sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Competência: STF reconhece ao MP poder de investigação criminal

[21/10/2009 - 09:11] O Ministério Público (MP) tem, sim, competência para realizar, por sua iniciativa e sob sua presidência, investigação criminal para formar sua convicção sobre determinado crime, desde que respeitadas as garantias constitucionais asseguradas a qualquer investigado. A Polícia não tem o monopólio da investigação criminal, e o inquérito policial pode ser dispensado pelo MP no oferecimento de sua denúncia à Justiça.Entretanto, o inquérito policial sempre será comandado por um delegado de polícia. O MP poderá, na investigação policial, requerer investigações, oitiva de testemunhas e outras providências em busca da apuração da verdade e da identificação do autor de determinado crime.Com esse entendimento, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) indeferiu, por votação unânime, o Habeas Corpus (HC) 89837, em que o agente da Polícia Civil do Distrito Federal Emanoel Loureiro Ferreira, condenado pelo crime de tortura de um preso para obter confissão, pleiteava a anulação do processo desde seu início, alegando que ele fora baseado exclusivamente em investigação criminal conduzida pelo MP.Caso ainda em suspenso no STFO relator do processo, ministro Celso de Mello, optou por apresentar seu voto, independentemente do fato de que ainda está pendente de julgamento, pelo Plenário da Suprema Corte, o HC 84548, no qual se discute justamente o poder investigatório do MP.Ele citou vários precedentes da própria Corte para sustentar seu ponto de vista em favor do poder de investigação criminal do MP. Um deles foi o caso emblemático do recurso em HC (RHC) 48728, envolvendo o falecido delegado do extinto Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo Sérgio Paranhos Fleury, tido como personagem-símbolo do então existente “Esquadrão da Morte”, suspeito de eliminar adversários do regime militar e de torturar presos políticos, em ação realizada pelo próprio MP.No julgamento daquele processo, realizado em 1971 sob relatoria do ministro Luiz Gallotti (falecido), a Corte rejeitou o argumento da incompetência do MP para realizar investigação criminal contra o delegado. A investigação contra Fleury fora comandada pelo então procurador Hélio Bicudo, integrante do MP paulista.Outro precedente citado pelo ministro Celso de Mello foi o julgamento, pelo Plenário do STF, da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1517, relatada pelo ministro Maurício Corrêa (aposentado), em que a Suprema Corte também reconheceu que não assiste à Polícia o monopólio das investigações criminais.Caso análogoO relator se reportou, ainda, ao julgamento do HC 91661, de Pernambuco, relatado pela ministra Ellen Gracie, também envolvendo um policial, em que a Segunda Turma rejeitou o argumento sobre a incompetência do MP para realizar investigação criminal.O ministro Celso de Mello ressaltou, em seu voto, que este poder investigatório do MP é ainda mais necessário num caso como o de tortura, praticada pela polícia para forçar uma confissão, desrespeitando o mais elementar direito humano, até mesmo porque a polícia não costuma colaborar com a investigação daqueles que pertencem aos seus próprios quadros.“O inquérito policial não se revela imprescindível ao oferecimento da denúncia, podendo o MP deduzir a pretensão punitiva do Estado”, afirmou o ministro Celso de Mello, citando precedentes em que o STF também considerou dispensável, para oferecimento da denúncia, o inquérito policial, desde que haja indícios concretos de autoria.“Na posse de todos os elementos, o MP pode oferecer a denúncia”, completou. “O MP tem a plena faculdade de obter elementos de convicção de outras fontes, inclusive procedimento investigativo de sua iniciativa e por ele presidido”. Também segundo ele, a intervenção do MP no curso de um inquérito policial pode caracterizar o poder legítimo de controle externo da Polícia Judiciária, previsto na Lei Complementar nº 75/1993.Competência constitucionalContrariando a alegação da defesa de que a vedação de o MP conduzir investigação criminal estaria contida no artigo 144, parágrafo 1º, inciso IV, da Constituição Federal (CF), segundo o qual caberia à Polícia Federal exercer, “com exclusividade, as funções de Polícia Judiciária da União” – o que excluiria o MP –, todos os ministros presentes à sessão da Turma endossaram o argumento do relator.Segundo ele, a mencionada “exclusividade” visa, apenas, distinguir a competência da PF das funções das demais polícias – civis dos Estados, polícias militares, polícias rodoviária e ferroviária federais. Foi esse também o entendimento manifestado pelo subprocurador-geral da República, Wagner Gonçalves, presente ao julgamento. Celso de Mello argumentou que o poder investigatório do MP está claramente definido no artigo 129 da CF que, ao definir as funções institucionais do MP, estabelece, em seu inciso I, a de “promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”. No mesmo sentido, segundo ele, vão os incisos V, V, VII, VIII e IX do mesmo artigo.O ministro ressaltou que o poder investigatório do MP é subsidiário ao da Polícia, mas não exclui a possibilidade de ele colaborar no próprio inquérito policial, solicitando diligências e medidas que possam ajudá-lo a formar sua convicção sobre determinado crime, como também empreender investigação por sua própria iniciativa e sob seu comando, com este mesmo objetivo.RecursosCondenado em primeiro grau, o policial recorreu, sucessivamente, sem sucesso, ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DFT) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), com o mesmo argumento da nulidade do processo. Contra a decisão do STJ, ele impetrou HC no Supremo.Em 17 de outubro de 2006, o relator, ministro Celso de Mello, rejeitou pedido de liminar formulado no processo. A defesa ainda recorreu dessa decisão por meio de agravo regimental, mas a Segunda Turma não conheceu do recurso, em novembro daquele mesmo ano. A Procuradoria Geral da República opinou pela denegação do pedido.HC 85419Os mesmos fundamentos que resultaram no indeferimento do HC 89837, do DF, foram utilizados, também hoje, pela Segunda Turma do STF, para indeferir o HC 85419, impetrado em favor de dois condenados por roubo, extorsão e usura no Rio de Janeiro. Segundo a denúncia, apresentada com base em investigação conduzida pelo Ministério Público, um dos condenados é um ex-policial civil que estaria a serviço de grupos criminosos. Segundo o relator do processo, ministro Celso de Mello, as vítimas do condenado procuraram promotor de Justiça para denunciar a extorsão por não confiar na isenção da Polícia Judiciária para investigar o caso.
Processo: HC 89837 FONTE: STF

Comunicado CENARAB

Encontram-se abertas inscrições para os cursos que o CENARAB irá oferecer para as comunidades de tradição de Matriz Africana que atuam com o mesmo. As inscrições serão encerradas na próxima terça-feira, em caráter improrrogável. Peço as comunidades interssadas para contactarem com o CENARAB, através dos telefones: 97555305 - Henrique D'Oxala91973141 - Tafulecy
Os cursos oferecidos são:Introdução a Informática - DiurnoCostura de Roupas do Santo e Acessórios - DiurnoPercussão e Construção de Instrumentos - História da África - NoturnoCulinária Afro - DiurnoEstamos oferecendo duas vagas por curso para cada terreiro, que totalizam 10 pessoas por casa em cursos diversos. O CENARAB não oferecerá transporte para os alunos que farão as aulas, mas as mesmas se darão em no máximo 2 vezes por semana.LEMBRAMOS A TODOS QUE ESTAS VAGAS ESTÃO SENDO OFERECIDAS PARA OS TERREIROS FILIADOS AO CENARAB, OU QUE SE ENCONTRAM EM SUA ÓRBITA DE ATUAÇÃO. Pedimos as comunidades que ao inscreverem as pessoas por ela indicadas aos cursos o façam levando em consideração a função exercida pelas mesmas no terreiro. Estas serão responsáveis por repassarem o conhecimento apreendido para a casa. No caso especifíco da Oficina de Costura, só serão aceitas pessoas que já sabem costurar, pois a oficina pretende ser um espaço de troca e de aperfeiçoamento.NÃO SE ESQUEÇAM O PRAZO PARA INSCRIÇÕES SE ENCERRA NA TERÇA-FEIRA PRÓXIMA, DIA 27/10.Atenciosamente,Coordenação do CENARAB
"JUNTE-SE AS ENTIDADES DO MOVIMENTO NEGRO BRASILEIRO PELA APROVAÇÃO IMEDIATA DO ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL E PELA IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA DE AÇÕES AFIRMATIVAS. DIGA SIM A UM PAÍS MAIS INCLUSIVO". CENARAB MINAS.

"um país projetado sobre o trabalho escravo não se reinventa de um dia para o outro, nem mesmo de um século para o outro. O racismo faz parte da fibra de que a América é tecida". Will Smith

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Reparações e compilações

Reparações e compilações

Sueli Carneiro
Escrito por Correio Braziliense–coluna Opinião

O jornal O Tempo, de Belo Horizonte, procurou-me, esta semana, interessado no tema das reparações que está pautado internacionalmente em função da Conferência de Racismo, que ocorrerá na África do Sul em agosto de 2001. O tema me traz à lembrança o extraordinário artigo ‘‘Dívida de Sangue'', de Rubens Ricupero, na Folha de S. Paulo, sobre a monstruosidade do tráfico negreiro que trouxe para as Américas em torno de 11,5 milhões de africanos, a grande maioria deles para o Brasil. Nele, Ricupero demonstra, por meio de textos do séculos 18, como o tráfico negreiro se constituiu a mola propulsora do desenvolvimento da Europa Ocidental e da América como ‘‘inexaurível fundo de riqueza e poder'' para essas nações, responsável ‘‘pela elevação do nível de vida de muitos europeus e americanos, ao mesmo tempo em que degradava a vida de numerosos negros escravizados''.

A conclusão de Ricupero em relação ao Brasil, que teve, conforme ele, ‘‘a cota maior na partilha do crime'' do tráfico negreiro, está contida no próprio título do artigo: divida de sangue.




http://www.geledes.org.br/sueli-carneiro/reparacoes-e-compilacoes.html

Já em Joaquim Nabuco, o problema está anunciado. Ele estrutura o seu livro Escravidão em três partes: a primeira ele denomina O Crime; a segunda, A História do Crime; a terceira, que está em branco (em duas das edições que conheço), o que talvez simbolicamente queira indicar a lacuna que está por ser preenchida na sociedade brasileira desde o século 19, chama-se A Reparação do Crime.

O vice-presidente Marco Maciel, no seminário ‘‘Multiculturalismo e Racismo: O Papel da Ação Afirmativa nos Estados Democráticos Contemporâneos'', organizado pelo Ministério da Justiça em 1996, resgata o que ele considera a visão profética e atualidade de Joaquim Nabuco para quem, ‘‘a escravidão permanecerá por muito tempo como característica nacional do Brasil, uma vez que a abolição não foi seguida de ‘‘medidas sociais complementares em benefício dos libertados, nem de qualquer impulso interior, de renovação da consciência pública''.

E Marco Maciel afirma: ‘‘Repito com Nabuco: ‘(...) não basta acabar com a escravidão, é preciso destruir a obra da escravidão' e ainda (...) ‘vencer o preconceito que se generalizou e tornar evidente o débito de sucessivas gerações de brasileiros para com a herança da escravidão que se transformou em discriminação é apenas parte do desafio' ''

É essa base histórica que faz com que o tema das reparações seja, para muitos países africanos, para movimentos sociais negros do Brasil, dos EUA e da América Latina, um dos temas prioritários a serem discutido na Conferência Mundial de Racismo. E, em relação a ele, os governos dos países-membros da ONU deverão se posicionar.
O tema das reparações exige o reconhecimento de que povos, nações ou minorias foram submetidos a processos de escravidão, genocídio e espoliação com base em discriminações de raça, cor, religião.

É o reconhecimento de um passado nefasto em prol de um futuro em que certas práticas não possam mais ter lugar que faz com que hoje, trabalhadores, em sua maioria judeus que foram escravizados durante a Segunda Guerra Mundial, sejam objeto de indenizações pelo Estado alemão e empresas que disso se beneficiaram.
Dispomos também no Brasil de uma experiência respeitável nesse campo ao termos sido capazes de reparar, em algum grau, os familiares das vítimas do regime militar. Reparação material e simbólica que, ao expressar a nossa condenação moral às violências praticadas naquele período, reconcilia a nação, em parte, com os melhores valores da tradição democrática.

Em relação aos descendentes de africanos escravizados, os negros brasileiros, o terceiro capítulo do livro de Joaquim Nabuco continua em branco... Para Contardo Caligaris, (...) ‘‘corrigir a desigualdade, que é herdeira direta, ou melhor, continuação da escravatura, no Brasil, não significa corrigir os restos da escravatura. Significa começar finalmente a aboli-la''.

O presidente Fernando Henrique Cardoso, no seminário citado anteriormente, disse: ‘‘Não se pode esmorecer na hipocrisia e dizer que o nosso jeito é esse. Não, o nosso jeito está errado mesmo, há uma repetição de discriminações e há a inaceitabilidade do preconceito. Isso tem que ser desmascarado, tem de ser, realmente, contra-atacado, não só verbalmente, mas também em termos de mecanismos e processos que possam levar a uma transformação, no sentido de uma relação mais democrática entre as raças, entre os grupos sociais e entre as classes''.

Os movimentos sociais negros e outros setores sociais vêm oferecendo ao Estado e à sociedade toda sorte de propostas de políticas compensatórias capazes de realizar o que Ricupero chama de ‘‘purificação da memória'', que poderia conduzir à reconciliação da nação com o seu passado pela reparação do dano praticado.

As frases e falas aqui compiladas, os termos que as apóiam (dívida, débito, crime) e a importância pública de quem as profere permitem supor que já temos no Brasil massa crítica e vontade política suficientes para advogar em favor dotema das reparações na Conferência Mundial de Racismo e, sobretudo, para começar a implementá-las desde já.



http://www.geledes.org.br/sueli-carneiro/reparacoes-e-compilacoes.html


Um velho artigo de Maciel

INIÃO

15/10/2009
Um velho artigo de Maciel
Edson Lopes Cardoso
edsoncardoso@irohin.org.br
Em 24 de novembro de 2000, num artigo para o Jornal do Brasil (“A integração racial no Brasil”, p. 9), o então vice-presidente da República, Marco Maciel, alertava: “O Brasil terá de convencer-se de que os negros e seus descendentes deixarão de ser minoria no próximo século, pois já representam maioria em três das cinco regiões brasileiras”.

Maciel aludiu ainda, em seu memorável artigo, a formas ostensivas e disfarçadas de racismo, a uma quimérica e virtual igualdade de oportunidades constitucional, e ensinava que “O caminho da ascensão social, da igualdade jurídica, da participação política, terá de ser cimentado pela igualdade econômica que, em nosso caso, implica o fim da discriminação dos salários, maiores oportunidades de emprego e participação na vida pública”.

Maciel fez referência também às cotas no mercado de trabalho, na universidade e na representação política como se fossem então possibilidades concretas de ação governamental, cujos resultados não podia antecipar – “uma incógnita a que de antemão ninguém ousará responder”. As cautelas se justificavam porque, como disse Rubem Ricupero, num simpósio sobre relações Brasil-África na Câmara, em 1986, “o tema é complexo e nos divide como nenhum outro”.

Não sei se o senador Marco Maciel guarda cópia de seu artigo, mas eu o conservo com zelo beneditino. Seu texto poderia, a meu ver, servir de referência para um pronunciamento contundente, no momento em que o Senado se dispuser a apreciar o projeto que cria o Estatuto da Igualdade Racial, embora, como se sabe, o senador pernambucano seja avesso a estardalhaços.

Os leitores do Ìrohìn devem estar pensando, como eu, em reminiscências camonianas, avaliando com amargura o fato de que onde a gente põe nossa esperança, a realidade política nos deixe tão pouca segurança.

Afinal, as preocupações levantadas por Maciel, na conjuntura pré-Durban, são bem distintas daquelas manifestadas por seu partido, o DEM. Esqueça. A novidade é que o DEM, em seus tenebrosos desígnios, seja hoje diligentemente coadjuvado pela bancada negra.

Ao reler o artigo de Maciel, a sensação que se impõe é a de que perdemos uma oportunidade valiosa na virada do século. O discurso de um político conservador de menos de uma década parece hoje séculos à frente dos parlamentares negros do PT, desvinculados de qualquer realidade. Associaram sua causa (se é que tinham uma) à causa dos opressores da população negra.




http://www.irohin.org.br/onl/new.php?sec=news&id=4811

Fim da era dos movimentos sociais brasileiros

Fim da era dos movimentos sociais brasileiros

Em Debate

Fonte: Folha de São Paulo -

por: RUDÁ RICCI -


Os movimentos sociais que antes exigiam inclusão social ingressaram no Estado e foram engolidos pela lógica da burocracia pública

diego-movimentos-sociais

ENTRE MUITAS divergências, há um consenso entre estudiosos dos movimentos sociais: todos são formados a partir de espaços não consolidados das estruturas e organizações sociais. Ocorre que, nos anos 1990, muitos movimentos sociais se institucionalizaram.


Diversos ensaios recentes revelam essa forte institucionalização e segmentação política e social nas experiências associativas, além de avaliar o processo de participação social nas experiências de gestão participativa (como a do orçamento participativo).


Mesmo na América Latina, vários estudos (como o de Christian Adel Mirza, "Movimientos sociales y sistemas políticos en América Latina", publicado pelo Clacso) relacionam nitidamente aquele conceito de movimento social (não institucionalizado) com o Estado e instituições políticas dos países do continente.


Fica a dúvida: a "era dos movimentos sociais" teria terminado no Brasil? A fragmentação social em curso e a ampliação da participação da sociedade civil no interior do aparelho do Estado teriam reformatado o que antes denominávamos "movimentos sociais"? Os movimentos sociais brasileiros são representações ou parte integrante de anéis burocráticos de elaboração de políticas públicas?


Segundo o IBGE, 75% dos municípios brasileiros adotam alguma modalidade de participação da sociedade civil na determinação de prioridades orçamentárias na área social.


Motivados ou premidos pelas exigências constitucionais, pelos convênios com órgãos federais (dados importantes fornecidos pelo IBGE revelam que governadores e ministérios lideram a criação de conselhos de gestão pública paritários, muito acima das ações de prefeitos brasileiros) e Ministério Público, prefeitos de todo o país institucionalizam (e, muitas vezes, traduzem ou interpretam a partir de seu ideário peculiar) vários mecanismos de gestão participativa na deliberação de políticas locais.


Se localidades rurais, conselhos de desenvolvimento rural sustentável, de meio ambiente ou de bacias hidrográficas pululam. Se localidades urbanas, conselhos de saúde, assistência social e direitos da criança e do adolescente proliferam. Onde estariam os movimentos sociais que antes exigiam inclusão social e fim da marginalização política?


Estão todos nesses conselhos e nas novas estruturas de gestão pública.


Ao ingressarem no mundo e na lógica do Estado, poderiam construir uma nova institucionalidade pública.


Porém, foram engolidos pela lógica da burocracia pública.


A multiplicação das conferências de direitos não foram incorporadas às peças orçamentárias na maioria dos entes federativos. Não alteramos a lógica de funcionamento e de execução orçamentária efetivamente.


O aumento da participação da sociedade civil na gestão pública também não ensejou mudança na estrutura burocrática altamente verticalizada e especializada do Estado brasileiro nas três esferas executivas.


Enfim, o ideário anti-institucionalista dos movimentos sociais brasileiros dos anos 80 converteu-se ao ideário do Estado que atacavam. Talvez por inconsistência teórica e programática, pautados pela mera negação ou pelo sentimento de injustiça. Mas, talvez, por excesso de partidarização dos movimentos sociais.


Nos anos 80, não por coincidência, Frei Betto sugeria que sindicatos, partidos e organizações sociais eram ferramentas do que denominava "movimento popular".


Tal concepção fomentou a criação da Anampos, organização nacional que articulava sindicatos de oposição à estrutura oficial do sindicalismo nacional e movimentos sociais.


O mundo sindical achou caminho alternativo ao ideário dos movimentos sociais e se afastou da Anampos.


E os movimentos sociais?


Nos anos 90, eles se atiraram na tarefa de formalizar as estruturas de gestão pública participativa conquistadas na Constituição de 1988. Mas, a partir das estruturas criadas e com a eleição de Lula (o ícone do ideário dos anos 80), suas lideranças subsumiram à lógica do Estado. E não conseguiram mais se livrar dela. Basta analisarmos as pautas das conferências nacionais de direitos.


São, com raríssimas exceções, a agenda definida pelo governo federal.


Compreendo que esse é o cenário montado para o drama que se desenrola nos últimos dias quanto ao futuro do MST. Evidentemente, a organização popular mais poderosa do país, a única que ainda consegue gerar mobilizações sociais de massa, está se isolando politicamente.


Isola-se a partir do governo que ajudou a desenhar, mesmo que apenas no seu esboço mais geral. E se isola porque seus aliados de antes estão imersos nos escaninhos do Estado.


RUDÁ RICCI, 47, sociólogo, doutor em ciências sociais, é membro do Fórum Brasil de Orçamento e do Observatório Internacional da Democracia Participativa.


http://www.geledes.org.br/em-debate/fim-da-era-dos-movimentos-sociais-brasileiros.html