RIO - A Viradouro perdeu R$ 7 milhões da Petrobras, mas manteve a pose. Apesar do cancelamento do patrocínio prometido, em novembro, o presidente da agremiação de Niterói, Marco Lira, preferiu não mexer no projeto original. A escola vai desfilar de forma luxuosa o enredo "Vira-Bahia, pura energia!", quase uma propaganda carnavalesca dos biocombustíveis e do estado de Antonio Carlos Magalhães.
– A Petrobras direcionou o enredo, mas, devido à crise, motivo esse alegado pela maior estatal do país, não teve como acenar com qualquer ajuda – lamentou Marco.
Não houve assinatura de contrato. Lira explicou que a subsidiária Petrobras Biocombustível faria o primeiro repasse, de R$ 500 mil, em outubro, e as demais parcelas, com valores "maiores", chegariam em janeiro em fevereiro. A assessoria de imprensa da estatal não comentou as declarações.
O presidente da Viradouro garante que a perda não provocou qualquer crise financeira na escola. O montante está sendo reposto, detalha, com a renda dos ensaios abertos e R$ 300 mil da prefeitura de Niterói. As fantasias de dois carros alegóricos, que seriam doadas a moradores de comunidades carentes do município, foram colocadas à venda para ajudar a completar o orçamento.
– A gente tem a quadra, que é bem movimentada de terça a sábado, para gerar boa receita. Administrando com seriedade, consegue-se dar jeito – convence Lira, com relógio e pulseira de ouro no braço esquerdo.
Assim, mesmo com a alta do dólar, a bateria da Viradouro “vem” vestida com plumas de faisão – vendidas a 5 euros (R$ 14,50) cada uma na internet. São 11 alegorias e 3.200 integrantes com fantasias doadas pela escola. No quarto carro, 20 mulheres fantasiadas de camarão nadam em uma panela gigante de moqueca, cheia de óleo de bronzear para imitar a consistência do dendê – biocombustível primitivo, usado para acender lamparinas.
– O dendê sai da panela e vira combustível de motor – aponta o carnavalesco Milton Cunha para os canos fictícios do carro.
Etanol e biodiesel
Temas inúmeras vezes explorados, a Bahia e os orixás voltam à avenida com a missão de divulgar o etanol e o biodiesel. O carnavalesco se inspirou na energia da natureza, representada pelos deuses africanos, para desenvolver o enredo. Uma escultura de Oxalá enfeita o abre-alas, seguido de um carro anexo com 65 enormes canas-de-açúcar recheadas de beldades em trajes sumários.
– Sempre abordam o conceito filosófico da Bahia e dos orixás. Eu vou falar da relação com os elementos da natureza e o poder. Quando você mói a cana e tira o álcool, o que é isso? É Ossanha, a deusa da ervas – relaciona Milton.
A deusa aparece no segundo carro, em forma de árvore, cercada de esculturas de mulheres aladas, com barrigas em forma de sementes luminosas que piscam. Ícones de Salvador, como o Pelourinho, o Mercado Modelo e a Casa de Jorge Amado, estão no terceiro carro com bombas de biocombustível. O protocolo de Kyoto é lembrado na quinta alegoria, onde há o encontro entre Iemanjá e uma deusa japonesa, e a Usina de Candeias, na Bahia, no sétimo – “o carro do patrocínio que não veio”.
– Mantive o enredo porque confio nos orixás – justifica-se Milton Cunha.
Ana Paula Verly, Jornal do Brasil