domingo, 21 de fevereiro de 2010

Grande Otelo 15/6/1987 A escolha do próprio nome, as tragédias da vida, a bebida e a carreira brilhante são temas tratados com sinceridade e bom humo

Grande Otelo
15/6/1987
A escolha do próprio nome, as tragédias da vida, a bebida e a carreira brilhante são temas tratados com sinceridade e bom humor nesta entrevista



Rodolpho Gamberini: Boa noite. Está começando neste momento mais um Roda Viva, o programa de entrevistas e debates da TV Cultura de São Paulo. Esta noite, no centro da Roda Vida, está Sebastião Bernardes de Souza Prata [1915-1992]. Pouca gente o conhece com esse nome, mas vocês já estão vendo aí a imagem, é o grande ator Grande Otelo. E, para participar desta entrevista do Roda Vida desta noite, estão aqui no estúdio da TV Cultura de São Paulo, Watusi [premiada compositora e intérprete brasileira de carreira internacional. Apresentou-se em diversos países da Europa, tendo inclusive atuado em um coro, entre 1978 e 1982, no famoso cabaré parisiense Moulin Rouge], que é atriz, cantora e partner de Grande Otelo no show que ele tem, que ele mantém há quatro anos quase, o show Golden Rio, no Scala [casa de shows fundada em 1983 como a maior da América Latina, famosa por seus bailes de carnaval, com destaque para o baile GLS Gala Gay, que acontece todo ano] do Rio de Janeiro. Está aqui conosco também Leon Cakoff, que é critico e organizador do cinema de São Paulo [Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, exibição anual de cinema criada por Cakoff em 1977]; Luciano Ramos, crítico de cinema e apresentador da TV Cultura; Ângela Marsiaj, que é repórter da Folha de S. Paulo; Luiz Fernando Emediato, editor do Caderno 2 da Folha de S. Paulo [O Estado de S. Paulo]; Edmar Pereira, crítico de cinema do Jornal da Tarde; Dirceu Soares, crítico de cinema da revista Afinal; o ator Paulo Betti; e o cartunista Paulo Caruso, que faz os desenhos que nós vemos aí no ar de vez em quando, e já preparou aí o primeiro desenho do Grande Otelo sentado no meio da roda. Está até saindo umas gotinhas de suor aí na sua cabeça. [Programa ao vivo, que permitiu a participação do telespectador por telefone, fax e internet] Vamos começar então a nossa conversa, Grande Otelo. Você está com esse show no Scala, o Golden Rio, há quase três anos e meio, já vai para quatro anos, tomara que passe disso... [sendo interrompido]

Grande Otelo: Graças a Deus!

Rodolpho Gamberini: Como você explica essa temporada tão longa? Isso não é muito costumeiro no Brasil. Como você explica o sucesso?

Grande Otelo: O show, em geral, e particularmente a figura da Watusi e também com a vontade com que eu me sinto ao lado dela, as moças todas muito disciplinadas, no mise-en-scène muito bem disciplinadas, os ensaios quase que diários... E o vi-sual do show é muito bonito, as músicas são bonitas, bem interpretadas por Watusi... [sendo interrompido]

Rodolpho Gamberini: Mas você se exime de qualquer responsabilidade pelo sucesso do show? Até agora você só falou... [sendo interrompido]

Grande Otelo: Peraí, peraí, você não me deixou acabar!

Rodolpho Gamberini: Ah, bom! Você está começando. Está bom!

Grande Otelo: Ao lado da Watusi, que trouxe uma cultura cênica bem européia e bem arraigada, eu tive que modificar um pouco o meu trabalho, que era mais brasileiro, mais à vontade e coisa e tal, e isso parece que agradou o público em ver uma faceta nova em mim, porque estavam habituados a ver a molecagem e a ver brincadeira, aquela coisa e tal. Mas, diante daquele cabedal de cultura artística que ela representa para mim, eu me modifiquei, eu me formalizei, me tornei mais elegante [sorrindo, estica o pescoço e gesticula abrindo os braços, modificando o tom da voz e simulando elegância]. Então, foi uma novidade, eu me modifiquei, quer dizer, eu entrei dentro de um outro clima.

Rodolpho Gamberini: Você aprendeu um pouco, você acha?

Grande Otelo: Aprendi. Aprendi, porque a cultura artística européia, em geral, ensina muito à gente.

Rodolpho Gamberini: O Luciano Ramos quer te fazer uma pergunta. Vamos lá, Luciano.

Luciano Ramos: Estou olhando aqui... o pessoal olhando para o Grande Otelo sentadinho no meio da arena e estava... o pessoal estava com cara que parecia os romanos olhando para os cristãos na arena [onde seriam, quase sempre, devorados pelos leões], porque o cenário aqui lembra. Então, fiquei pensando em perguntar para o Otelo o seguinte, apesar de que ele já deve ter respondido isso um milhão e setecentos e vinte e cinco vezes, fora os ameaços... que você começou lá em Uberabinha... [sendo interrompido]

Grande Otelo: Não fala Uberabinha para mim que tem briga!

Luciano Ramos: Desculpe, Uberlândia [a cidade mineira, onde Grande Otelo nasceu, era chamada no início do século XX de São Pedro do Uberabinha]! No picadeiro em Uberlândia, em 1922, com sete anos de idade.

Grande Otelo: Comecei em 1923. Vinte e quatro [1924]!

Luciano Ramos: Errei por um, tudo bem! Mas, então, é o seguinte: era um picadeiro de circo e estava me lembrando aqui se esse ambiente não lembra um pouquinho o picadeiro.

Grande Otelo: Me lembra mais uma arena romana, o picadeiro, não, porque no picadeiro havia muita alegria, muita gritaria e depois aquela minha primeira... Porque a primeira entrada que eu fiz foi uma beleza, porque eu já era assim um palhaço da cidade, com a pouca idade que eu tinha. Então, naquele dia o circo encheu mais para ver o Bastiãozinho [Bastiãozinho, como era chamado Grande Otelo na infância, foi convidado para participar de uma farsa durante a passagem do circo Serrano em Uberabinha, no papel da mulher de um palhaço].

Rodolpho Gamberini: Quantos anos você tinha?

Grande Otelo: Eu tinha uns sete anos. Bastiãozinho, vestido com um vestido comprido e com um travesseiro no bumbum e rebolando de braços com o palhaço. Aí todo mundo riu, todo mundo achou graça. E era 1923, conforme diz o Luciano, e em 1923 a gente comprava feijão a litro, arroz a litro [esses alimentos e outros grãos eram vendidos a granel nas vendas e armazéns e não eram pesados em balança, eram mensurados em uma caneca grande cuja capacidade era de um litro], não havia uma porção de complicação que há hoje. Até o arroz e feijão chegar na mesa das pessoas demora pra burro! Então, hoje o clima é completamente outro.

Rodolpho Gamberini: Otelo, desculpe, o Leon Cakoff quer te fazer uma pergunta.

Leon Cakoff: Me parece que, antigamente, o seu nome não era Grande Otelo, era The Great Othelo, em inglês. Como é que começou isso?

Grande Otelo: Isso começou na Companhia Negra de Revistas. Não, começou na Ópera Lírica Nacional, aqui em São Paulo! Era uma organização subsidiada do bolso do próprio governador daquela época, o presidente Carlos de Campos [(1866-1927), presidente no período de 1924 a 1927. Compositor e estudioso da música, apoiou a Ópera Lírica e hoje denomina o Conservatório Musical da cidade de Tatuí, interior do estado de São Paulo, referência nacional na formação de músicos, e ainda fundador e membro da Academia Paulista de Letras]. Ele tinha uma organização que era a Ópera Lírica Nacional, funcionava nos baixos do Teatro Municipal. Uma noite... que uma noite? Uma tarde, o maestro experimentou minha voz, porque eu acompanhava a filha da minha tutora nos estudos dela de canto, para ela não ir sozinha. Então, ele experimentou a minha voz e me viu pretinho, pequenininho... A minha voz era de tenorino [voz aguda masculina de criança e adolescente] - ele achou que era - e eu cheguei a cantar a ópera Tosca [ópera de Giacomo Puccini (1858-1924), famoso compositor italiano], aquela parte pastorela [canção trovadoresca que invoca a vida campestre] da Tosca, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. E ele achou que eu, quando crescesse, cantaria O Othello [drama lírico em quatro atos de Giuseppe Verdi (1813-1901), considerado o mais importante compositor de óperas do século XIX. A ópera é baseada na tragédia de Shakespeare, de mesmo nome]. Seria um fisique du rôle [perfil físico] autêntico: negro, grande e tal, etc. E aprendemos o exultate, aquela parte célebre d´O Othello. E transportava para o meu tom, cantei vários trechos de Ópera, canto harmonia e o exultate d' O Othello. Mas eu não cresci.

Rodolpho Gamberini: Ainda bem, não é? [Risos]

Grande Otelo: Eu não cresci e resolvi cantar samba, fazer graça. Resolvi ser engraçado, sabe? Então, entrei numa companhia que foi um sucesso naquela época. Muita gente não tem conhecimento disso: houve, no Brasil, uma Companhia Negra de Revistas. O galã, o chansonnier, era negro. A primeira atriz cantora negra, que era a Rosa Negra [cantora e atriz, apresentava-se nos bares e parques de diversões cantando e dançando. Descoberta pelo revistógrafo Marques Porto, estreou no Teatro São José em 1926, na revista Pirão de areia, e foi a atriz mais aplaudida na revista do São José. Estrelou na Companhia Negra de Revista. Com a extinção da Companhia, continuou fazendo sucesso em outros teatros de revista]. Os cômicos negros - que eram o Mingote - o Osvaldo Viana e o maestro era o Pixinguinha. Essa companhia foi assistida até pelo próprio Mário de Andrade, eu até agora pretendo pesquisar O Estado de S. Paulo pra ver se eu encontro lá uma das críticas do Mário de Andrade e o meu nome. Eu espero isso!

Luciano Ramos: Será que - desculpe te interromper -, será que vendo você lá... Isso foi em 1926?

Grande Otelo: 26.

Luciano Ramos: Ele, vendo você, será que não foi daí que ele pegou aquele pretinho cantando, dançando, cantando em várias línguas, falando vários idiomas... Será que não foi daí que ele pegou o negócio de Macunaíma, que mais tarde você veio a fazer?

Grande Otelo: Eu tenho esperança.

Luciano Ramos: Mas essa idéia não passou pela sua cabeça?

Grande Otelo: Passou pela minha cabeça e por isso que eu quero pesquisar os jornais.

Luciano Ramos: Vale a pena porque, de repente, você perfura e encontra o petróleo.

Grande Otelo: Daí, então, conforme eu estava te dizendo, eu passei a ser o pequeno Otelo. Tanto que, no colégio, eu assinava, no Instituto Modelo Caetano de Campos, escola modelo Caetano de Campos, eu assinava Otelo. E como eu passei para a tutela da família Queiroz, eu assinava Otelo Queiroz. Mas isso é outra história. Família Queiroz é outra história, mas uma história muito bonita também.

Rodolpho Gamberini: Uma história de adoção, parece.

Grande Otelo: É, fui adotado pela família Queiroz, da família do professor Queiroz Filho, e daí eu passei para o Coração de Jesus e ainda assinava Otelo Queiroz. E eu passei a assinar o meu nome certo, Sebastião - que não é meu, certo, Sebastião Bernardes de Souza Prata - quando eu precisei de um contrato para o Cassino da Urca, para trabalhar coisas de Phil Baker [ator, atuou no cinema em filmes ao lado de Carmen Miranda] em 1939. Porque lançou, na realidade, Sebastião Bernardo da Costa, e eu não gostava do Bernardo e botei Bernardes. Da Costa eu desprezei, peguei o nome da mamãe, Souza, e o nome da família que o papai era agregado, Prata: Sebastião Bernardo de Souza Prata, em arte Otelo. E, depois, a crítica do Rio de Janeiro me batizou como Grande Otelo, por intermédio do Jardel Jércolis [(1894-1944), ator, autor, cenógrafo, diretor, maestro e empresário teatral, foi um dos precursores do teatro de revista no Brasil, pai do ator Jardel Filho que fez sucesso na televisão, em particular na TV Globo] que me lançou como o The Great Othelo, cantando um fox que dizia assim: "Go-golden, África; jun-jungle, África". E aí entrava uma mulata e dizia: O que é isso? Quem é o moleque meio-quilo, um latão de querosene e cantando esse troço aí? E aí eu falava: "I don’t understand" [risos]! "Olha, deixa de conversa, eu vou cantar um samba e você vai se desmanchar todo, quer ver?" E eu entrava de casaca e tudo - mas por baixo uma camisa de malandro - e ela começou a cantar um samba e eu fui me desmanchando, desmanchando, fui tirando a casaca, tirando a camisa, tirando o colarinho e tal, fiquei com a camisa de malandro, etc, fiz uma força danada, mas ninguém prestou atenção em mim, não houve palmas. Foi um dos meus primeiros fracassos na vida, porque eu também tive um fracasso aqui em São Paulo, eu fui vaiado aí num subúrbio que hoje é uma cidade quase.

Rodolpho Gamberini: O Dirceu Soares, da revista Afinal, quer te fazer a próxima pergunta.

Dirceu Soares: Otelo, você falou, ainda há pouco, das suas cantorias e você cantou a vida inteira.

Grande Otelo: Toda a vida!

Dirceu Soares: Mas você não fez carreira em discos?

Grande Otelo: Não, não fiz carreira em disco.

Dirceu Soares: E por quê?

Grande Otelo: Porque quando eu comecei a fazer carreira em discos eu estava no Cassino da Urca fazendo carreira humorística. Eu era engraçado, fazia mais sucesso no Cassino da Urca do que no disco. A minha voz, eu usava ela de todas as maneiras e tornava-se engraçado com os números que eu fazia com a atriz Déo Maia [atriz e cantora negra que fazia enorme sucesso no Cassino] e as fábricas de discos não se interessavam muito pela minha interpretação em discos. E também, naquela época, o Jardel Jércolis dizia que eu cantava samba paulista, um samba quadrado, e eu fiquei com aquilo na cabeça e custei a entrar no ritmo realmente do samba.

Dirceu Soares: Mas tem o negócio do compositor, tem a carreira de compositor.

Grande Otelo: Pois é, mas como compositor eu só consegui gravar uns dez sambas só e entre eles o famigerado "Praça Onze", que me persegue.

Dirceu Soares: Afinal, como é essa história do famigerado "Praça Onze"? Como é que entra essa parceria você com o Herivelto [Herivelto Martins, famoso cantor e compositor de clássicos da música popular brasileira como "A Lapa", "Caminhemos", "Atiraste uma pedra", "Ave Maria do morro", e "Praça Onze", em parceria com Grande Otelo. Foi casado com a cantora Dalva de Oliveira, com quem teve um filho, também cantor, Pery Ribeiro]?

Grande Otelo: Essa parceria, quando os japoneses atacaram Pearl Harbor [base naval e quartel-general da frota norte-americana do Pacífico, na ilha de O'ahu, Havaí, atacada pelos japoneses em 1941 e que provocou a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial]. Eu achei que o Brasil deveria entrar na guerra, porque o Brasil era um amigo da América do Norte e eu digo: “Esse negócio dá samba, mas como é que eu vou fazer um samba de japonês, que entrou na guerra, e coisa e tal?”. Aí comecei a pensar, bolar e me lembrei dos tempos de colégio e daquela coisa: "Deitado eternamente em berço esplêndido, ao som... e à luz do céu profundo..." [cantando]. Deitado eternamente? Desperta Brasil!: "Desperta Brasil, raiou o teu alvorecer, desperta Brasil, queremos lutar, queremos vencer..." [cantando]. Foi daí que apareceu.

Luciano Ramos: Linda Batista gravou.

Grande Otelo: Linda Batista gravou.

Luciano Ramos: Ele perguntou a "Praça Onze" e você respondeu "Desperta Brasil", que é um samba oportuno para ser gravado agora. Ele é muito bonito. Mas tudo bem, toca pra frente.

Grande Otelo: O "Praça Onze" eu já fazia os versos, conforme eu fiz "Desperta Brasil". Eu fiz uns versos que diziam assim, porque o Davi Nasser fez uma crônica a propósito dos projetos que existiam na época, fazer ali na Praça Onze o busto do Dr. Getúlio Vargas e fazer a [avenida] presidente Getúlio Vargas [A Praça Onze, situada no Rio de Janeiro, é considerada o berço do samba, tendo sido ponto de encontro dos negros, músicos e compositores anônimos, autores de maxixes e marchinhas. Era também o local onde as camadas populares festejavam o carnaval]. Então, eu fiquei muito sentido, porque eu tinha visto samba na Praça Onze e sabia como era gostoso, animado e entusiasmado. Eu fiz: "Meu povo, este ano a escola não sai. Vou lhes dar explicações: não temos mais a Praça Onze para as nossas evoluções. Ali, onde a cabrocha mostrava o seu requebrado, um grande homem no bronze será por todos lembrado", e queria que isso fosse um samba, mostrei para vários compositores e nenhum deles se interessou. O Herivelto Martins, por acaso, nessa época, entrou para o Cassino da Urca onde eu já estava, e eu toca aborrecer a paciência do Herivelto Martins. Um dia, o Herivelto diz: "Me dá aqui essa porcaria!" Pegou, botou na perna, pegou o violão e: "Vão acabar com a Praça Onze, não vai haver mais escola de samba, não vai..." [cantando]. E saiu a primeira parte. Naquela época, nós viajávamos para Niterói numa barquinha e voltávamos numa lancha, e voltávamos de barca, e na volta da barca o Herivelto Martins pegou o violão novamente e fez a segunda parte. Esse samba "Praça Onze" nasceu num dia... numa noite, numa noite em uma viagem entre Niterói e Rio de Janeiro.

Watusi: Grande Otelo, gostaria de lhe fazer uma pergunta e é bem difícil eu, como sendo uma companheira de trabalho sua, fico assim meio atordoada aqui em perguntar ao Grande Otelo, mas uma das coisas que eu queria perguntar a você é: o Cassino da Urca terminou tem mais ou menos uns quarenta anos, não?

Rodolpho Gamberini: Exatamente quarenta anos.

Grande Otelo: Quarenta e um anos.

WatsubiI: Quarenta e um anos. Você poderia explicar, eu como vedete de music hall [gênero norte-americano que se assemelha ao teatro de revista], eu gostaria muito de saber o que foi o Cassino da Urca, qual a diferença do espetáculo dessa época para o agora e do que nós estamos fazendo parte?

Grande Otelo: O Cassino da Urca, Watusi...

Edmar Pereira: Você falou de Josephine Baker [(1906-1975), cantora, bailarina e atriz de cinema norte-americana e que fez enorme sucesso na França, com seu tipo exótico], e eu queria saber a diferença entre Josephine Baker e Watusi. Como mudaram, através da sua vida, o estilo e a personalidade das estrelas com quem você contracenou? Tudo mais ou menos a mesma história vindo da Urca.

Grande Otelo: O Cassino da Urca, Watusi, era uma coisa maravilhosa. Maravilhosa porque com o dinheiro do jogo se podia fazer coisas muito bonitas, inclusive a cortina era toda de espelhos, a cortina abria-se assim e a orquestra avançava num carrinho na frente do palco e debaixo subia um outro palco e dos lados havia palco também. Então, quando todo mundo estava em cena, aquilo era um deslumbramento, e ali naquele Cassino da Urca o maior brilho era da Linda Batista, aquela voz maravilhosa. Eu tinha por encargo fazer as cortinas com a Déo Maia, graças a Deus muito engraçadas para a época, e todo mundo achava muita graça, então a Linda Batista era a estrela cantora e eu era o astro ator, que eu fazia o ator. No Cassino da Urca trabalharam grandes atores como o Mesquitinha [Olympio Bastos, 1902 – 1956, natural de Lisboa, Portugal veio para o Brasil em 1907 e em 1927 foi para o Rio de Janeiro, fez revistas e comédias e dirigiu quatro filmes, alcançando grande sucesso], Manuel Pera [1893-1967, ator, imigrante português, pai da atriz Marília Pera] e com grande sucesso, porque o público, realmente, era um público brasileiro e prestava atenção nas piadas que eram brasileiras, e o sucesso tanto poderia ser das moças estrangeiras, as girls que vinham para o Cassino, como podia ser meu e da Déo Maia ou então do Mesquitinha ou do Manuel Pera falando. Jararaca e Ratinho [era uma dupla] trabalharam no Cassino da Urca fazendo piada, Jararaca e Ratinho, dois artistas com muito sucesso. Tatuzinho, do Rio Grande do Sul, trabalhou no Cassino da Urca com muito sucesso. Havia lugar para todo mundo, todo mundo fazia sucesso. Hoje em dia se você trabalhasse em um ambiente como o Cassino da Urca, com todas aquelas circunstâncias, você teria muito mais aplausos do que tem no Scala que é um público muito heterogêneo, se bem que você esteja preparada para esse público heterogêneo. Conforme eu disse, a sua cultura artística que você trouxe da Europa, o seu amalgamento, foi uma coisa maravilhosa que eu respeito de uma maneira incrível. Se bem, não é dizer que não se possa formar artistas brasileiros com a mesma disciplina que você tem, pode-se formar, pode-se formar.

Watusi: Em geral, nós brasileiros não somos bem disciplinados para qualquer tipo de serviço, não é? É a grande verdade.

Grande Otelo: Não, eu trabalhei com José Carlos Manga [1928, diretor cinematográfico, fez sucesso na Atlântida Cinematográfica Ltda, na época das chanchadas. Em 1953 fez o filme Matar ou Correr, uma paródia do filme Matar ou Morrer de Fred Zinnemann, com a dupla Oscarito e Grande Otelo. Foi também publicitário e diretor artístico de mini-séries da Rede Globo] muito disciplinado, Vitor Berbara [produtor de teatro e de filmes] muito disciplinado, trabalhei com Daniel Filho [ator, diretor e produtor de peças para teatro, televisão e cinema, ligado à Rede Globo] muito disciplinados...

Watusi: São exceções, são exceções.

Grande Otelo: ...Trabalhei com Valter Campos [diretor, produtor], muito disciplinado. Em geral tenho encontrado diretores disciplinados, eu é que sempre fui muito indisciplinado [risos].

Watusi: Isso que eu queria te perguntar, Otelo, porque nós somos companheiros de trabalho, não é? Então na questão da disciplina você me elogiou muito, porque eu sou uma pessoa muito disciplinada, e sou mesmo porque eu gosto muito das coisas que faço e...

Grande Otelo: Eu também gosto, mas isso não impede de ...

Watusi: Mas acontece de eu perguntar “Cadê o Otelo?” “O Otelo não vem hoje”, “Mas como não vem?”. Nós temos um número assim que foi preparado, que aliás é o número mais bonito do espetáculo, que foi preparado para homenagear esta grande figura que é o Grande Otelo. Então, no dia em que você não vem e de repente você fica não é... Não sei o que acontece no homem Sebastião Bernardes de Souza Prata que de repente não aparece, então esse lado é que muita gente gostaria de saber: o que passa com Sebastião Bernardes de Souza Prata, que não é...não é tão disciplinado assim?

Grande Otelo: É um cidadão brasileiro. Sebastião Bernardes de Souza Prata é diferente do Grande Otelo. O Grande Otelo é um ator e o Sebastião Bernardes de Souza Prata é um cidadão brasileiro preocupado completamente com todos os problemas do Brasil, porque todos nós, querendo ou não querendo, de qualquer maneira a gente se preocupa. Por menos que a gente queira. E isso "embaratina", às vezes, e eu não tenho vontade de trabalhar, fico meio desanimado.

Rodolpho Gamberini: Pois é, exatamente. Grande Otelo. Olha, Grande Otelo, desculpe. Vamos ver, justamente, num trechinho agora de Macunaíma, antes de você falar.

Grande Otelo: É que eu não quero esquecer a pergunta dele!

Rodolpho Gamberini: Em seguida você volta para falar da Josephine Baker e da Watusi. É essa a pergunta? Pode deixar que eu não deixo você esquecer. Vamos ver um trechinho de Macunaíma.

[Exibição de trecho do filme Macunaíma]

Rodolpho Gamberini: Esse aí é o retrato do cidadão brasileiro, na sua opinião, Grande Otelo?

Grande Otelo: Com a continuidade você vai ver que é mais ou menos o retrato do cidadão brasileiro, porque esse Macunaíma que está aí, ele depois ficou branco, virou branco, segundo Mário de Andrade, e realmente o cidadão brasileiro quando bota um smoking, quando bota uma casaca ele se torna outra pessoa e aí é que ele fica branco, porque o cidadão brasileiro no fundo é preto; o cidadão brasileiro no fundo é uma cruza de raças. [Fala declamando] "O brasileiro traz dentro de si um português, um negro e um índio guarani. O luso, a fidalguia própria dessa raça, herdou do índio o amor à pesca e a inclinação à caça. No excesso de carinhos e desvelos, reflete do africano o doce coração, e às vezes nos cabelos aquela permanente ondulação. Em harmonia vivem sempre os três. Enquanto o negro bebe e o guarani batalha, o português trabalha, mas haste no esplendor da graça uma mulata passa quebrando as ancas do jogo, o negro dança, o bugre pega fogo e o português avança". Este é o cidadão brasileiro, é o Macunaíma, cidadão brasileiro. [Risos]

Rodolpho Gamberini: Você quer responder a pergunta do Edmar? Ele está morrendo de dar risada da sua resposta.

Edmar Pereira: A gente falava de Josephine Baker. Voltemos...

Grande Otelo: Pois é, Josephine Baker é uma das mais importantes na minha vida, porque quando eu trabalhei com Josephine Baker, no Cassino da Urca, trabalharam mais doze outros negros em um cassino onde eu entrava pela porta dos fundos, porque eu não podia entrar pela porta da frente, negro não entrava pela porta da frente. E quando o negro foi contratado para trabalhar no palco, isso para mim foi um orgulho muito grande. Eu gostei de ser a pessoa que encaminhou aqueles cidadãos brasileiros para um espaço que eles não poderiam ocupar se eu não tivesse ocupado primeiro. Foi por intermédio de uma música do Luiz Iglesias que era uma caricatura, chamava-se originalmente "Namoro de preto", depois que passou a se chamar "Boneca de pixe", do Luiz Iglesias e do Ary Barroso [cantando] "Venho danado com os meus calos quentes, quase enforcado com meu colarinho". O Luiz Peixoto armou um casamento de preto onde eu era o noivo e os outros negros eram os convidados. E havia uma coreografia muito bonita, muito gostosa, então foi um espaço maior que se abriu para a raça negra brasileira.

Rodolpho Gamberini: Isso a partir da sua presença?

Luiz Fernando Emediato: Lá no Cassino da Urca, nessa época, a Linda Batista, que era a estrela do espetáculo, ganhava quinhentos réis de salário.

Grande Otelo: Quinhentos mil réis.

Luiz Fernando Emediato: Quinhentos mil réis, mas você ganhava trezentos como astro.

Grande Otelo: Ganhava um conto de réis por mês.

Luiz Fernando Emediato: Numa entrevista você disse que ela ganhava quinhentos réis e você trezentos.

Grande Otelo: Ela ganhava quinhentos mil réis por dia e eu ganhava um conto de réis por mês.

Luiz Fernando Emediato: Ganhava mais do que ela?

Grande Otelo: Não, senhor! Ela ganhava quinhentos mil réis por dia.

Luiz Fernando Emediato: Então, veja bem, por que você ganhava menos? Porque naquela época, aí você diz que os pretos entravam pela porta dos fundos, hoje você...

Grande Otelo: Nem entravam, porque naquela época a educação dos pretos brasileiros era muito menos do que a educação de agora. Hoje um preto brasileiro sabe conversar, sabe se vestir e naquela época sabia menos, sabia, mas sabia menos.

Luiz Fernando Emediato: Você estava falando das diferenças entre ser um cantor, um astro no Cassino da Urca naquela época e hoje...

Grande Otelo: Eu fui o único do Cassino da Urca!

Luiz Fernando Emediato: E você vê discriminação ainda hoje no Brasil?

Grande Otelo: Completamente! A discriminação existe totalmente. Pela sua pergunta a gente sente que a discriminação existe. Se não existisse você não teria a necessidade de fazer essa pergunta.

Luiz Fernando Emediato: Feito a pergunta. E o que você acha que devia acontecer para que essa situação mude? Como você vê essa coisa do Brasil hoje e em que essas discriminações odiosas ainda existam?

Grande Otelo: Isso só com o tempo, com o tempo e com, principalmente, a educação, porque a educação é que torna os homens mais... como se diz, mais... se aproximarem mais. Havendo a educação, você se aproxima de uma pessoa qualquer e qualquer pessoa pode se aproximar de você.

Luiz Fernando Emediato: Você se considera ainda discriminado?

Grande Otelo: Eu me considero ainda discriminado.

Rodolpho Gamberini: Mas Otelo...

Grande Otelo: Eu só não sou discriminado, porque eu me tornei o Grande Otelo, mas o Benedito da Silva é discriminado, por quê? Porque ele tem pouco poder aquisitivo, ele não se educa, não pode se educar. Ele bem que gostaria de botar uma gravata, um sapato bonito, melhor do que o meu até, porque o meu até já está roído aqui do lado [mostrando os sapatos] de tanto andar! [Risos]

Luciano Ramos: Mas, Otelo, você sempre disse que nunca sentiu na carne o preconceito racial.

Grande Otelo: Nunca senti pelo motivo seguinte: quando eu era criança na minha cidade de Uberabinha... Ô! [bate na boca com a mão, indicando auto-punição], Uberlândia, qualquer passageiro que chegasse, qualquer viajante que chegasse, eu dizia: “Quer que eu cante para o senhor escutar?” E eu cantava. Eu tinha aprendido duas canções que é pequena, uma da minha amiga dona de um hotel lá, do comércio, tinha me ensinado e então eu cantava e ganhava um tostão. Uma vez eu cantei e o cara não me deu um tostão e aí eu passei a cobrar um tostão adiantado. Mas aí eu já fazia amizade, com o meu lero, lero, com o meu bate papo e tal e coisa, e a gente ia conversando e eu ia e mostrava a cidade toda, era uma cidade pequena, mas tem coisa para ver, e eu mostrava, porque sempre fui "entrão" e é isso que tem que acontecer. Mas entrava sempre dentro de uma certa educação: “Sim, senhor. Não, senhor”, etc., quando ele me dava permissão “você”, quando se tornava meu amigo. E eu tenho muitos amigos até hoje em Uberlândia, e tenho muitos amigos espalhados por esse Brasil todo, que a minha amizade começou assim. Eu vou te contar um caso muito interessante. Quando eu resolvi ser artista, já adulto, eu já tinha saído do Coração de Jesus, mesmo colégio que Paulo Betti estudou, eu já tinha saído do Coração de Jesus. Já tinha noções de inglês, tinha noções de francês, e me davam, às vezes, textos para eu dizer em francês, eu sabia a pronúncia, mas eu me dirigia para o primeiro ator e dizia a ele: “O senhor pode me ensinar como é que se pronuncia isso daqui?” Ele aí ficava todo orgulhoso e me ensinava. “Ah, muito obrigado, o senhor é meu amigo” e tal. E por aí ia.

Watusi: O Sammy Davis Jr. [(1925-1990), ator e cantor negro norte-americano] uma vez falou que o negro, para subir, para se integrar na sociedade, ele teria que ser engraçado. É o seu caso?

Grande Otelo: Não, o negro não tem que ser engraçado, ele tem que ser tão honesto quanto você é. Você está há três anos dentro de um show e não faltou um dia.

Watusi: É lógico.

Rodolpho Gamberini: A Ângela Marsiaj da Folha quer lhe fazer uma pergunta.

Ângela Marsiaj: Otelo, você criou tipos geniais usando expressões, usando boca, usando, quer dizer, são incríveis mesmo. Agora, você não acha que esses tipos que você criou poderiam, de repente, ser usados por pessoas que têm preconceito contra o negro, para reforçar aquele mito do negro que é bonzinho, daquele negro que é engraçado, alegre, você sente que isso foi usado alguma vez?

Grande Otelo: Foi, foi muito usado, por exemplo, o Chocolat. O Chocolat tinha mania de contar uma piada em que dizia que um branco correndo é um atleta e o negro correndo todo mundo grita pega ladrão. Então os brancos usaram muito tempo isso para nos dividir, mas foi tanta força que o negro criou dentro da educação e dentro do progresso, que essa piada deixou de ser engraçada. Então eles podem me chamar hoje em dia de negro ou de preto que para mim tanto faz como tanto fez, eu sei a educação que eu tenho, eu sei o quanto valho, eu sei que eu sou um cidadão brasileiro, eu sou um ser humano e tenho direito a tudo quanto um ser humano tem e o que um cidadão brasileiro no Brasil tem também.

Ângela Marsiaj: Agora, como cidadão brasileiro, você acha que essa coisa que ficou do Mário de Andrade, do Macunaíma, do herói sem nenhum caráter, que você até disse se identificar, eu não sei como você entende ter se identificado, mas o que você acha que é ser brasileiro mesmo, se tem a ver com Macunaíma, ou não? O Macunaíma que você fez?

Grande Otelo: Hoje lá no hotel, por exemplo, eu estava fazendo um reparo. Os hotéis chiques só servem comida francesa, só servem cardápio francês, foi uma coisa que ficou. A culinária brasileira, por exemplo, desapareceu. Desapareceu por via da grande aculturação, aculturamento com a França, porque é chique. Para nós é chique, para nós é chique por que, meu Deus do céu? Por que não tem feijão e arroz? Por que não tem ensopado? Por que não tem? Porque nós achamos que fica mais elegante, fica mais distinguido, fica mais interessante. Eu acho que isso é uma besteira nossa, uma bobagem nossa. Eu acho que o Mário de Andrade, justamente ele, como se diz, ele ironizou essa coisa. Se você ler o Banquete, de Mário de Andrade, você vai encontrar essa ironia em cinco personagens: a Siomara Ponga, o político, que é político ministro da educação, vai encontrar na... numa... não me lembro o nome dela, por acaso alguém leu aí o Banquete, do Mário de Andrade? Não. Mas vai encontrar uma inglesa que é importante, vai encontrar um estudante que não liga nada e vai encontrar um compositor. A Siomara Ponga não canta músicas brasileiras, ela só canta músicas estrangeiras, porque é chique. Foi esse o quadro que Mário de Andrade viu e focalizou dentro do livro O Banquete, e unindo esse livro às diversas situações que ele encontrou em 25, 26 no Brasil, ele criou essa figura caricata do homem brasileiro, que na realidade não é o homem brasileiro, porque o homem brasileiro não é um herói sem caráter.

Edmar Pereira: Otelo, alguma vez você recusou algum papel ou algum show ou algum trabalho, porque isso iria a favor dessa imagem deformada do negro, ou você conseguia, digamos, driblar esse tipo de personagem e fazer dele o contrário do que se queria?

Grande Otelo: Não, eu nunca recusei. Eu nunca recusei papel dessa espécie, porque eu nunca me achei um negro representando, eu sempre me achei um ator representando.

Rodolpho Gamberini: Grande Otelo, tenho uma pergunta do telespectador que vai na mesma linha do Edmar. Pergunta do Ângelo Bittencourt, ele diz aqui que você já fez muito shows para presidentes, políticos e etc. Ele pergunta se você já se recusou alguma vez fazer o show para algum político ou presidente por você discordar politicamente de quem te convidou?

Grande Otelo: O ator, na sua essência, ele representa para qualquer pessoa e para qualquer público. Ele tem que se adaptar ou à pessoa ou ao público. Ele tem que levar para o trabalhador o refrigério das horas que o trabalhador fica trabalhando. Assim como tem que levar para o político a boa vontade para aquelas coisas que o político vai ter que resolver. Como tem que fazer aquele público, que está ali na frente dele, rir e achar graça do que ele faz ou então tem que se comover, dado o script que ele recebe, esse é o ator. O ator não se recusa a dar a sua arte a ninguém, ele dá a todos. O ator não se pertence, o ator pertence à personalidade que conversa com ele ou ao público que o está assistindo.

[...]: Falando em política, desculpe.

Rodolpho Gamberini: Eu ia passar a palavra ao colega de colégio, depois você fala. Paulo Betti, colega de colégio do Grande Otelo.

Paulo Betti: Não, só um fato. A primeira vez que eu te vi, Grande Otelo, no cinema, uma coisa engraçadíssima, não me lembro se era o Assalto ao trem pagador ou se era Nem Sansão, nem Dalila, uma coisa assim.

Grande Otelo: Nem Sansão, nem Dalila eu não fiz!

Paulo Betti: Você não fez. Então era o Assalto ao trem pagador. Na Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora, no Colégio Salesiano, as sessões de cinema, quando passavam filmes brasileiros, quando não era o Gordo e o Magro, a imagem de Nossa Senhora Auxiliadora era virada de costas para não presenciar o filme, e você também foi salesiano, não é? E como você falou muito em disciplina, como um valor que você preza, em educação e essas coisas todas, e você tem toda uma tradição ligada ao Cassino da Urca e tal, você tem toda uma imagem quase que do carioca, você tem a imagem do brasileiro carioca, por essa ligação. E queria que você falasse um pouco do interior do estado de São Paulo, qual a experiência tua com relação ao interior, o que você acha em suas andanças. Eu vi muita coisa que você esteve em Piracicaba, em Ribeirão, você viajou para todo esse lado aí, então eu queria que você falasse alguma coisa do interior do estado de São Paulo.

Grande Otelo: Eu gosto muito do interior do estado de São Paulo, que eu conheci, mas eu não conheço mais o interior do estado de São Paulo, eu não conheço mais São Paulo!

Paulo Betti: E tua relação, como é que foi mudando e como é a tua relação com o diretor? Eu trabalhei com Henriqueta Brieba [1901-1995, espanhola, veio para o Brasil com quatorze anos e se tornou atriz, atuando no rádio, no teatro, no cinema e na televisão, destacando-se, entre mais de 37 produções, sua participação na novela Anjo mau e no filme Toda nudez será castigada] e eu falava mais ou menos para ela como é que ela queria a cena e de repente ela falava assim: "Você quer que eu faça um arco?" Como é que foi esse lance, como é que foi a evolução de seu trabalho com relação às orientações que você tem recebido dos diretores através desse tempo todo?

Grande Otelo: Eu recebi orientação do diretor, depois da orientação do diretor eu conversava com o colega e de acordo com o colega, então ele dizia: “bom, o diretor disse que é assim, assim, assim. Então, bom, vamos fazer assim para ver se cola, se colar...”

Paulo Betti: E isso foi sempre assim ou foi mudando?

Grande Otelo: Foi sempre assim. Com o Oscarito [(1906-1970), espanhol, veio para o Brasil com um ano de idade, filho de circenses iniciou sua carreira artística no circo, conquistando grande sucesso no teatro e no cinema juntamente com Grande Otelo, atuando em filmes nacionais, participando de mais de dez chanchadas destacando-se entre outras: Carnaval no fogo e Matar ou correr], por exemplo, eu não precisava conversar. O diretor falava conosco e nós íamos para a cena e fazíamos e em geral ficava. O único diretor meio casmurro que eu achei foi o Waltson Macedo [1918-1981, estreou na Atlântida Cinematográfica Ltda em 1943, tornando-se na década de 1950 o principal diretor dessa empresa, destacando-se entre suas produções os filmes Aviso aos navegantes, em 1950 e Aí vem o barão, em 1951, com a dupla Oscarito e Grande Otelo]. Eu fazia as coisas com o Oscarito e depois ele cortava.

Paulo Betti: Mas ele filmava?

Grande Otelo: Filmava

Grande Otelo: No Sinhá Moça [novela de Benedito Ruy Barbosa exibida em 1986], agora, eu tive uma passagem que eu lembrei a minha infância. Eu, quando era garoto, eu ia atrás da vovó Silvana, que era a minha bisavó, pelas fazendas, porque ela era parteira curiosa, ia aparar as crianças, mas eu via as seriemas, que dizem que só no Mato Grosso do Sul que tem, não, em Minas Gerais também tem, e eu via a seriema e queria pegar a seriema. Então eu ia devagarzinho, ela ia devagarzinho, eu andava mais depressa, ela andava mais depressa, eu corria e ela abria as asas e voava. Quando eu falei em liberdade no Sinhá Moça, na novela Sinhá Moça, eu transmiti a imagem da seriema, era uma coisa que a gente ia devagarzinho, e a liberdade a gente vai devagarzinho e quando a gente corre para pegar a liberdade, a liberdade voa e a gente não alcança.

Paulo Betti: E você criou esse texto?

Grande Otelo: Criei esse texto e o autor deixou e o diretor deixou também.

Luciano Ramos: Ia falar alguma coisa sobre política, mas vamos falar de arte, que é mais interessante. Eu, assim como Paulo Betti, comecei ver você no cinema, porque eu nasci no ano em que fecharam o Cassino da Urca, ele também deve ter nascido depois. E a gente conhece você de televisão, como ator de novelas e como apresentador, como entrevistador de programas da TV Educativa. E, às vezes ,eu fico pensando “Como é que é o Grande Otelo?”, porque eu moro em São Paulo e não vejo seu trabalho no Rio de Janeiro, nos shows que você faz nos teatros e tudo, e fico pensando “Como é que o Grande Otelo no palco? Como é que era o Otelo no Cassino da Urca?” Então eu fico me perguntando, era melhor mesmo do que a gente via no cinema ou no cinema mesmo é que é o seu grande talento?

Grande Otelo: Olha, eu sempre fui a mesma coisa. Sempre fui o mesmo moleque diante do público, ou diante de uma câmera de televisão ou de cinema, eu sempre fui o mesmo moleque. A coisa me vinha na cabeça e eu fazia na hora. Com o Oscarito eu tinha sorte, porque o Oscarito pensava junto comigo. Com a Déo Maia eu tinha sorte, porque ela praticamente pensava junto comigo. Já trabalhando com a Watusi, pela disciplina que ela tem, outro dia eu fiz uma brincadeira com ela, porque nós temos uma entrada... [cantando] "o que o tabuleiro da baiana tem?"

Watusi: É a homenagem que eu faço para você.

Grande Otelo: É. E ela faz um rebolado assim e eu caio sentado, e nesse dia eu não caí sentado e ela foi apanhada de surpresa e caiu na risada.

Watusi: Mas trabalhar com você... ele é cheio de surpresas mesmo.

Grande Otelo: Valeu a pena, porque o riso dela é simpático e contagiou o público e a coisa funcionou.

Luciano Ramos: No cinema, a dupla com Oscarito funcionava às mil maravilhas, como com o Ankito [1924, veio de família circense, filho do palhaço Faísca e sobrinho do palhaço Piolim, iniciou no circo no Globo da Morte e mais tarde ingressou como acróbata clássico no Cassino da Urca, convidado para substituir um artista, fez sucesso e permaneceu no elenco. Contracenou com Grande Otelo no show Bahia Mortal e tornou-se um dos nomes mais famosos das chanchadas] também funcionava, mas com o Golias [1929-2005, fez grande sucesso na televisão como comediante, em particular na série A Família Trapo, com seu personagem Carlos Bronco Dinossauro] não deu certo, por quê?

Grande Otelo: Não deu certo, sabe por quê? Qual é o seu nome mesmo?

Luciano Ramos: Luciano.

Grande Otelo: Luciano, o que acontece é que quando eu fui trabalhar com o Golias, eu já estava com uma fama desmensurada de fazer coisas sem que o colega esperasse. Então, o Golias ficou na defensiva, não ficou aberto, aí não deu.

Rodolpho Gamberini: Agora, o teu relacionamento com Oscarito era realmente maravilhoso?

Grande Otelo: Ele é... ficava aberto para mim e eu ficava aberto para ele, então as coisas que vinham dele eu recebia bem e jogava, e as coisas que eu mandava pra ele, ele recebia bem e jogava. E, às vezes, as coisas combinavam maravilhosamente bem e o diretor deixava eu e Oscarito.

Rodolpho Gamberini: E na vida fora do palco?

Grande Otelo: Na vida fora do palco ele tinha a vida dele e eu tinha a minha vida.

Rodolpho Gamberini: Vocês tiveram problemas?

Grande Otelo: Não, nunca tivemos problemas de discurtimos ou nem de zangarmos um com o outro “Não, porque você fez assim... porque você fez assado...”, nunca tivemos isso. Quando ele não gostava, saía pela porta afora e ia-se embora.

Watusi: Grande Otelo, você há pouco tempo foi convidado para participar de uma festa nos Estados Unidos, já que você era um grande amigo de Orson Welles [que apontou Grande Otelo como o grande ator do Brasil], e esta festa não foi...esse convite não foi concretizado. Agora, gostaria de saber porque não houve o... por que o convite realmente não foi concretizado? Enfim.

Grande Otelo: É um caso muito sério, Watusi, eu vou te contar de uma maneira mais ou menos pejorativa, de certo modo, mas é muito difícil para o gênero humano fazer sucesso. Já não localizo só o Brasil, em qualquer parte, em qualquer profissão, aquele que se destaca tem uma porção de olhos e de olhares em cima dele, mormente quando ele pertence praticamente a uma comunidade, discute muito a respeito dele. E eu vou te contar um caso que se deu com o doutor José Luiz Magalhães Lins. Ele me chamou no escritório dele e me disse: “Otelo, você tem trabalhado tanto e não tem feito nada para você. Eu vou financiar um filme para você”. Eu disse: “Eu não posso fazer o filme, porque eu não entendo nada de orçamento, não entendo nada de filmar, eu só sei representar. Eu vou trazer alguém aqui para que o senhor converse com ele e depois então a gente faz a coisa”. Chamei o Roberto Farias. O Roberto Farias conversou com o José Luiz Magalhães Lins, arranjou o financiamento para o filme que se chamou Selva trágica e deu várias idéias de quem poderia fazer o roteiro do filme, como é que seria o roteiro do filme, se seria a minha vida, se seria uma história qualquer e, em resumo, o meu filme não saiu, e é isso que acontece quando alguém não tem notícia direta daquilo que querem que ele faça. Eu tive notícia direta de que eu deveria ir a Paris representar o cinema brasileiro numa semana que houve que foi “Race Noire”, mas eu tive essa notícia diretamente, não veio pelo telegrama, então eu fui fazer “Race Noire”, e aqui quero agradecer publicamente a compreensão do empresário que eu tenho agora, que é o Chico Recarey, e a compreensão também da minha colega Watusi. Eu faltei uns 15 dias, não foi? Quinze dias, porque eu fui a Paris nesse festival, voltei e, quando voltei, o show estava lá, eu entrei no mesmo lugar e ele não me descontou nenhum tostão. Foi o primeiro empresário que eu tive na minha carreira artística que compreendeu que esses eventos que eu faço, essas coisas que me acontecem, só podem melhorar, só podem fazer bem a imagem do espetáculo que eu estou fazendo.

Rodolpho Gamberini: O Dirceu Soares quer te fazer uma pergunta agora.

Dirceu Soares: Voltando um pouquinho, você diz ,em relação ao ator, que às vezes não chega para você certas coisas, mas alguém disse também, em uma ocasião, que com relação ao ator negro, o que falta no Brasil são textos destinados a esse tipo de ator. Até se diz, em tom de brincadeira, que de vez em quando a televisão faz uma novela de escravo para poder empregar essa mão-de-obra, e é um negócio que parece ser verdadeiro isso. O que você acha? Você acha que faltam textos diretamente para o ator negro? Quer dizer, fora que ele seja um eterno empregado, que ela seja uma eternamente um...?

Grande Otelo: Há uma exceção aí. Plínio Marcos [ver entrevista Roda Viva com Plínio Marcos]. Plínio Marcos fez um texto que não era para negro, para branco, para japonês, para índio aculturado, de pele vermelha e tal: Dois perdidos numa noite suja. Dois atores negros conseguiram financiamento e montaram esse texto no Rio de Janeiro. Há textos que o ator negro ou ator branco, ou vermelho ou de qualquer outra cor pode fazer, porque são textos que estão dentro da humanidade, dentro dos acontecimentos da vida, e Plínio Marcos foi um dos pioneiros nesse sentido, fez um texto desse e o ator Paulão e o ator Antonio Pompeu representou numa maior, numa boa no Teatro Delfim e pretende correr o Brasil todo com esse texto do Plínio Marcos.

Rodolpho Gamberini: Grande Otelo...

Grande Otelo: Então, há uns textos que, realmente, que eu não me avançaria a fazer, porque não são para mim, mas eu acho que a maioria das novelas, por exemplo, poderiam ser feitas tanto por atores negros como por atores brancos. Agora, que nós temos um plantel de atores negros e brancos que vale a pena, não temos muitas atrizes negras, mas atores já temos muitos.

Rodolpho Gamberini: Grande Otelo, eu vou te pedir licença e a todo mundo que está participando, eu vou fazer um pequeno intervalo e daqui a pouquinho a gente volta com Grande Otelo no meio da Roda Viva. Até já.

Grande Otelo: Tem café para se poder fumar um cigarrinho?

Rodolpho Gamberini: Tem.

[intervalo]

Rodolpho Gamberini: Nós voltamos então com o Roda Viva, nesta noite entrevistando Grande Otelo. Eu lembro às pessoas que estão em casa que pelo telefone 252-6525 qualquer pergunta pode ser feita ao Grande Otelo. Você, antes de começar o programa, não agora neste intervalo do comercial, você fez o sinal da cruz antes de começar o programa. Eu falei: “atenção, a vinheta está no ar, vai começar o programa, silêncio, por favor”, e você fez o sinal da cruz rapidamente, eu suponho pedindo proteção. Você, na sua juventude, foi ligado ao Partido Comunista, se não me engano, à juventude comunista, como é que veio isso na sua cabeça?

Grande Otelo: Desde a juventude! Como é que você sabe disso [risos]?

Rodolpho Gamberini: Ah, eu sei, algumas coisas eu sei [risos]. Então, você tem esse lado seu na juventude ter sido ligado ao Partido Comunista, gostaria de saber como você pensa hoje, como você vê isso aí?

Grande Otelo: Eu evoluí para o socialismo. Eu acho hoje que o partido ideal para o Brasil seria o Partido Social Brasileiro.

Luciano Ramos: Em 1950 você até pretendeu se candidatar a vereador pelo PTB, mas a gente leu aqui que a direção do PTB vetou o seu nome, gostaria de saber o por quê?

Grande Otelo: Eles me disseram que vetaram meu nome, porque não sabiam que Sebastião Bernardes de Souza Prata era o Grande Otelo.

Luciano Ramos: Sim, mas será que não é por algum preconceito? Você continua ligado ainda ao varguismo [adepto de Getúlio Vargas, presidente do Brasil no período de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954], em termos de política, ou não?

Grande Otelo: Você tem noção, sabe perfeitamente, Luciano, que um homem como eu, da época de Vargas, tem uma grande admiração por Vargas e respeita Vargas, apesar de hoje reconhecer que Vargas teve os seus defeitos, mas ele teve mais acertos do que defeitos. Então, hoje em dia, com o progresso da mentalidade brasileira, com a maneira que o povo tem de pensar, com o avanço real do socialismo, era natural que eu venerasse o cidadão. Venerasse... não é bem isso, que eu admirasse, continuasse admirando o cidadão Vargas, pelo tempo que ele atravessou, pelas coisas que ele passou e como ele soube enfrentá-las e como ele, de certo modo, quando viu que não podia mais agüentar a situação, ele preferiu desistir de vez de tudo a continuar vendo aquilo que ele estava politicamente analisando e sabendo que poderia acontecer não no Brasil, no mundo, porque hoje, na minha opinião, já que você tocou nesse ponto, você me leva a discutir isso, a... não é discutir, a falar sobre isso. É o mundo inteiro que hoje sofre uma pressão de grandes potências e, principalmente, a América do Sul. A América do Sul sofre mais a pressão das grandes potências, porque, digamos, a Europa é uma terra cansada. Os Estados Unidos são ambiciosos, a Rússia tem grande extensão gelada inaproveitável, ao passo que a América do Sul você, em tal modo “é dadivosa a terra que em nela se plantando, tudo dá”, [referência à famosa carta do escrivão português Pero Vaz de Caminha, enviada ao rei de Portugal, anunciando a descoberta do Brasil: "Nesta terra, em se plantando, tudo dá", dístico abundantemente utilizado em inúmeras situações ao longo da história e também em propagandas de produtos e eventos] e isso é uma coisa que realmente desperta a cobiça.

Rodolpho Gamberini: Tem uma pergunta de um telespectador da Vila Madalena, Assis Borbosa, desculpa, Assis Borba, que se encaixa perfeitamente naquilo que você está falando. Você acha que o Brasil de hoje está mais para comédia ou para tragédia?

Grande Otelo: Está numa encruzilhada. [Risos] E eu tenho certeza de que com a nossa força, com a nossa inteligência, com a nossa maneira de ser, nós vamos sair dessa encruzilhada para o melhor caminho. Tenho plena e absoluta certeza, porque eu já vi situações mais ou menos parecidas, não iguais, porque realmente agora as forças, aquelas forças que funcionaram em 1960, 61, estão funcionando com muito mais força, com muito mais violência. Eu uma vez pensei, eu trabalhei durante a guerra para os soldados sediados no Norte e no Nordeste, eu tenho direito à Lei de Praia, que foi abolida pelo Castelo Branco [presidente do Brasil no regime militar nos anos de 1964 a 1967, foi um dos articuladores do Golpe de 1964], mas eu teria direito a essa lei, porque eu trabalhei para o soldados, eu fiz meu esforço de guerra e essa coisa toda. Então eu pensei com meus botões sozinho: o Brasil podia ficar vinte anos com esses americanos que seria uma boa. Porque eu via que os americanos chegavam num lugar cheio de árvores, cheio de mato e tal e, de repente, os americanos em dois ou três dias já construíam uma porção de casas, já construíam uma porção. Uma vez eu entrei em uma casa dessas que era enorme e de um lado e de outro só tinha americano e o bandejão. Era bandejão, ficava lá no fundo. Então, tinha que ir lá apanhar o bandejão e atravessar pelo meio dos americanos. E eu atravessa assim ó... olhando de um lado e de outro, mas não podia deixar de reconhecer a maneira que eles têm de trabalhar, porque não nos estava prejudicando, e hoje em dia a maneira que eles têm de trabalhar está nos prejudicando, porque de certo modo, na minha opinião, nós estamos pagando uma coisa que nós já pagamos há muito tempo.

Rodolpho Gamberini: Grande Otelo, eu queria que você respondesse a uma pergunta do diretor e ator de teatro, Cacá Rosset. Ele entra ali por aqueles monitores, por favor, exibia a imagem.

Cacá Rosset [VT]: Grande Otelo, eu sou seu fã. Eu acho você o maior ator do Brasil de todos os tempos. A pergunta que eu queria lhe fazer é o seguinte: como é que foi o seu trabalho com Orson Welles?

Grande Otelo: Meu trabalho com Orson Wells [trabalhou no filme It's all true, realizado por Orson Welles no Brasil em 1942] foi mais um trabalho de boa vizinhança entre o Brasil e América do Norte, porque Orson, ao me conhecer, tomou de simpatia por mim e praticamente esqueceu que ele tinha uma obrigação para com o Departamento de Estado Americano. Então, desandou a me filmar de todo jeito e eu conversava, batia papo com ele, bebia cachaça com ele, foi ele que inventou o "samba em Berlim", que era cachaça misturada com Cola-Cola e tal e coisa. E fizemos uma grande amizade. Mas, artisticamente, o trabalho não pôde ser visto. Deve ter rendido, porque naquela época, como hoje, até hoje, depois que me soltam na frente de uma câmera, depois que me soltam num palco, eu não quero saber se tem diretor, não quero saber se tem roteiro, eu quero saber de fazer a essência daquilo que tem que ser feito de acordo com as minhas próprias palavras. E tenho tido sorte, porque minhas palavras não tem ofendido a ninguém e meu pensamento de fato não é de ofender a ninguém. Então o Orson Welles foi meu amigo e não meu diretor.

Rodolpho Gamberini: Ângela.

Ângela Marsiaj: Como foi trabalhar com o Herzog no [filme] Fitzcarraldo? [Refere-se a Werner Herzog, documentarista e cineasta, um dos maiores nomes do novo cinema alemão - movimento iniciado nos anos 1970 - famoso pela parceria com o ator Klaus Kinski e que dirigiu, entre outros, Aguirre, a coléra dos deuses, Coração de cristal, O enigma de Kaspar Hauser, Nosferatu, O vampiro da noite e Fitzcarraldo, onde há uma partcipação de Grande Otelo]

Grande Otelo: Horrível, Horrível!

Ângela Marsiaj: Por quê? O que foi que houve?

Grande Otelo: Primeiro que ele me deu um texto em inglês com duas páginas. Bem, o meu inglês não pode ser de duas páginas, porque é um inglês de brasileiro, não é? E tinha que fazer aquilo numa semana! Eu era jovem e havia dinheiro em jogo e eu fiquei pensando: será que esse cara vai pagar? Será que esse alemão vai pagar? E era dinheiro grande e também fiquei pensando “tenho que decorar esse negócio? Vai dar para decorar? Não vai dar para decorar? E está chegando a hora de filmar... e prova a roupa e experimenta a roupa e tal”. E “vamos filmar!” e quando ia para filmar, chegou a hora de filmar e tinha que falar em inglês e eu desandei todo o script em espanhol [risos] e ele olhou assim espantado, botou a mão na cabeça, pegou o script, jogou para lá e ficou cinco minutos assim [com a mão na testa e cabeça para baixo] [risos] e daí passou a raiva, ele voltou e “vai em espanhol mesmo!” e filmou em espanhol e eu consegui fazer o Klaus Kinski estragar a cena. Klaus Kinski é um sujeito horrível de se lidar, mas eu consegui fazer. Ele não ria, durante todo o tempo em que estivemos lá em Quito, no Peru, ele não ria, não se apresentava para jantar e lanchar junto com a gente, ele jantava sozinho, sempre de cara fechada, e naquela cena ele riu, e riu porque eu falava espanhol e tanta coisa e tal e etc, bom, o que tinha que fazer era muito gostoso, o que tinha que fazer era pedir ao engenheiro que não levasse a máquina, que deixasse um pedacinho de trilho para que eu pudesse a máquina para lá e a máquina para cá, porque eu estava ali há dez anos cuidando e esperando que se fizesse a estação transandina [risos] para atravessar os Andes de trem, isso existiu, foi verdade você que não sabe. [Risos]

Edmar Pereira: Grande Otelo, essa relação com o Herzog foi uma coisa mais tensa. Com Orson Welles, que você estava contando, parece que foi uma coisa mais prazerosa, Vocês trocaram informações, afeto. O que exatamente...você recebeu dinheiro por It's all true, embora o filme não tenha terminado, você foi pago como devia?

Grande Otelo: Menino, recebi um dinheirão! Porque os crioulos que trabalhavam, os negros que trabalhavam no filme tinham que receber setenta e cinco cruzados, mas eles eram empresados por Heitor dos Prazeres. Então o Heitor dos Prazeres só dava setenta e ficava com cinco. [Risos] Mas eu fui empresado pelo gerente lá do Orson Welles mesmo. E quanto é que era? Meu Deus do Céu! Eu sei... era quinhentos mil réis, rapaz! Quinhentos cruzados! Eu consegui juntar dez mil cruzados naquela época, dez mil cruzados naquela época! Nunca tinha visto tanto dinheiro na minha vida, porque na Urca eu ganhava quinhentos mil réis, ganhava um conto de réis quando trabalhava, quando não estava trabalhando, e ganhava dois contos de réis quando estava trabalhando. Por mês, dois contos de réis. Ali trabalhei cinco dias - cinco dias não, dez dias - a quinhentos mil réis. Ganhei dez contos! Mas aí eu fiquei bebendo com ele de novo e gastei tudo.

Edmar Pereira: Você teve outra oportunidade de trabalhar com o Orson? Porque parece que ele sempre citou você, ao longo da vida dele, como referência assim de interpretação, de representação.

Grande Otelo: Não, infelizmente eu não tive mais oportunidade de ver o meu amigo Orson Welles.

Luciano Ramos: Você teve várias oportunidades de desenvolver uma carreira internacional, foi convidado pela Disney, foi convidada pela Carmen Miranda para ir para fora, teve oportunidade de trabalhar com a [atriz italiana] Cláudia Cardinali, mas você não pode ir, por - dizem as entrevistas - parece que você tinha contrato com o Cassino da Urca ou com o Copacabana ou por alguma outra força opositora que não está registrada aqui na história.

Grande Otelo: Tive também uma oportunidade para ir à Broadway com [empresário da área artística] Carlos Machado. Mas o Carlos Machado não me levou, porque no Night and Day [boate carioca] não ficava ninguém e eu tinha que ficar no elenco do Night.

Luciano Ramos: O Manga também te prendia bem.

Grande Otelo: O Manga, eu estava trabalhando no Copacabana Palace, no show Frenesi e fui convidado para ir para a Itália para terminar um filme que eu comecei aqui, terminar não era bem terminar, foi que um produtor viu meu trabalho no filme e achou que eu merecia mais algumas cenas e mandou me contratar, e o Manga então pediu 15 mil dólares para me libertar naqueles dias. Naquela oportunidade, no Copacabana Palace, o [ator negro brasileiro] Milton Gonçalves era o regra 3, e o Milton Gonçalves tinha toda a minha roupa, tinha todo meu repertório e era tão ator ou mais ator realmente do que eu, e o Manga não quis saber: “Para soltar o Otelo eu quero 15 mil dólares”.

Luciano Alves: Sim, mas o que te prendia aqui? Porque você não se libertou de alguma maneira?

Grande Otelo: Porque aí o italiano não quis pagar os quinze mil dólares. Quando foi o negócio da América, que a Carmen Miranda me chamou, eu estava em Poços de Caldas [MG], recebi o telegrama, deram um banquete muito grande, que eu acabei não pagando o banquete, depois encontrei o garçom que pagou e ele queria me bater. E vim embora para o Rio de Janeiro. Cheguei no Rio de Janeiro fui lá na praia onde o seu Manga jogava peteca e falei: “Seu Manga, eu vou para os Estados Unidos”, e ele disse: “não vai não, porque eu não dei licença”.

Rodolpho Gamberini: Grande Otelo, desculpe-me...

Grande Otelo: E quando se concretizou o contrato, o Manga colocou uma cláusula: cinqüenta por cento para a Urca e cinqüenta por cento para mim. Com os meus cinqüenta por cento, eles acharam que eu não poderia pagar o imposto de renda lá nos Estados Unidos, então que eu iria ganhar muito pouco e não valia a pena me levar para ganhar pouco. O Walt Disney, Walt Disney esteve na América do Norte, um outro rapaz filho do Zezinho, Zezinho do Banjo, um carioca, um paulista que eu acho que nenhum de vocês conheceu, que ele foi para a América do Norte há muitos e muitos anos, esteve lá muitos anos, hoje em dia está no Rio de Janeiro e quase não aparece, mas o Zezinho do Banjo estava na América do Norte nessa época e tinha a faculdade de imitar a minha voz. Então ficou o Zezinho do Banjo fazendo a voz do papagaio no meu lugar no filme do Walt Disney. Eu sempre tive um empecilho, é aquele tal negócio “O Otelo? O Otelo não dá, o Otelo não veio, o Otelo não chega, o Otelo bebe, o Otelo... “ e eu fazia mesmo, eu não ia, eu bebia, eu não aparecia... [Risos]

Grande Otelo: E eu continuo fazendo a mesma coisa.

Rodolpho Gamberini: Olha, tem um depoimento de um telespectador aqui que todo aqui mundo conhece e está te desmentindo, ele está falando bem de você, que você está falando mal, que é o Benedito Ruy Barbosa, o autor da novela Sinhá Moça, na TV Globo. Ele telefonou, mora até aqui no Planalto Paulista e diz o seguinte: "Em Sinhá Moça, a sua última participação, foi a sua última participação na TV Globo, você disse há pouco - esse é o Benedito Ruy Barbosa falando para você - você disse há pouco que o homem Sebastião Bernardes de Sousa Prata era um pouco indisciplinado, então eu, como autor de novela, Benedito Ruy Barbosa, queria dar o meu testemunho de que Grande Otelo foi uma das maiores alegrias de minha carreira. Seu papel foi um exemplo de dedicação e amor. Foi um prazer ter você no elenco de Sinhá Moça". Está te desmentindo.

Grande Otelo: Foi uma recaída que eu tive. [coça a cabeça e depois segura a testa com a mão]

Rodolpho Gamberini: Foi um escorregão.

Grande Otelo: Agora, quero agradecer publicamente esse elogio do Benedito Ruy Barbosa, que ele dá publicamente do meu trabalho em Sinhá Moça, e quero dizer a ele que o personagem que ele me deu em Sinhá Moça era o meu próprio bisavô, Vovô Marcelino. Eu deixei crescer a barba, fiz a expressão corporal do meu bisavô, que era praticamente a minha, capinando no meio do mandiocal, capinando e botando areia nos pés da mandioca, e a minha voz também, eu pude dar a ela uma entonação do meu bisavô, de maneira que o Benedito Ruy Barbosa é para mim um autor que, contrapondo o que disse ali meu querido amigo, Dirceu, é um autor capaz de escrever para negros dentro de uma época, e é capaz também, se ele quiser, de escrever dentro da época atual. E é um argumento só para os negros e eu peço, Benedito, que você escreva o mais rápido possível!

Rodolpho Gamberini: Olha, o Leon Cakoff está louco para te fazer uma pergunta, mas antes, é engraçado isso, é interessante, mas tem muitas perguntas dos telespectadores querendo saber da sua situação financeira hoje. Eu vou ler as perguntas e depois você vai responder. Isa Camargo, que é da Vila Prudente, aqui em São Paulo, ela pergunta: "Como é que agora pelos filmes, shows que você fez, você não é um homem rico?" Ela já está afirmando isso aqui. "O que você fez com o dinheiro todo que você ganhou?" A pergunta da Isa Camargo. A pergunta do Luiz Gustavo, do Paraíso: "Sendo você um artista tão famoso, principalmente no mundo onde preto não tem vez, porque você não conseguiu um destaque econômico e financeiro tão importante quanto Pelé?" Pergunta do Luiz Gustavo, do Paraíso. Pergunta do João Antonio Marques, de Santo André, cidade aqui da Grande São Paulo. "Você é rico? Tem bastante dinheiro? Em todos esses anos de trabalho você foi bem remunerado? Você é um homem rico?" Pergunta então do João Antonio Marques. E a pergunta do Vanderlei Agostineto, da cidade de Americana, aqui do estado de São Paulo: "Você é um cara rico ou é como muitos artistas que são famosos e sem dinheiro?"

Grande Otelo: Senhores, senhoritas [risos], no passado eu tinha 21 anos, 22 anos, 23 anos, até que cheguei aos 40 anos mal acostumado desde os vinte anos [risos], solto no Rio de Janeiro, um Rio de Janeiro gostoso como é até hoje, com a educação que eu adquiri aqui em São Paulo, por conseguinte, tratando bem as pessoas, tanto os homens quanto as mulheres que se aproximavam de mim. Os homens eu tratava bem, quando via alguma resistência eu tratava de pagar um almoço, um jantar, pagar uma cerveja e tal e coisa e ficavam meus amigos ou fingiam meus amigos, e eu então gastava dinheiro com os amigos. E as mulheres eram muito bonitas [risos] e eu muito jovem e eu muito jovem. Isso é uma coisa, uma parte das perguntas. Isso é uma parte. Segunda parte, o papel, o ator quando recebe um papel chamado carapuça, muito raramente ele pensa no dinheiro. Isso é até hoje. Qualquer ator, os senhores podem fazer a mesma pergunta para o Paulo Betti, que eu não estou olhando para ele e ele vai responder a mesma coisa. Um papel que dê projeção, que ele sente que aquele papel vai lhe dar maior projeção, na idade do Paulo Betti ele não está fazendo muita questão de dinheiro não, faz questão, porque afinal de contas a gente precisa viver, mas um bom papel que dê projeção realmente, ele não faz muita questão do dinheiro.

Paulo Betti: Então fica afirmado isso e está, está falado.

Grande Otelo: É um financiamento. Ele está, como se diz, não é bem um financiamento, é um investimento que ele faz em cima dele mesmo, esperando melhores dias que ele possa ser o dono da companhia, com o cartaz que adquiriu e ganhar mais dinheiro. Terceira pergunta, terceira coisa foi se eu sou um homem rico.

Rodolpho Gamberini: Se você é rico?

Grande Otelo: Olha, eu trabalho, por exemplo, com o Chico Recarey, isso é muito importante. O Chico Recarey tem um elenco de brancos e negros. Isso foi a primeira coisa que eu notei e é um elenco que não é pequeno, são moças que têm um sonho na vida, de alguma vez, de algum dia poderem fazer alguma coisa. Isso me tocou muito fundo. Eu, como pioneiro, pode-se dizer, entre os negros do Brasil, eu achei muito bonito a condução que o Chico Recarey, através do Mauricio Shermann, tem dado ao trabalho dessas moças. Há moças que estudam de dia e trabalham de noite, há moças que trabalham de dia e trabalham também de noite, e isso é uma maneira que eu falei a pouco do negro se integrar realmente na sociedade brasileira. Então, porque eu ia fazer contrato com o Chico Ricarey se ele me deu a palavra dele? Ele me deu a palavra, está certo que a Watusi fez um grande trabalho na Europa, se esforçou muito na Europa, então ela vinha com o cartaz europeu e negociou com ele. Eu não negociei com o Chico Recarey. Recarey me prometeu um dinheiro e não deixou de pagar nunca e eu aceitei, aceitei porque aquela turma que estava ali trabalhando, que está lá trabalhando está tendo e vai ter no futuro maiores oportunidades, porque é uma espécie de escola da qual eu me considero o mestre. Só perco para a Watusi, porque é mais disciplinada do que eu.

Rodolpho Gamberini: O Leon Cakoff está há muito tempo me pedindo para perguntar.

Grande Otelo: Espera aí, será que o pessoal que ouviu a resposta entendeu?

Rodolpho Gamberini: Você acha que você quer completar a resposta?

Grande Otelo: Não quero completar, eu espero que eles tenham entendido os meus vários motivos e que eles compreendam que isso é coisa da vida, que a vida é assim, não a última parte. Na última parte é uma questão de estabelecer uma liderança: não liderança daquele líder que manda, que faz. Não, uma liderança de conduta das pessoas.

Rodolpho Gamberini: Você deixou de responder uma coisinha: você está rico ou não está rico?

Grande Otelo: Eu estou.

Rodolpho Gamberini : Está?

Grande Otelo: Estou. Dentro das minhas necessidades, eu estou atravessando esse terceiro cruzado valentemente.

Rodolpho Gamberini: Leon Cakoff.

Leon Cakoff: Otelo, eu queria saber se tem nessa sua trajetória também algum ou alguma ponta de frustração artística? Você é considerado o maior ator brasileiro, mas já disse também que os cineastas brasileiros nunca souberam explorar o teu potencial artístico. Isso é uma frustração sua?

Grande Otelo: Já houve tempo em que eu admitiria frustração minha, mas hoje eu tenho que admitir, por exemplo, ali o Luciano, o Luiz Fernando me entrevistou há dezesseis anos atrás e eu disse a ele que ia ser diferente, e é diferente. Eu pensava também que era maldade, má vontade dos diretores, dos autores, enfim, do povo intelectual brasileiro com relação a mim, por causa da minha cor, por causa do meu tamanho, eu pensava isso. Mas olhando bem os mecanismos culturais do país, eu chego à conclusão que a frustração é geral, não é só minha. Você já experimentou tirar dinheiro da Embrafilme? Em qualquer tempo, justamente agora?

Leon Cakoff: Já experimentou sim [risos].

Grande Otelo: Foi fácil?

Leon Cakoff: Não, não faço parte de nenhuma panela.

Grande Otelo: O cinema é cultura, e a cultura tem que ser subsidiada. Descobriram agora uma maneira de subsidiar a cultura através das indústrias brasileiras, mas os industriais brasileiros é tudo "mão de porco", ninguém quer subsidiar coisa alguma, não.

Leon Cakoff: No tempo do Cassino da Urca era melhor então?

Grande Otelo: No Cassino da Urca havia o jogo.

Leon Cakoff: Mas hoje tem o jogo do bicho!

Grande Otelo: O jogo do bicho já subsidiou teatro, já fez peças teatrais na Praça Tiradentes através das estrelas. Eles namoravam as estrelas e, por causa das estrelas, eles botavam dinheiro nas peças. E as peças resultavam em sucesso e eles tinham lucros. E é um caminho meio esquisito, mas era um caminho que existia e podia se seguir.

Leon Cakoff: O que falta para você fazer no cinema brasileiro?

Grande Otelo: Como?

Leon Cakoff: O que falta para você fazer no cinema brasileiro?

Grande Otelo: O que falta fazer no cinema brasileiro?

Leon Cakoff: O que você gostaria, sei lá, para superar a imagem de Macunaíma, de um filme como o Macunaíma?

Grande Otelo: No momento aqui eu gostaria de, por exemplo, fazer um filme que está na Embrafilme e que se chama Gafieira, que é um retrato daquilo que eu vi no Rio de Janeiro nos anos 30.

Luiz Fernando Emediato: É aquele velho projeto do Ipanema Jóia, a história da sua vida?

Grande Otelo: Não, Ipanema Jóia é um segundo projeto que mostra como é que determinados negros são explorados por brancas velhas ou brancas, como se diz, brancas que gostam de ser diferentes e tal e o Ipanema Jóia, na verdade, é um negro caloteiro, é um negro malandro. Mas esse projeto da Gafieira é a história da elite clube onde havia bailes aos sábados e domingos e aonde as domésticas iam se divertir. Eu acho que é por isso que havia mais domésticas naquele tempo do que hoje, porque elas tinham aonde se divertir com respeito e numa boa, porque ali não se admitia desrespeito à ninguém, o respeito que se usava naquela época. Hoje o respeito que se usa é outro. Naquela época o respeito era o lenço na mão, para não molhar a mão da dama, e se segurava a dama direitinho. Hoje, agora... e vai dar valsa...

Luciano Ramos: Este é o projeto para você dirigir o filme?

Grande Otelo: Não é para dirigir, é para fazer o mestre-sala.

Luciano Ramos: Mas você conhece muito mais cinema do que qualquer diretor aí que ganhou Oscar e tal. O que você me diz?

Grande Otelo: Eu não tenho paciência, companheiro, eu não tenho paciência. Eu posso ser um auxiliar, posso dar uns palpites, dar umas idéias, mas eu arcar com a responsabilidade toda, eu não tenho paciência e nunca tive aliás. Não é por causa do tempo que tenho ou nada disso, é que eu nunca tive paciência para mandar.

Luciano Ramos: Você tem um projeto de fazer um filme sobre a história de sua vida?

Grande Otelo: Não.

Luiz Fernando Emediato: Não tem. Se houvesse esse projeto, você falou agora há pouco, há alguns minutos atrás quando o Luis Magalhães Lins te prometeu financiar um filme, que o Roberto Farias errou e fez um outro filme, e você disse que poderia ser um filme sobre minha vida e tal.

Grande Otelo: Discutiram tanto... aquele desafio que diz que o mineiro só é solidário no câncer, foi chamado, mas outros foram chamados e discutiram, discutiram, discutiram, e a Constituição vai sair, mas o filme não sai.

Luciano Ramos: Agora, se houvesse um projeto sobre a história de sua vida, essa história seria completa? Você autorizaria uma história completa com todas aquela história de suas grandes tragédias, da sua grande amargura? Quem conhece a sua vida sabe que você sofreu muito, que você tem uma biografia cheia de grandes alegrias, de glória na época das chanchadas e também uma história amarga, triste, de grandes perdas e de grandes tragédias [Grande Otelo teve uma infância difícil marcada pelo assasinato do pai e uma grande tragédia quando sua mulher matou um filho deles e se suicidou]. Essa biografia em filme ou em livro, seja lá o que for, você autorizaria uma biografia com toda a história verdadeira de sua vida?

Grande Otelo: Eu, agora há pouco tempo...

Watusi: Agora, inclusive, aproveitando a pergunta dele, gostaria que você falasse justamente sobre o projeto que você está fazendo, projeto não, que você está fazendo um livro sobre a sua história. Nós gostaríamos de saber.

Grande Otelo: Há dois fotógrafos no Rio de Janeiro, o Mário e a Marly Serafim que estão fazendo o Grande Otelo em preto e branco, é um livro mais de fotografias do que a história da minha vida, se bem que tem muita história da minha vida contada por pessoas que tiveram relação comigo, com as pessoas que eu passei pela vida delas, elas passaram pela minha vida, chama-se Grande Otelo em preto e branco [é um álbum fotográfico de Marly Serafim e Mário Franco com 132 páginas ilustradas publicado pela Ultra-Set Editora, registrando a vida artística do ator]. São depoimentos de pessoas que me conheceram, mas esse livro não é o definitivo livro da minha vida. O livro da minha vida ou o filme da minha vida, se houvesse algum interesse real, eu concordaria.

Luciano Ramos: Quem você escalaria para fazer o papel do Grande Otelo?

Grande Otelo: Meu filho, o Martinho.

Watusi: Exato!

Luciano Ramos: Está certo! Tá bom!

Watusi: Personagem ideal, Martinho, um grande ator.

Dirceu Soares: O Cakoff citou há pouco, ele também falou, quando falamos de cinema, e ele diz o seguinte: algum papel que suplantasse Macunaíma, mas curioso, comigo, quando eu lembro de você e se eu pudesse escolher agora para rever uma cena sua, eu não pegaria Macunaíma, eu pegaria uma cena que se não me engano é de Assalto ao trem pagador e que desce um caixãozinho de criança descendo e que você está bêbado em frente a um boteco e diz: “mais um anjo que vai para o céu...”

Grande Otelo: Quando morre uma criança no morro, a gente devia cantar, porque é menos um para viver nessa miséria.

Luciano Ramos: E o personagem que você fazia e que ficou preso no negócio do gás, aquela cena foi triste. Você falou, fizeram uma pergunta sobre tragédia e comédia, e você falou que o Brasil está numa encruzilhada, mas o seu trabalho também é nessa encruzilhada, é também nessa corda bamba entre o humor, entre o cômico e o trágico. Como é que você consegue dirigir, manejar essa corda?

Grande Otelo: Mas o trabalho do ator, ele é às vezes dirigido para esse ponto, porque não há nenhum ator, por mais cômico que seja, que não goste de fazer o público chorar de vez em quando, e não há nenhum ator que, por mais dramático que seja, que não queira fazer o público rir de vez em quando. A linha geral do teatro é mais ou menos essa, que é muito boa. Você pode se lembrar, por exemplo, [do filme] Do mundo nada se leva.

Luciano Ramos: Frank Capra! [1897-1991, nasceu na Itália mas imigrou para os Estados Unidos com seus pais, é considerado um dos precursores das comédias em Hollywood]

Grande Otelo: Frank Capra. Era um jogo de alegrias e tristezas, de gente que vivia a vida. Você pode se lembrar de Charles Chaplin. Charles Chaplin era um tragicômico maravilhoso. Nós tivemos no Brasil um tragicômico maravilhoso que foi o Mesquitinha, foi com Mesquitinha que eu aprendi tudo isso que eu faço hoje.

Luciano Ramos: Será que nós temos no Brasil um diretor de cinema à altura do Frank Capra?

Grande Otelo: Atualmente eu estou um pouco por fora do cinema, mas dos filmes brasileiros que eu tenho visto, ontem mesmo eu vi um que se chama, qual é o nome? Sonho eterno.

Luciano Ramos: Filme brasileiro?

Grande Otelo: Sonho eterno, não...

Luciano Ramos: Sonho sem fim [1985].

Grande Otelo: Sonho sem fim.

Luciano Ramos: Lauro Escorel [cineasta e diretor de fotografia, autor do filme Sonho sem fim].

Grande Otelo: Lauro Escorel. Se prestar bem atenção naquele filme você vai ver a tragédia daquele rapaz que resolve fazer cinema na terra dele. É tragicômica a situação dele. E foi mais ou menos tragicômica a situação, por exemplo, dos atores daquela família e daquele rapazinho, daquela governanta do filme Lição de amor. [1975, filme de Lauro Escorel]

Luciano Ramos: Sei, outro da família Escorel também. Ele é fã da família Escorel. Mas diga aí outros diretores que você considera dignos de estar à sua altura, como ator neste país?

Grande Otelo: O brasileiro está sempre à altura do outro brasileiro.

Luciano Ramos: Ih, olha, já saiu pela tangente. Olha a carinha dele!

Dirceu Soares: Você fala muito em humor. Você vê programa de televisão de humor, que diz sobre esse humor que hoje aparece por aí? O que você está achando?

Rodolpho Gamberini: Aliás, tem uma pergunta que vai exatamente... uma pergunta do telespectador que vai na direção do Dirceu, que cita uma coisa que o [ator, diretor e humorista] Chico Anísio disse. A pergunta é da Fátima Francheschi, de São Roque, que é uma cidade não muito distante aqui da capital.

Grande Otelo: O negócio do vinho lá.

Rodolpho Gamberini: Tem vinho bom. A Fátima, a dona Fátima Franchesci pergunta o seguinte, ela diz que Chico Anísio fez uma declaração de que não existem mais humoristas que criam o próprio humor. Então ela pergunta: você acha que existe um substituto para você na geração atual?

[...]: [alguém fala baixinho entoando a musiquinha de suspense] Tian tian tian tian!

Grande Otelo: Existem vários substitutos.

Rodolpho Gamberini: Quais?

Grande Otelo: Eles não têm tido a mesma oportunidade que eu tive e nem a mesma ousadia que eu tive. Você tem que ver que a época é outra. Hoje em dia nós temos o diretor, o maquiador, o figurinista, o diretor de arte, tem uma porção de diretor atrás da gente e naquela época a gente não tinha tanta gente atrás da gente. Nós éramos mais espontâneos. Quando a gente pode fazer um espetáculo espontâneo, quando a gente pode fazer como eu estou fazendo aqui agora, com esta espontaneidade sem direção e sem nada, vocês acharam graça em muita coisa que eu disse.

Rodolpho Gamberini: É verdade.

Grande Otelo: Não é?

Watusi: Por que você não leva isso para o teatro? Eu não sei se você já fez teatro para demonstrar o que você é, porque as pessoas de repente... eu digo como o Chico Anísio que sai para fazer uma turnê, ou o Gordo [refere-se à Jô Soares] que sai para fazer turnês por este Brasil afora. Por que você não está dentro desse clã também?

Grande Otelo: O público povo não vai querer que eu faça o que o Chico Anísio faz, o que o Jô Soares faz, vai querer que eu faça o que eu já fiz com alguma coisa nova também. O público vai querer imitação da Mistinguette [era uma famosa vedete], o público vai querer o monólogo do Stela, porta estandarte, o público vai querer um filme em séries, o público vai querer...

Watusi: Por que você não faz isso?

Grande Otelo: Porque já viu eu fazer e vai querer ver de novo.

Watusi: Exato! A geração quer ver você, por exemplo, eu não conheço, eu nunca vi, você disse que faz imitações de vários personagens e seria interessante. Por que você não leva isso para o país? Não tem um empresário, alguém que se interesse por você montar um espetáculo desse gênero?

Grande Otelo: Negócio de empresário, eu estou muito escaldado com esse negócio de empresário.

Watusi: Nossa!

Grande Otelo: Empresário foge por dinheiro!

Rodolpho Gamberini: Ué, você acabou de dizer que tem contrato com Chico Recarey!

Grande Otelo: Ah, mas há exceções. Eu não achei exceção para viajar, achei uma exceção no Rio de Janeiro.

Rodolpho Gamberini: Você é mineiro?

Grande Otelo: Sou mineiro. Já viajei pelo interior de São Paulo e eu tinha dois empresários. Os dois sumiram e então nunca mais viajei.

Dirceu Soares: Otelo, você está dizendo que o público vai querer ver você repetir papéis, mas a equipe econômica do Brasil hoje vem repetindo os mesmos papéis e o pessoal está sempre dando ibope aí.

Grande Otelo: Eu ainda não sou super astro.

Luciano Ramos: Você sempre foi "escada" de Carmen Miranda, "escada". O pessoal aí pode perguntar o que é "escada", depois você até pode dar uma explicação do que é "escada", para essa turminha aí, que está ali em cima aqui. São todos estudantes de teatro. Você fez "escada" de Carmen Miranda, de Paulo Autran, de Oscarito, e agora que você é um super astro. Quem você escolheria para ser o teu "escada"?

Grande Otelo: Eu ainda não sou super astro!

Luciano Ramos: Ah, que conversa!

Grande Otelo: Eu ainda continuo "escada". Eu continuo "escada", porque "escada" é uma coisa muito importante em teatro. É, às vezes, mais importante do que o astro. É importante. Às vezes, o ator, o primeiro ator não faz nada se não tiver um "escada" à altura. E aí passa a não ser "escada", passa a ser dupla. Você vê O Gordo e o Magro, quem é "escada" de um e "escada" do outro? É uma dupla. Você vê eu e o Oscarito, eu não era "escada", a gente era "escada" [um do outro] lá no cartaz e tudo mas, no fundo, quem ia assistir, o trabalho era igual, o trabalho era igual. Então, não dependia de "escada". "Escada", por exemplo, foi o Manuel Pêra para o Mesquitinha, que você não viu no Cassino da Urca, é aquele que prepara para o outro matar. O Paulo Betti sabe o que é isso. Algum de vocês aí sabe o que é isso? Já aprendeu o que é isso? Você "dá a bola para o outro fazer o gol"? Você?

Rodolpho Gamberini: Ele está sem microfone.

Grande Otelo: Mas ele está dizendo que mais ou menos sabe. Então eu e o Oscarito às vezes eu dava bola para ele e às vezes ele dava a bola para mim, a soma geral dava que os dois eram astros.

Paulo Betti: Você nunca cruzou com aquele cara que está na ponta direita e você está com a bola entrando para marcar o gol e ele grita: “larga!” e pede a bola para ele?

Grande Otelo: Já e sou capaz de dizer o nome, eu digo: Colé [atuou no filme Carnaval Atlântida, 1952, ao lado de Grande Otelo, posteriormente fundou sua própria companhia] e Silva Filho [em 1953 atuou no filme É pra casar?]. Eu "mato a cobra e mostro o pau!"

Luciano Ramos: Mas já que a gente está falando que tem bastante estudante aqui, como você vê a formação do ator? Você acha que o ator se prepara em alguma escola?

Grande Otelo: Ele tem que ter a escola para ele saber a história do teatro, mais ou menos, não sabe a história do teatro em geral principalmente, e particularmente do teatro brasileiro. Há atores que hoje em dia são atores e não sabem quem foi mais Manoelino Teixeira [ator, com participação no filme Alô, Alô, Brasil, com Carmen Miranda, de 1935], quem foi Mesquitinha e às vezes nem quem foi Oscarito. Há atores nessas condições. Sabem quem sou eu porque eu estou aí militando, estou com 71 anos e não estou parado. Eles vão me assistir e dizem: esse é que é o Grande Otelo? E outros dizem: mas é esse que é o Grande Otelo? [risos] Porque eu, por exemplo, conheço um ator, aquele que está com a Lucélia [Santos - atriz] atualmente no [teatro] João Caetano, o pai dele foi Almirante de Mar.

Edmar Pereira: Guilherme Karan.

Grande Otelo: Guilherme Karan é um ator de uma força extraordinária. Contracenando com Guilherme Karan eu tive muita dificuldade, porque quando o ator está começando e tem muita força, ele avança, ele entra por cima da fala do outro e esse é o chamado furioso.[Risos] Daniel Filho foi um furioso.

Luciano Ramos: E chegou lá!

Grande Otelo: Não, ele passou, hoje é diretor, mas ele foi um furioso.

Luciano Ramos: Grande Otelo, não sei se você respondeu. Se uma escola pode fazer um ator?

Grande Otelo: Uma escola pode fazer um ator, pode fazer um ator nos conhecimentos gerais, mas na arte de representar ele já nasce feito.

Paulo Betti: Você falando de escola de ator e tal, tinha um exercício que fala assim: você é capaz de subir em uma escada como príncipe e descer como mendigo?

Grande Otelo: Muito natural, tem que ser. Se você quiser fazer uma prova não é nem preciso subir uma escada. “Paulo Betti, me apanha um copo d’água!" [fala representando e alterando o tom de voz] "Paulo Betti, você me apanha um copo d’água?"

Rodolpho Gamberini: Otelo, tem uma telespectadora querendo saber, o nome dela é Cândia Del Fablo, de Campinas. Se você é funcionário da TV Globo, ator exclusivo, se você tem um salário para não trabalhar ou se você pode trabalhar em outros canais de tTV?

Grande Otelo: Eu tenho um salário, e quando me pedem para eu trabalhar em outros canais eles não deixam. Mas eu acho que eles me batizaram de patrimônio. [Risos] Acho que patrimônio não pode, tem que ficar em um lugar só. O cachorro chega e levanta a perninha e...

Rodolpho Gamberini: O que você acha disso?

Grande Otelo : Eu acho isso no momento, vou te dizer, Rodolfo, eu acho isso uma maravilha. [Risos]

Rodolpho Gamberini: É bom, né?

Luciano Ramos: Você na época da chanchada, aliás, eu sei que você não gosta do nome chanchada, mas uma comédia musical brasileira, na época do ciclo musical, você reinava, você era o rei. Aí você em 57 viu nascer o Cinema Novo, participando junto do filme dele que era o Rio zona no mar. E o Cinema Novo acabou acabando com a chanchada. Você tem alguma mágoa dessa nova turma de cinema que veio em 1950 para fazer...?

Grande Otelo: Há dezesseis anos atrás eu dizia que tinha mágoa, mas hoje eu não digo, eu digo que tenho que reconhecer que o progresso é natural, e a inteligência humana está caminhando, está progredindo, está absorvendo coisas que são necessárias para a maior grandeza da arte universal. Agora, tem uma coisa. Quando você vê Cambalacho, uma novela [da Rede Globo] chamada Cambalacho, é absolutamente brasileira e é universal.

Luciano Ramos: Sim, mas o cara que escreveu se baseou naquilo que você fazia na época da chanchada, que é o [autor de telenovelas] Silvio de Abreu, quer dizer, o Silvio de Abreu assistiu tudo para fazer isso, foi ele que escreveu, não é? Então, o cambalacho é aquela coisa do ciclo. Hoje a televisão faz aquilo que você fazia, que o Oscarito fazia, que o Waltson Macedo fazia, em 1950.

Grande Otelo: "Uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". As idéias não são todas iguais, daí o fato do Cinema Novo ter acabado, porque o cara fazia um filme com a idéia dele, mas não era uma idéia universal, era a idéia dele. O único que conseguiu universalizar essa coisa foi o Glauber, mas ele não universalizou tanto, porque mesmo o [filme] Deus e o Diabo na terra do sol era uma coisa totalmente brasileira e se projetou no estrangeiro, não como uma obra de arte realmente, mas como uma curiosidade do Brasil.

Rodolpho Gamberini: Otelo, tem um telespectador perguntando se você bebe, se você continua bebendo e tal, e eu sei que você parou de beber.

Grande Otelo: Mentira, eu continuo. [risos]

Rodolpho Gamberini: Tá vendo como eu não sei tudo.

Grande Otelo: Negócio de que você bebe, você bebe, você bebe, ele bebe, todo mundo bebe, agora eu não bebia, eu "comia com farinha". [risos]

Rodolpho Gamberini: Você foi alcoólatra?

Grande Otelo: Fui alcoólatra, eu estive internado.

Rodolpho Gamberini: Então a pergunta do telespectador cabe. Você me deixou na sinuca, mas a pergunta do Osvaldo Rartner, de Guararema é a seguinte: como é que você deixou o alcoolismo?

Grande Otelo: Só se pode deixar o alcoolismo através da força de vontade, através das situações que se apresentam. Imagine você se ontem eu tivesse saído da boate, tivesse ido para dentro da noite carioca e tivesse aparecido no aeroporto na hora de tomar o avião. Como eu é que eu estaria? Eu saí da boate, fui para casa dormir e me lembro que acordei às 9 da manhã e estava no aeroporto uma hora. Uma hora estava no aeroporto numa boa e estou aqui numa boa e já tomei o meu Martini na hora do jantar.

Luciano Ramos: Bom, já que o papo está no nível pessoal, eu queria saber se nessa luta que você fez para parar de "beber como farinha" e só tomar por prazer, se você teve ajuda de alguma força que você consideraria espiritual?

Grande Otelo: Olha, eu sou umbandista [adepto da umbanda, religião afro-brasileira que mistura ensinamentos do espiritismo de Alan Kardec, do catolicismo e de religiões trazidas pelos escravos africanos]. Todos nós necessitamos de acreditar em alguma coisa, todos nós necessitamos de uma crença. E eu comecei, depois de ter estado no [colégio] Coração de Jesus, depois de ter ajudado em missa, depois de ser coroinha e tudo, continuei acreditando em Deus, continuei acreditando naquilo que lá no Coração de Jesus acreditava, que era o anjo da guarda, todos nós temos um anjo da guarda, mas eu precisava de uma força maior e então eu entrei para um grupo e dentro desse grupo tinha um amigo meu, que é amigo meu há 50 anos, e esse amigo me encaminhou para uma sessão de umbanda, um terreiro de umbanda. E nesse terreiro de umbanda eu vi vários fenômenos, várias coisas acontecerem, entre elas uma que eu nunca mais esqueci. Nós tínhamos uma colega que sofreu um desastre e se afastou dos melhores meios de teatro. Eu fiquei sem saber por onde ela andava, todos nós ficamos sem saber por onde ela andava. Uma noite chegou no terreiro alguém de fora e pediu para incorporar o guia protetor ali no terreiro. Se incorporou e me falou: eu tenho um recado para fulana de tal, preciso falar com fulana de tal. Eu digo: “Eu não sei onde ela está. - Você vai saber.” Daí dois dias me apareceu um empresário, que por sorte era sério, e me deu um cachê, que até aquela altura não tinha recebido, eu guardei a metade, levei só a outra metade para Belém do Pará, ela estava em Belém do Pará trabalhando e eu disse a ela: “olha, um senhor que recebe o seu guia precisa conversar com você”. Ela embarcou no dia seguinte para o Rio de Janeiro e hoje ela é uma personalidade muito bem de vida em uma cidade do estado do Rio de Janeiro. Isso me fez uma grande impressão.

Luciano Ramos: O que eu queria saber é um seguinte: você não acha que a umbanda, comparada com o candomblé [religião iniciática fundamentada nas milenares religiões das tribos africanas com seus orixás e que veio para o Brasil com os escravos], que é uma outra prática também que tem algumas coisas em comum, a umbanda não é algo, não é uma coisa mais do branco do que o candomblé? Sinto que o candomblé tem uma ligação maior com a África.

Grande Otelo: Tem, o candomblé tem uma ligação mais firme com a África, mas calhou que eu fosse para um terreiro de umbanda e, nesse terreiro de umbanda, eu estou respeitando as regras do terreiro, mas eu estive com a Mãe Menininha [1894-1986, uma das mais famosas líderes de candomblé do Brasil, foi mãe-de-santo, durante muitos anos, de um terreiro de Salvador/Bahia, chamado Gantois, frequentado por muitos artistas] antes que ela morresse e ela me disse que eu tanto posso "cruzar" no candomblé como na umbanda.

Rodolpho Gamberini: Tem uma pergunta de um telespectador que é bem interessante, é do Lázaro Dutra, de Avaré, em São Paulo que diz o seguinte: “Anos atrás, em uma reportagem, você disse que foi adotado por um advogado, é isso?”

Grande Otelo: É.

Rodolpho Gamberini: E dele você roubou uma coleção de livros.

Grande Otelo: É verdade!

Rodolpho Gamberini: Qual é a coleção e porque você roubou uma coleção de livros de um doutor que te adotou?

Grande Otelo: Não foi bem que eu roubei. Não foi bem a coleção. Para mim naquele tempo não parecia roubo, ele pode achar que era roubo, mas naquele tempo não era roubo. Eu estava no colégio, estava no externato, apareceu um ioiô e eu queria jogar ioiô e não tinha dinheiro para comprar ioiô. [Risos] E a biblioteca de meu padrinho, doutor Antonio de Queiroz, pai do professor Queiroz Filho, tinha uns livros lá que me pareciam livros velhos, eram livros velhos eu podia vender no sebo e eu fui vendendo os mais velhos e justamente os livros mais velhos eram os mais importantes. [Risos] Inclusive vendi um Clóvis Bevilácqua [1859-1944, jurista, magistrado, jornalista, professor, historiador e crítico, fundador da cadeira 14 da Academia Brasileira de Letras] primeira edição. Quando meu padrinho soube, se zangou, se aborreceu e “onde você vendeu? Vamos lá no sebo”. E ele foi lá, ameaçou o sebo de prisão, porque eu era menor e tal e coisa e me disse: “você vai arranjar para você um outro tutor que seja de teatro, porque eu não quero mais você aqui em casa”. Eu achei que ele tinha toda a razão, fui arranjar um tutor que era de teatro. Arranjei um tutor, arranjei dois tutores, fiquei sem nenhum tutor, entrei para a Companhia do Jardel, fui ao Uruguai, fui a Argentina, voltei e aí estreei o Tabuleiro da Baiana e o público me viu, porque eu disse que o nome de Grande Otelo, onde estreei o público não me viu e ninguém bateu palma e disse: salve a Bahia, senhor! Quando eu estreei com a Déo Maia, aí o público me viu no Tabuleiro da Baiana. E vim para São Paulo novamente e estive hospedado na casa de meus padrinhos, os Queiroz, durante o tempo da temporada aqui em São Paulo no Teatro Santana, o antigo, e consegui uma frisa para que eles fossem ver o espetáculo. Naquele dia eu tremia feito vara verde, a família toda foi ver o espetáculo, gostaram muito e depois do espetáculo o doutor Queiroz, o velho, me disse: Otelo, você está de parabéns, porque você escolheu realmente a sua carreira. E continuamos amigos até hoje.

Rodolpho Gamberini: Otelo, nós estamos chegando ao finalzinho do programa já, são onze e quinze e já estamos aqui há quase duas horas. Qual é o seu recado para essa rapaziada, para essas moças e moços que estudam teatro, e também para o telespectador, claro?

Grande Otelo: Eu vou fazer uma coisa que não é costume. Eles me ouviram falar, me ouviram conversar, me ouviram contar coisas da minha vida através das perguntas que me foram feitas, e eu acho que eles devem ter absorvido muita coisa do que eu contei, porque tudo quanto eu contei é uma realidade. A bebida, que eu bebia ou não bebia, comia com farinha, era motivada por frustrações momentâneas. O papel que eu achava que devia ser meu e não era, então eu ia beber para me espairecer, para esquecer. O dinheiro que eu não juntei, eu não juntei porque eu era moço e a gente quando é moço, a gente trata de viver a vida o máximo que pode. Isso é muito natural. E hoje eu me considero rico, porque vocês pararam e vieram aqui para me escutar, eu sou um homem rico. A Watusi me sugeriu que eu fizesse uma turnê, eu tenho certeza que se eu fizer esta turnê eu vou ter mais dinheiro do que eu tenho. Eu disse brincando que estava atravessando muito bem o terceiro cruzado e, realmente estou, porque dentro dessa coisa toda, dentro dessa vida toda que eu levei da bebida com farinha, das farras, das mulheres bonitas, dos falsos amigos, eu fui adquirindo de cada um alguma coisa. Tive resistência para vir dos 19 anos aos 71 anos com a cabeça capaz de pensar, de raciocinar, não sou muito capaz de decorar mais novela, decorei a novela do Benedito Ruy Barbosa porque estava dentro de mim, porque estava dentro daquilo que passei na minha infância. Macunaíma para mim não foi esforço, porque eu tinha passado a minha infância caminhando pelos matos da minha terra. Então muita coisa que vocês passam e que pensam que não vale nada, vale muito, vale muito porque vocês podem aplicar depois quando forem representar. É o que eu faço, praticamente. Eu tenho um quadro no Scala hoje que me satisfaz muito, porque eu tenho meio minuto de dança diante do público, e depois eu tenho um quadro que eu praticamente não falo nada, mas dentro desse quadro tem uma atriz pela qual eu tenho um respeito enorme, pelo que ela tem e eu não tive muito que foi a disciplina. Então, vocês já vêem que tudo é válido, não adianta eu dizer a vocês que estudem, que sejam disciplinados, que isso e que aquilo. Tratem de viver e sejam realmente o que vocês querem ser: atores e atrizes.

Rodolpho Gamberini: Muito obrigado então, Grande Otelo. Obrigado a todos vocês que participaram desse Roda Viva. A gente volta na segunda-feira que vem com a Roda Viva às nove e vinte da noite. Boa noite e até lá!

[Em 1993, um ataque do coração fulminou Grande Otelo, a caminho de Paris, para uma homenagem que receberia no Festival de Nantes


http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/203/entrevistados/grande_otelo_1987.htm

1965: Malcolm X é assassinado no Harlem

21.02.2010

1965: Malcolm X é assassinado no Harlem

No dia 21 de fevereiro de 1965, Malcolm X, líder da luta contra a
opressão dos negros nos Estados Unidos, é assassinado no Harlem.

Malcolm Little nasceu em 19 de maio de 1925 no Nebraska, Estados
Unidos. Ele ainda era criança quando o pai, pastor batista, foi
assassinado por brancos, provavelmente membros da Ku Klux Klan. Órfão
(a mãe estava internada num hospital psiquiátrico), Malcolm e seus
irmãos foram entregues a orfanatos.

Malcolm e uma irmã foram morar em Boston, onde sobreviveram com
trabalhos temporários. Depois, ele mudou-se para o Harlem, bairro de
maioria negra em Nova York. Escapou do serviço militar por fingir-se
paranóico. Sua carreira no país dos brancos parecia programada:
empregos temporários, pequenos delitos, prisão.

Em 1946, foi para a cadeia por roubo e receptação. Justamente no
isolamento da penitenciária, ocorreu a conversão que transformaria o
profundo conhecedor dos becos de Nova York num dos mais carismáticos
líderes negros dos Estados Unidos. Atrás das grades, ele entrou em
contato com os ensinamentos de Elijah Muhammed, líder da "Nação do
Islã".

Malcolm estudou o Alcorão e outros escritos filosóficos e ao deixar a
prisão em 1952 passou a dedicar-se à organização do Movimento dos
Muçulmanos Negros. Trocou seu sobrenome de escravo "Little" por "X",
dizendo que "o X significa a rejeição do nome de escravo e ausência de
um nome africano para ocupar o seu lugar".

Elijah Muhammed considerava-se eleito por Deus para livrar os negros
americanos da opressão dos brancos. Malcolm X, seu principal
missionário, transformou a mesquita do Harlem em centro do movimento.

Movimento muçulmano

A luta dos negros americanos por igualdade de direitos
intensificava-se desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Nos anos 1960,
o movimento sofreu uma divisão: enquanto Martin Luther King apostava
na chamada "resistência pacífica", os muçulmanos liderados por Elijah
Mohammed e Malcolm X defendiam a separação das raças, a independência
econômica e um Estado autônomo para os negros.

A principal reivindicação de Malcom X era a melhoria da qualidade de
vida para os negros na América. Pelo menos num ponto seu programa
diferia do de outros grupos: Malcolm X argumentava que eles tendiam a
esperar mais mil anos para alcançarem seus objetivos. "Enquanto nós,
muçulmanos, não estamos dispostos a esperar nem mais cem anos.
Queremos a separação total entre escravos e senhores de escravos."

Segundo Erik Lincoln, professor de Filosofia Social da Universidade de
Atlanta e autor do livro The Black Muslims in America, o movimento
muçulmano negro foi, essencialmente, um movimento de protesto social
que se comportava mais ou menos como uma seita. Seus adeptos eram
principalmente negros da classe mais baixa, que tentavam encontrar seu
caminho e seu lugar na sociedade norte-americana. "Talvez, eles, de
fato, pretendessem construir sua própria sociedade - uma nação negra
de islâmicos", diz.

O projeto muçulmano não se tornou realidade, mas foi elogiado até por
um de seus mais severos críticos, o sociólogo James Baldwin. Segundo
ele, "Mohammed conseguiu realizar o que diversas gerações de
assistentes sociais, comitês, resoluções, projetos habitacionais e
parques infantis não haviam logrado: curar e recuperar alcoólatras e
vagabundos, redimir egressos de penitenciárias e impedi-los de
voltar".

Assassinato

Com o passar do tempo, Malcolm foi ficando cada vez mais famoso.
Começou a se distanciar do clichê de que todos os brancos são
"endemoniados" e não queria continuar mantendo a fachada de movimento
puramente religioso e apolítico.

Em março de 1964, Malcolm X rompeu com o movimento e organizou a
Muslim Mosque Inc., e mais tarde a "Afro-American Unity", organização
não religiosa. Numa viagem a Meca, a cidade sagrada dos muçulmanos, em
1963, mudou o nome para Al Hajj Malik Al-Shabazz. Seu rompimento com a
"Nação do Islã" e sua entrementes posição conciliatória em relação aos
brancos lhe trouxeram um certo isolamento.

No dia 21 de fevereiro de 1965, aos 39 anos, ele foi morto com 13
tiros quando discursava no Harlem. Jamais foram encontradas provas,
mas suspeitou-se do envolvimento da "Nação do Islã" no assassinato.

Suas ideias foram muito divulgadas na década de 1970 por movimentos
como o Black Power e as Panteras Negras. Sua vida e obra também estão
documentadas em vários filmes, sendo o mais famoso deles Malcolm X,
dirigido por Spike Lee, de 1992.

Redator(a):(ch/gh)

© Deutsche Welle

Cuestión de tonos

“Te paré porque eres blanca”, me dice el taxista después de chirriar las gomas en la calle Reina, cerca de la medianoche. De sus gruesos labios de mulato salen las justificaciones –una tras otra– de por qué no acepta clientes “de color” a estas altas horas. Busca complicidad en mí, que nací en un barrio mayoritariamente negro y me encantan las pieles color canela. Apenas lo escucho. Me molestan especialmente los que discriminan a sus iguales: el custodio del hotel que increpa al cubano pero deja pasar a un turista que grita y gesticula; la prostituta que se va –por diez pesos convertibles– con un canadiense que le duplica la edad, con tal de no parecer “derrotada” por aceptar a un compatriota; el santiaguero que una vez instalado en La Habana se burla del acento de quienes vienen de su propio pueblo.

Muchas veces me levanto y tengo ganas de ser mestiza como Reinaldo o como Teo, porque cuando miran mi nariz recta y mi pellejo blancuzco creen que me ha sido fácil. Nada de eso. Hay muchas formas de ser apartado, pues junto al racismo conviven aquí la discriminación por origen social, la estigmatización por filiación ideológica y la exclusión si no se pertenece a un clan familiar con poder, influencia o relaciones. Qué decir de la subestimación que se recibe en una sociedad machista al tener un par de ovarios enclavados en medio del vientre. De ahí que me incomode tanto la disertación del chofer, que ha detenido el auto ante la palidez de mi piel. Tengo ganas de bajarme, pero es tarde, muy tarde.

¿A qué te dedicas? me pregunta bajo el semáforo de la calle Belascoaín. Soy blogger –le advierto– y las luces de la avenida Carlos III me dejan ver su cara de suspicacia y temor. “Fíjate, no vayas a contar lo que acabo de decirte”, indica cambiando el tono complaciente que tenía al recogerme en medio de la penumbra. “No quiero que después publiques en Internet boberías sobre mí”, me aclara mientras se toca la entrepierna en un gesto de poder. El pelo lacio ha dejado de ser un motivo para confiar en mí, ya mis ojos no le parecen tan almendrados y cuando le explico –con mis delgados labios– los temas que abordo en el blog, es como si lo amenazara, navaja en mano, un peligroso delincuente. Compruebo entonces que su espectro clasificatorio no sólo estigmatiza algunos matices de color, sino también ciertas tendencias de opinión, esos tonos que no se llevan sobre la epidermis pero que provocan también –en esta Isla– muestras de segregación y rechazo.

http://www.desdecuba.com/generaciony/?p=2462

Justiça eleitoral cassa mandatos de Kassab e vice, diz jornal

20/02/10 - 23h57 - Atualizado em 21/02/10 - 01h57
Justiça eleitoral cassa mandatos de Kassab e vice, diz jornal
Decisão deve ser publicada no Diário Oficial de terça-feira (23).
Advogado do prefeito diz que lógica do juiz cassaria até o presidente.
Do G1, em São Paulo


A edição eletrônica do jornal 'O Estado de São Paulo' informou que a Justiça Eleitoral cassou, em primeira instância, o mandato do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, do DEM, por receber doações ilegais para a campanha de 2008. A vice de Kassab, a peemedebista Alda Marco Antonio, também teve o mandato cassado, de acordo com a reportagem. Ambos podem recorrer da decisão sem deixar seus cargos.

A decisão, segundo a reportagem, partiu do juiz da 1ª Zona Eleitoral, Aloísio Sérgio Resende Silveira, o mesmo juiz que havia cassado o mandato de um grupo de 16 vereadores paulistanos nos últimos meses do ano passado. O G1 tentou entrar em contato com o juiz Aloísio Sérgio Resende Silveira, mas não obteve retorno.

O motivo seria o mesmo das cassações anteriores: abuso de poder econômico. Assim como os vereadores cassados em primeira instância, Kassab e Alda teriam recebido mais de 20% das doações de fontes consideradas vedadas.

Entre os doadores considerados vedados pelo artigo 24 da Lei Eleitoral (9.504/97) estão "órgão da Administração Pública direta e com recursos provenientes do Poder Público", "concessionário ou permissionário de serviços públicos" e "entidade de classe ou sindical".

Em nota, os advogados do prefeito afirmam que as "contribuições foram feitas seguindo estritamente os mandamentos da lei". O texto afirma ainda que, se essa decisão servir de precedente, "por esse mesmo motivo seriam cassados desde o Presidente Lula até o vereador do menor município do Brasil".

Ao G1, um dos advogados do prefeito, Ricardo Penteado questionou a base da decisão do juiz da 1ª Vara Eleitoral. "A tese que o juiz defende, ele próprio reconhece que já foi vencida no Tribunal Superior Eleitoral, de que as empresas que são sócias de concessionárias não podem doar", disse Penteado.


http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1498868-5605,00-JUSTICA+ELEITORAL+CASSA+MANDATOS+DE+KASSAB+E+VICE+DIZ+JORNAL.html

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Polêmica Elton John: Jesus era um gay superinteligente

Polêmica
Elton John: Jesus era um gay superinteligente
Publicado em 19.02.2010, às 20h48
Do JC Online
Com agências


Jesus era um gay superinteligente, disse o britânico
Divulgação Um dos mais controversos artistas do planeta, o britânico Elton John, 62, voltou a criar polêmica nesta sexta-feira (19). Em entrevista à revista norte-americana Parade, afirmou que Jesus Cristo era um gay superinteligente. A declaração ganhou destaque no tablóide inglês The Sun e provocou reações por todo o mundo.

“Penso que Jesus era um gay compassivo e super inteligente, que percebia os problemas da humanidade”, disse o cantor que é assumidamente homossexual. "Jesus queria que nos amássemos e perdoássemos. Não sei o que faz as pessoas serem tão cruéis. Tente ser uma lésbica no Oriente Médio. É melhor estar morto", completou.

O inglês é um dos artistas mais bem sucedidos do século passado e autor de vários hits como I'm Still Standing, Sacrifice e Nikita. Embora homossexual, o cantor chegou a casar com a engenheira de som Renate Blauel em 1984, mas a união terminou em 1988. Em 2005 celebrou contrato de parceria civil com David Furnish, 47, com quem vive desde a década de 90.
http://jc.uol.com.br/canal/lazer-e-turismo/noticia/2010/02/19/elton-john-jesus-era-um-gay-superinteligente-214436.php