sábado, 23 de maio de 2009

Cotas para negros podem gerar preconceito, afirmam fashionistas


Moda
Sexta, 22 de maio de 2009, 10h32 Cotas para negros podem gerar preconceito, afirmam fashionistas

Patricia Zwipp
Marcio Madeira/Especial para Terra
A top Gracie Carvalho em desfile de Alexandre Herchcovitch na última edição do SPFW


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A última novidade do São Paulo Fashion Week está causando polêmica no mundo da moda. É que nem todos concordam com o acordo feito entre o Ministério Público do Estado de São Paulo e a empresa Luminosidade Marketing & Produções, organizadora do evento. A idéia é de que as grifes escalem para o casting dos desfiles pelo menos 10% de modelos negros, afrodescendentes e indígenas nas passarelas, como forma de promover a inclusão social. O Terra entrou em contato com vários estilistas e de agências de modelo, mas quase ninguém quis se pronunciar sobre a questão.
» Chat: tecle sobre o assunto» vc repórter: mande fotos e notícias O estilista Jefferson Kulig, que apresenta suas coleções na semana de moda paulista, topou falar sobre o assunto. Ele acredita que a proposta pode ter efeito contrário. "A recomendação me parece uma imposição e a própria imposição gera preconceito. Isso (inclusão) deve ser abordado de um modo subliminar, inteligente e não tão agressivo", opina. O profissional ainda não sabe se a seguirá. "Depende da disponibilidade das modelos na época do casting." Anderson Baugartner, dono da agência Way Model, tem opinião semelhante. "É mais ou menos combater um preconceito com outro". O empresário, que afirma não saber a porcentagem de modelos negros, afrodescendentes e indígenas no seu casting, supõe que o pedido possa levar a situações indesejadas. "Se o estilista escolher uma modelo negra apenas por isso, a menina vai ficar sabendo e gera um desconforto. Pode prejudicar o desfile se o estilista escolher alguém fora da sua proposta, seja loira, ruiva ou negra. Por exemplo, se procura um perfil mais brasileiro, não adianta nada colocar uma garota loira e com sardas." O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado ontem entre o Ministério Público de São Paulo e a Luminosidade, dirigida por Paulo Borges. De acordo com comunicado divulgado nesta quarta pelo Ministério, de acordo com o TAC a empresa se compromete a adotar uma série de providências para estimular a inclusão social dos modelos no mundo da moda. A Luminosidade terá de sugerir, por dois anos, a todas as grifes participantes do evento a utilização de pelo menos 10% de modelos negros, afrodescendentes ou indígenas. O TAC considera afrodescendente aquele com ascendência por consaguinidade até o 2º grau. A Luminosidade também "terá de enviar ao MP, no prazo de 30 dias, após cada edição, a comprovação de cumprimento da cláusula e a relação de todos os modelos, por desfile e por grife, apontando aqueles que se inserem nesse critério." Caso o evento não cumpra alguma das cláusulas, a multa será de R$ 250 mil. "Não se trata de querer impor uma cota racial, mas de promover a inclusão social de afro-descendentes e indígenas nesse segmento", ressalta a promotora de Justiça coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Inclusão Social (Gaeis), Deborah Kelly Affonso. Caso alguma grife não cumpra o acordo, o MP estudará o caso. De acordo com a temática do desfile, a grife poderá apresentar justificativa para não seguir a recomendação.
Especial para Terra

Incentivo a modelos negras na passarela é polêmica entre fashionistas

22/05/09 - 09h00 - Atualizado em 22/05/09 - 14h20
Incentivo a modelos negras na passarela é polêmica entre fashionistas
SPFW fecha acordo para que 10% das modelos sejam afro-descendentes.Estilista diz que medida 'constrange'; modelo admite falta de oportunidades.
Dolores Orosco Do G1, em São Paulo

Para Aline Apolinário, modelos negras terão mais oportunidades com a medida. (Foto: Divulgação)
O acordo que a organização da São Paulo Fashion Week assinou com o Ministério Público Estadual, se comprometendo a incentivar as grifes a contratar 10% de modelos afro-descentes e indígenas para os desfiles, causou polêmica entre os profissionais do mundo fashion. A medida, chamada de "termo de ajustamento de conduta", foi anunciada na última quarta-feira (20) e dividiu opiniões dos estilistas, das agências de moda e das próprias modelos.
Dudu Bertholini, designer da grife Neon, classificou a iniciativa como "hipócrita". "Acho preconceituoso, um absurdo. Desse jeito são as autoridades que provocam a segregação, pois essa medida vai constranger as modelos negras", diz o estilista. "As meninas se sentirão desconfortáveis, sem saber se foram escolhidas por terem talento ou por causa de uma obrigatoriedade política hipócrita", completa.
Bertholini, que garante não utilizar o critério racial ao selecionar as tops que desfilam para sua grife, afirma que não existe preconceito no meio fashion. "Não é justo apontar o dedo na cara da moda e dizer que há discriminação. Há 40 anos o Yves Saint Laurent já colocava modelos negras na passarela".
O diretor da agência Mega Models, Raphael Garcia, tem pensamento semelhante ao do estilista. E afirma ainda que existe uma "carência" de candidatas a modelo com o perfil no mercado. "É difícil explicar o motivo, mas poucas meninas negras procuram a agência para fazer um book [ensaio fotográfico feito com a modelo iniciante]. Quando chega até nós uma candidata com potencial, fazemos questão de incentivar e fechar contrato".

A mineira Fernanda Teo, que é modelo há seis anos e diz que há pouco espaço para negros nas campanhas de moda.

Segundo Garcia, dos 150 modelos contratrados da agência - entre homens e mulheres - cerca de 20% são de origem africana. "Na temporada de verão, as grifes buscam mais as negras, garotas de pele mais escura, com mais curvas, para os desfiles. Já nas coleções de inverno, em geral, as marcas preferem ter modelos com um perfil mais nórdico na passarela".
Poucas oportunidades
Moisés Júnior, booker da agência Ten Models, vê de maneira positiva a medida tomada pelo Ministério Público. "Claro que a situação em relação há dez anos melhorou muito. Mas, infelizmente, as oportunidades de trabalho para as modelos negras continuam escassas", opina.

"A procura das grifes por afro-descendentes é mínima. Posso dizer, de maneira geral, que de dez 'castings' [teste para seleção de modelos em campanhas e desfiles] que aparecem aqui por semana, um ou dois são direcionados para as negras", diz Júnior.
O booker conta que dos 140 modelos contratados da agência, 12 são negros. "Nos Estados Unidos e na Europa, o mercado está bem mais democrático. Pode comparar uma revista de moda estrangeira com uma daqui: você verá muito mais negras deslumbrantes em campanhas conceituadas do que nas publicações brasileiras".
Modelo há seis anos, a mineira Fernanda Téo, de 22, admite ter dificuldades em trabalhar por ser afro-descendente. "Quando as grandes marcas contratam uma garota negra para uma campanha, é porque ela já tem um nome firmado no mercado internacional", diz Fernanda, citando a carreira bem-sucedida de colegas como Emanuela de Paula, Ana Bela, Samira Carvalho e Carmelita Mendes.

"No Brasil, quando você é negra, primeiro tem que fazer sucesso lá fora para aí sim ser reconhecida e chamada para os trabalhos aqui", conta a modelo, que desfilou pela primeira vez para uma grife na SPFW na última temporada, em janeiro.
A modelo Aline Apolinário, de 17, acredita que a nova política de incentivo da semana de moda paulistana trará mais oportunidades para as garotas negras. Mas lamenta que a situação tenha chegado a tal ponto. "Claro que as grifes vão nos procurar mais, vai abrir portas. A pena é que seja às custas de patrulha ideológica. Em algum momento vou me questionar: 'estou aqui porque eles me acharam bonita e desfilo bem ou por causa da cota?'".