreto que estabelece reserva de 20% das vagas em concursos públicos estaduais a candidatos que se autodeclararem negros ou indígenas. A medida se insere no conjunto de projetos a serem incentivados ao longo de 2011, instituído como ano estadual das populações afrodescendentes e das políticas de promoção da igualdade racial.

Nos cursinhos preparatórios, a ação afirmativa gerou surpresa entre candidatos, brancos e negros. A ausência de um debate amplo, com a participação da população e de deputados da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), foi apontada com uma das falhas da iniciativa.

“Me sinto tolido como cidadão, por não ter tido a possibilidade de opinar sobre uma medida tão importante. Como candidato a concursos, continuarei estudando porque sei que a aprovação só dependerá da minha dedicação”, afirma Daniel Reis, de 32 anos, ex-aluno de Latim da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Colega de classe de Daniel, no curso preparatório Maxx, Jefferson Espíndola, 26 anos, teme que a lei de cotas esconda a importância de se investir mais na educação pública. “O meio de contornar a desigualdade racial deveria ser pautado na valorização salarial do professor em sala de aula”, diz o historiador. 

Análise social e econômica deveria entrar

Para o advogado especializado em concursos públicos, Sérgio Camargo, a reserva de vagas em seleções deveria incluir requisitos sócio-econômicos para impedir tentativas de fraude. 

“A medida pura, sem estar atrelada a um critério objetivo como a baixa eficiência econômica, corre o risco de se traduzir em um desequilíbrio racial, além de abrir brecha para uma enxurrada de ações na Justiça. O sistema de cotas seria completo se fossem adicionados à autodeclaração da raça a análise do Imposto de Renda dos últimos três anos e a exigência de que o candidato comprove que 50% de sua vida escolar foi em instituições públicas de ensino”, avalia.

Para ministra, Rio está na vanguarda da igualdade social

Mestre em Ciências Sociais, a atual ministra-chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Helena de Barros crê que a adoção de ações afirmativas na esfera estadual, aliada aos programas sociais desenvolvidos a partir das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), coloca o Rio na vanguarda dos movimentos rumo à igualdade racial. 

Para ela, o novo posicionamento do estado em relação aos concursos (terceiro depois do Paraná e Mato Grosso do Sul a adotar a reserva de vagas) mostra a necessidade de se modificar a situação social do negro no serviço público.

“Em se tratando de uma medida para o mercado de trabalho, a ideia é que se estabeleça esse tipo de ação afirmativa como um meio de modificar a situação social do negro nas repartições públicas”, afirma.

Para a ministra, hoje, há uma tendência no crescimento da presença dos negros nas ocupações terceirizadas e não efetivas. “Na medida em que o senso demográfico mostra que existe uma maioria negra na sociedade, não podemos deixar que haja espaços reservados às pessoas brancas. A composição racial do País deve estar representada em todas as esferas


domingo, 5 de junho de 2011

Pelo direito de aprender - cotas e programas derrubam mitos


05.06.11 às 00h37

Pelo direito de aprender

Cotas e programas de apoio derrubam mitos e levam educação e futuro a milhares de jovens. C e D já são maioria na universidade

POR ÉLCIO BRAGA
Rio - A resposta simples e desanimadora mudou destinos. Início de 1990, salão da Igreja da Matriz, em São João de Meriti: cem jovens negros e carentes falavam sobre a fé. Por curiosidade, frei David Raimundo dos Santos perguntou quantos queriam fazer faculdade. "Apenas dois irmãos confessaram a intenção, obrigados pela mãe, agraciada por bolsas na instituição em que trabalhava como servente", lembra. 

O episódio levou à criação da Educafro, influente entidade empenhada na democratização do acesso à faculdade pública. A ideia tornou o Rio mais justo e se espalhou pelo Brasil. Nos últimos cinco anos, mais negros entraram na universidade do que em todos os séculos anteriores somados.
Foto: Paulo Araújo / Agência O Dia
Luana Castro: “Sem a cota, meu futuro seria incerto. Passei para Direito. Meu pai e minha mãe choraram muito” | Foto: Paulo Araújo / Agência O Dia
Multidão de carentes passou a enxergar brecha no muro da faculdade. Política de cotas, pré-vestibulares comunitários e Programa Universidade para Todos (ProUni), do Governo Federal, criaram novo cenário. As classes C e D se tornaram maioria na universidade: 72,4%. “Diziam que eu, merendeira, filha de lixeiro, não podia fazer faculdade”, conta Therezinha Mello, 71, formada há seis em Serviço Social. 

Contrários à ideia argumentavam que cotistas não conseguiriam acompanhar a turma. Pesquisa entre 2003 e 2006 mostrou desempenho do cotista superior em 29 dos 48 cursos na UERJ. "A minha grande alegria é que as cotas derrubaram a máscara das universidades públicas brasileiras", diz Frei David.