quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

PROCESSO SELETIVO PARA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU: RELAÇÕES ETNICORRACIAIS E EDUCAÇÃO: UMA PROPOSTA DE (RE)CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO SOCIAL

Prezadas e prezados,

Com muita satisfação, o Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET/RJ) publica o edital de seleção de candidatos à segunda turma do curso de pós-graduação lato sensu "RELAÇÕES ETNICORRACIAIS E EDUCAÇÃO: UMA PROPOSTA DE (RE)CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO SOCIAL.

O Edital pode ser encontrado no sítio do CEFET/RJ (http://www.cefet- rj.br/ ), na página da Diretoria de Pós-Graduação (http://dippg. cefet-rj. br/ ; http://dippg. cefet-rj. br/index. php?option= com_content&view=article&id=94%3Acursospgls&catid=23%3Acolat& Itemid=70〈=br ).

Lembramos que o curso é TOTALMENTE GRATUITO.

Por gentileza, ajudem-nos com a divulgação.

Seguem as informações que constam no Edital:




PROCESSO SELETIVO PARA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU:

RELAÇÕES ETNICORRACIAIS E EDUCAÇÃO: UMA PROPOSTA

DE (RE)CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO SOCIAL

O Diretor-Geral do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca -
CEFET/RJ, no uso de suas atribuições, torna público o presente Edital, contendo as normas
referentes ao processo seletivo para o Curso de Pós-graduação Lato Sensu: Relações Étnico-
Raciais e Educação: Uma Proposta de (Re)Construção do Imaginário Social, a ser
oferecido no CEFET/RJ - Avenida Maracanã, 229 - MARACANÃ - RIO DE JANEIRO


TÍTULO 1 - DO PROCESSO SELETIVO


1.1 O processo de seleção estará aberto para portadores de diploma de curso superior completo, das mais diversas áreas, reconhecido por órgão competente.
1.2 O processo seletivo compreenderá três etapas distintas:
A. Análise da validade dos documentos - de caráter eliminatório;
B. Análise do Curriculum Vitae comprovado - de caráter classificatório;
C. Prova escrita: Produção de texto argumentativo, de caráter classificatório.
Bibliografia básica para a prova escrita:
a) Lei 10.639/03 (http://www.planalto .gov.br/ccivil_ 03/leis/2003/ L10.639.htm);
b) Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Etnicorraciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
(http://www.publicac oes.inep. gov.br/arquivos/ %7B2A0A514E- 6C2A-4657- 862FCD4840586714 %
7D_AFRO-BRASILEIRA. pdf );
c) "Que negro é esse na cultura negra?". In: HALL, Stuart. Da diáspora - Identidades
e mediações culturais. BH: Editora UFMG, 2006. p. 317-330
1.3 O exame de seleção acontecerá no dia 04/03/2010, às 18h 30min, nas dependências do
CEFET/RJ, em sala(s) a ser(em) informada(s) no site da COLAT (Coordenadoria de Pós-
Graduação Lato Sensu), http://dippg. cefetrj.
br/index.php? option=com_ content&view=article&id=68&Itemid=70〈=br, após o
dia 01/03/2010 ou na Secretaria da DIPPG, exclusivamente no dia do exame.
1.4 O exame terá duração máxima de 2h (duas horas).
1.5 O candidato deverá apresentar-se no local da prova às 18h, munido do seu Cartão de
Inscrição e documento de identidade.
1.6 Após o início do exame de seleção não será permitida a entrada de nenhum candidato ao
local em que o mesmo será realizado.
1.7 O candidato só terá acesso ao(s) tema(s) a ser(em) desenvolvido( s) no momento da
produção do texto.
1.8 Não será permitido consultar nenhum tipo de material no momento do exame.
1.9 A seleção dos candidatos será realizada por uma Banca Examinadora, especialmente
designada para tal fim e constituída de servidores pertencentes ao quadro permanente de
docentes do CEFET/RJ e/ou profissionais que atuarão no curso proposto.
1.10 A análise do Curriculum Vitae e do texto argumentativo será realizada,
respectivamente, com base nos documentos apresentados, comprovados, e na capacidade de
produção de texto expressa pelo candidato. A avaliação dos candidatos obedecerá a critérios
que constam no Anexo 1 deste edital.
1.11 Não será permitida a permanência de crianças no espaço em que a prova escrita será
aplicada. A candidata que tiver necessidade de amamentar durante a realização das provas
deverá levar acompanhante que ficará em sala reservada para essa finalidade e será
responsável pela guarda da criança. A candidata que não levar acompanhante não realizará
as provas.




TÍTULO 2 - DAS VAGAS OFERECIDAS

2.1 Serão oferecidas 35(trinta e cinco) vagas.
2.2 O preenchimento das vagas do curso obedecerá rigorosamente à classificação final, até se
completar o número total das vagas oferecidas.
2.3 O CEFET/RJ se reserva o direito de não preencher todas as vagas previstas neste edital.

TÍTULO 3 - DAS INSCRIÇÕES

3.1 As inscrições serão realizadas na secretaria da DIPPG/CEFET/ RJ, no período de 01/02/2010
a 11/02/2010, de segunda-feira a sexta-feira, na primeira semana, e de segunda-feira a quintafeira,
na segunda semana, entre 8h e 16h. Avenida Maracanã, 229 - Bloco E-506 - Telefones
(021) 2566-3179 (Secretaria da Pós-Graduação).
3.2 No ato da inscrição, o candidato (ou seu representante legal) deverá apresentar:
o Ficha de inscrição devidamente preenchida, a ser obtida no endereço eletrônico
http://www.cefet- rj.br;
o Original e cópia da carteira de identidade;
o Original e cópia do CPF;
o Original e cópia do título de eleitor e comprovantes de votação na última eleição;
o Duas fotos de tamanho 3x4, recentes, em bom estado, não digitalizadas;
o Original e cópia do diploma de graduação (frente e verso) ou, em caráter provisório, da
declaração de conclusão do curso, se o diploma ainda estiver em processo de expedição
(no caso de apresentação de declaração, a cópia deverá, obrigatoriamente, ser
autenticada em cartório);
o Original e cópia do histórico escolar do curso de graduação;
o Curriculum Vitae, com cópias de documentos comprobatórios da formação e/ou
experiência anexados, elaborado de acordo com o modelo a ser obtido no endereço
eletrônico http://www.cefet- rj.br; (documentos comprobatórios de Títulos, Atividades
de Magistério, Atividades Profissionais não Docentes e Produção acadêmica
relacionada à área do Concurso deverão ser entregues em envelope separado em que
conste claramente o nome do candidato. Os documentos comprobatórios devem ser
dispostos na mesma ordem em que aparecem no Curriculum Vitae).

TÍTULO 4 - DAS INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES

4.1 Os candidatos não selecionados deverão retirar seus documentos no mesmo lugar onde
efetuaram a inscrição, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, contados a partir da divulgação
dos resultados. Após este prazo, o CEFET/RJ não mais se responsabiliza pelos documentos
entregues.
4.2 A lista de classificados será divulgada pela internet, em http://www.cefet- rj.br, no dia 08 de
março de 2010. Nesta mesma data, iniciam-se as matrículas para o curso. As matrículas serão
realizadas na secretaria da DIPPG, entre os dias 08/03/2010 e 12/03/2010, entre 8h e 16h.
4.3 Caso haja algum tipo de problema técnico ou imprevisto, o resultado será afixado na
secretaria de pós-graduação do CEFET/RJ.
4.4 Resultados e informações NÃO serão fornecidos por telefone. Todas as informações
inerentes à matrícula serão oferecidas no dia 08/03/2010 no sítio do CEFET/RJ ou na Secretaria
da DIPPG.
4.5 Serão considerados desistentes os candidatos classificados que não efetivarem a matrícula
no prazo estabelecido e, para ocuparem suas vagas, serão convocados os candidatos
imediatamente subsequentes da lista de classificados.

TÍTULO 5 - DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

5.1 A inscrição do candidato implica conhecimento e aceitação das normas e condições
estabelecidas neste Edital e em seus anexos, não sendo aceita alegação de
desconhecimento.
5.2 O exame de seleção só terá validade para o curso que será iniciado em 2010.
5.3 Os casos omissos neste Edital serão resolvidos pelo Diretor-Geral do CEFET/RJ,
ouvida a Comissão de Seleção.

Rio de Janeiro, 19 de janeiro de 2010

Miguel Badenes Prades Filho
Diretor-Geral do CEFET/RJ

ANEXO 1

O julgamento do Curriculum Vitae não terá caráter eliminatório, consistindo na
avaliação de:
Grupo I - Títulos:

2,0 pontos para conclusão de curso de pós-graduação lato sensu (360h)
1,0 ponto para conclusão de curso de atualização (180h)

Grupo II - Atividades de Magistério:

0,5 ponto por ano de experiência profissional em Educação Básica (Pontuação
máxima: 8 anos): 4,0 pontos.
Grupo III - Atividades Profissionais não Docentes:

Trabalhos ligados a movimentos sociais, ONGs, OSCIPs e/ou desenvolvidos em
projetos voltados para as populações negras (0,5 ponto por ano - Pontuação máxima: 6
anos) 3,0 pontos.

Grupo IV - Produção acadêmica dos últimos cinco anos relacionada à área do
curso.

0,2 ponto para cada artigo publicado em Anais de Congressos, Seminários e/ou
eventos similares. (Pontuação Máxima: 5 artigos) Total: 1,0 ponto
0,5 ponto para capítulo de livro ( Pontuação Máxima: 4 capítulos) Total: 2,0 pontos
1,0 ponto para organização de livros (Pontuação Máxima: 3 organizações) Total: 3,0
pontos
2,0 pontos para produção de livro acadêmico, científico ou didático (Pontuação
Máxima: 2 livros) Total: 2,0 pontos

OBSERVAÇÃO: A PONTUAÇÃO MÁXIMA ATRIBUÍDA AO CURRÍCULO SERÁ
10,0 PONTOS, EMBORA O TOTAL DA DISTRIBUIÇÃO DE PONTOS DOS ITENS
ACIMA ULTRAPASSE ESTE VALOR.

Texto Argumentativo - Pontuação Máxima - 10,0

Na produção do texto argumentativo, serão avaliados os seguintes pontos:
Clareza (coesão e coerência)
Capacidade de síntese e correção gramatical
Adequação ao tema proposto

TOTAL GERAL - 20,0 pontos

Para a contagem de pontos classificatórios, os pontos do Curriculum Vitae e da produção do
texto argumentativo serão somados e divididos por dois. [(Pontuação do Curriculum Vitae +
Pontuação do Texto Argumentativo) ÷ 2 = Resultado Final]
Em caso de ocorrer igualdade de pontuação entre candidatos, o desempate se dará atribuindo-se
melhor colocação ao candidato que tenha obtido a maior pontuação no texto argumentativo.
Se persistir o empate, serão considerados como critérios de desempate:
a) o maior tempo de atuação do Ensino Básico,
b) o candidato de mais idade.

ANEXO 2
1. DAS AVALIAÇÕES DO CURSO
o Cada uma das disciplinas do curso será avaliada por critérios estabelecidos pelo docente
que a ministrará. Em caso de trabalhos de final de disciplina a serem realizados fora do
ambiente da sala de aula, o discente terá 30 dias corridos para prepará-lo e entregá-lo ao
professor. O desrespeito ao prazo estipulado pode ter como conseqüência a reprovação
em todo o curso e a respectiva perda de matrícula.
o Ao ser constatado plágio ou qualquer tipo de cópia em qualquer um dos trabalhos
realizados pelo discente, o mesmo poderá ser reprovado e perder seu direito à matrícula.
o Como determina a Legislação, este curso é monográfico. A monografia deverá ser
entregue à secretaria da pós-graduação do CEFET/RJ até o último dia útil do mês de
março de 2011.
2. DA FREQUÊNCIA
o O curso será composto por 10 (dez) disciplinas.. Nove das disciplinas serão oferecidas
semanalmente, às terças e quintas-feiras. Uma delas, intitulada "Tópicos Especiais",
será oferecida uma vez por mês, preferencialmente às quartas-feiras (das 18h às 22h),
podendo, esporadicamente, caso haja necessidade, ser oferecida aos sábados (das 8h às
12h).
o De acordo com o regimento dos cursos de Pós-Graduação Lato Sensu do CEFET/RJ, a
frequência será obrigatória, só fazendo jus ao certificado de conclusão os alunos que
obtiverem 75% de frequência nas atividades programadas. Por atividades programadas
compreendem- se as aulas, debates, visitas técnicas, seminários, conferências e outras
atividades apresentadas como tal.
3. DO APROVEITAMENTO
o O aproveitamento será traduzido em notas de 0 (zero) a 10 (dez). Os estudantes que
obtiverem nota igual ou superior a 06 (seis) em cada disciplina e que tiverem a
monografia aprovada com nota mínima de 07 (sete) terão direito ao certificado de
conclusão do Curso de Especialização.
o O curso será considerado em sua totalidade, não admitindo o aproveitamento de
disciplinas feitas em outros cursos ou em anos anteriores.
4. DA ESTRUTURA
o O curso terá a seguinte composição: 480h (360 horas-aula presenciais e 120 horas-aula
de orientação e produção monográfica).
o O início do curso está previsto para segunda quinzena de março de 2010 e término
previsto para dezembro de 2010.


Roberto Borge
Coordenador do NEAB CEFET/RJ


http://br.groups.yahoo.com/group/discriminacaoracial/message/56376

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

O Estado não tem o direito de ostentar símbolos religiosos

Texto extraído do Jus Navigandi
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=14252

Átila Da Rold Roesler
Procurador federal da Advocacia-Geral da União, especialista em Direito Processual Civil


Reminiscências históricas e a questão do Preâmbulo constitucional

A análise da relação entre Estado e Igreja remonta à Antigüidade, onde muitas vezes se confundiam as figuras do Chefe de Estado e do líder religioso da época. Na Idade Média houve enorme influência religiosa nos Governos num período que ficou conhecido como "Era das Trevas" [01], onde as decisões políticas jamais eram tomadas sem a aprovação da Santa Igreja. Em terras brasileiras, tal relação foi bastante acentuada desde o início já que em seus primórdios o Brasil foi chamado de "Terra de Santa Cruz" e teve como primeiro ato solene a celebração de uma missa realizada em 26 de abril de 1500 pelo Frei Henrique de Coimbra.

A Constituição brasileira outorgada de 1824 estabelecia a religião católica como sendo a religião oficial do Império. As demais religiões só eram toleradas em seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma exterior de templo (art. 5.º). Além disso, só se permitia a elegibilidade para o Congresso àquelas pessoas que professassem o catolicismo. No Brasil, a separação entre Estado e Igreja só ocorreu oficialmente após a proclamação da República por meio do Decreto nº 119-A, de 17 de janeiro de 1890.

Conforme consagrado atualmente pela Constituição Federal de 1988, o Brasil é o Estado laico, isto é, não tem religião oficial. Com isso, se reafirma a separação total entre Estado e Igreja. Para afastar qualquer dúvida nesse sentido, a Constituição determina expressamente ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público (art. 19, inc. I).

Ora, por definição, Estado laico é Estado leigo, secular, neutro, imparcial, indiferente, não-confessional. Assim, há nitidamente um erro de interpretação quando se diz levianamente que o Estado brasileiro acredita em Deus pelo que foi estabelecido no Preâmbulo da atual Constituição:

"Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL" (grifei).

O Direito Constitucional ensina que o texto preambular não possui força cogente e só tem alguma utilidade quando é confirmado pelo texto normativo que integra a própria Constituição. Ocorre que o único ponto do Preâmbulo não reforçado pelo texto constitucional foi justamente a referência a Deus. Além de não reafirmado, o artigo 19, inciso I, como já visto, aponta justamente para o contrário. Na verdade, a única interpretação possível que se pode extrair do Preâmbulo é a de que a "proteção de Deus" invocada é pertencente somente à pessoa dos constituintes originários e seu caráter é meramente subjetivo.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal julgou improcedente o pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Partido Social Liberal – PSL contra o preâmbulo da Constituição do Estado do Acre, em que se alegava a inconstitucionalidade por omissão da expressão "sob a proteção de Deus", constante do preâmbulo da CF/88. Considerou-se que as invocações da proteção de Deus no preâmbulo da Constituição não tem força normativa, afastando-se a alegação de que a expressão em causa seria norma de reprodução obrigatória pelos Estados-membros. In verbis:

"[...] tomado em seu conjunto, esta locução ‘sob a proteção de Deus’ não é uma norma jurídica, até porque não se teria a pretensão de criar obrigação para a divindade invocada. Ela é uma afirmação de fato – como afirmou Clemente Mariane, em 1946, na observação recordada pelo eminente Ministro Celso de Mello – jactanciosa e pretensiosa, talvez – de que a divindade estivesse preocupada com a Constituição do Brasil. De tal modo, não sendo norma jurídica, nem princípio constitucional, independentemente de onde esteja, não é ela de reprodução compulsória aos Estados-membros". [02]

O trecho reproduzido acima não deixa quaisquer dúvidas de que, em virtude da ausência de caráter normativo do preâmbulo constitucional, a cláusula "sob a proteção de Deus" ali contida não pode servir a qualquer propósito interpretativo. E dessa forma consagra-se a plena liberdade de religião ou de crença do Estado brasileiro estabelecida em vários outros dispositivos constitucionais: art. 5.º, inc. VI, art. 19, inc. I, art. 150, inc. IV, b.

A consagração da liberdade religiosa plena

A liberdade religiosa se inclui entres as liberdades espirituais e sua exteriorização é forma de livre manifestação do pensamento. A Constituição previu essa liberdade de modo explícito (art. 5.º, inc. VI) e vedou qualquer relação que possa haver entre Igreja e Estado (art. 19, inc. I) consagrando o Estado laico como modelo a ser adotado de forma definitiva.

Não restam dúvidas de que "a conquista constitucional da liberdade religiosa é verdadeira consagração de maturidade de um povo" [03], como diz Alexandre de Moraes. O autor continua a ressaltar a importância do tema: "A abrangência do preceito constitucional é ampla, pois, sendo a religião o complexo de princípios que dirigem os pensamentos, ações e adoração do homem para com Deus, acaba por compreender a crença, o dogma, a moral, a liturgia e o culto. O constrangimento à pessoa humana, de forma a constrangê-lo a renunciar sua fé, representa o desrespeito à diversidade democrática de idéias, filosofias e à própria diversidade espiritual" [04].

Aliás, é preciso dizer que o Brasil é reconhecido como o maior país católico do mundo, conforme estudo publicado pela CNBB [05]. Entretanto, existem diversas outras religiões professadas pela população brasileira que, mesmo em sua minoria, merecem a proteção constitucional adequada. Afinal, a principal razão de um Estado não-confessional é garantir às pessoas que possam viver sua fé, seja ela qual for.

Além disso, o estado laico deve garantir o respeito e a tolerância à própria descrença, como anota Alexandre de Moraes: "a liberdade de convicção religiosa abrange inclusive o direito de não acreditar ou professar nenhuma fé, devendo o Estado respeito ao ateísmo" [06]. No mesmo sentido, Pontes de Miranda já alertava sob a ótica da Constituição anterior que: "o descrente também tem liberdade de consciência e pode pedir que se tutele juridicamente tal direito" [07], assim como a "liberdade de crença compreende a liberdade de ter uma crença e de não ter crença" [08].

A questão dos símbolos religiosos nos prédios públicos

Nessa perspectiva, parece claro que o Estado não tem o direito de ostentar símbolos religiosos, sejam eles quais forem. Mas em função da forte influência cristã em nossa sociedade, tornou-se bastante comum a colocação de crucifixos em repartições públicas, especialmente em escolas, no Judiciário e no Legislativo. Isso fez com que muitos não-cristãos se sentissem incomodados em sua fé e postulassem a sua retirada com base nos princípios constitucionais já citados. A questão não é nova e de certa forma já foi enfrentada pelo Judiciário, o que demonstra a polêmica do assunto. Entretanto, parece claro que um Estado neutro não poderia ser identificado com fé alguma.

Quando o assunto é esse, não têm faltado defensores dispostos a mitigar de forma inaceitável o consagrado princípio constitucional da liberdade religiosa em seu favor. Entre seus argumentos mais utilizados, consta que "a retirada de símbolos já instalados, mesmo que em repartições públicas, leva à alteração de uma situação já consolidada em um país composto por uma quase totalidade de adeptos da fé cristã, e agride desnecessariamente os sentimentos de milhões de brasileiros, apenas para contentar a intolerância e a supremacia da vontade de um restrito grupo de pessoas" [09].

Ora, levando-se tal argumento em consideração, parece que a suposta "agressão" é despropositada apenas em relação aos adeptos da fé cristã, sendo plenamente justificada quando envolve o sentimento da minoria da população não-cristã do país. Nesse sentido, não há qualquer fundamento que justifique que a religião majoritária deva merecer do Estado um tratamento especial do Estado. Provavelmente, isso iria instaurar um ciclo vicioso de desigualação entre crenças e que poderia culminar com a total aniquilação dos movimentos religiosos minoritários. Fosse querer reafirmar a laicidade do Estado brasileiro por esse meio, teríamos que ostentar nos prédios públicos uma incontável amostra de símbolos em alusão às diversas religiões que fazem parte da fé da população em geral, inclusive as de origem afro-brasileiras.

O que estabelece a Constituição é que o Estado brasileiro atualmente deve respeito a qualquer forma de crença religiosa e ao ateísmo indiscriminadamente, pouco importando se isso representa a "maioria" da população ou apenas uma minoria reprimida. Por isso, é evidente que o predomínio do Catolicismo no Brasil não justifica a ostentação de símbolos cristãos (crucifixo e Bíblia, p. ex.), em sua maior parte, nos órgãos públicos. A propósito do assunto, Roberto Arriada Lorea afirma que "o Brasil é um país laico e a liberdade de crença da minoria, que não se vê representada por qualquer símbolo religioso, deve ser igualmente respeitada pelo Estado" [10].

No mesmo sentido, Maria Cláudia Bucchianeri [11] escreveu o seguinte:

"A fixação ou manutenção, pelo Estado ou por seus Poderes, de símbolos distintivos de específicas crenças religiosas representa uma inaceitável identificação do ente estatal com determinada convicção de fé, em clara violação à exigência de neutralidade axiológica, em nítida exclusão e diminuição das demais religiões que não foram contempladas com o gesto de apoio estatal e também com patente transgressão à obrigatoriedade imposta aos poderes públicos de adotarem uma conduta de não-ingerência dogmática, esta última a assentar a total incompetência estatal em matéria de fé e a impossibilidade, portanto, do exercício de qualquer juízo de valor (ou de desvalor) a respeito de pensamentos religiosos" (grifei).

Outro argumento utilizado com frequência pelos religiosos favoráveis ao uso de símbolos cristãos em prédios públicos, especialmente nas dependências do Poder Judiciário, diz respeito ao fato de serem utilizados como "fontes de inspiração" [12] para a correta atuação dos agentes estatais. Inspiração para quê?, pergunta-se. Certa vez, Ives Gandra da Silva Martins chegou a escrever: "No caso da magistratura, os valores cristãos se tornam ainda mais fortemente ''fonte de inspiração'' para as decisões, uma vez que ''fazer justiça'' é, de certo modo, exercer um atributo divino. A justiça humana será tanto menos falha quanto mais se inspirar na justiça divina" [13].

Na verdade, essa afirmação do eminente Ministro deveria causar preocupação e estranheza já que a chamada "justiça divina" nem sempre se assemelha ao ideal de justiça consagrado na Constituição Federal e tido como modelo para a sociedade em que vivemos hoje. Pelo contrário, na leitura da Bíblia, um dos símbolos cristãos mais utilizados, é fácil encontrar atrocidades e massacres ordenados por Deus e perpetrados por seus seguidores, conforme relatado no "esquecido" Velho Testamento. De fato, a Bíblia possui modelos de comportamento ideais e não-ideais, mas a verdade é que ela não pode ser utilizada como "inspiração" ou tida como modelo de "justiça" a ser seguido.

Por outro lado, é sabido que o Conselho Nacional de Justiça – CNJ já decidiu que o uso de símbolos religiosos em órgãos da Justiça não fere o princípio de laicidade do Estado [14]. Entretanto, é preciso esclarecer que a questão não está resolvida. Isso porque o CNJ deixou a cargo dos juízes a decisão acerca da permanência de crucifixos nas paredes de suas salas de audiência. No Supremo Tribunal Federal, dois ministros já se manifestaram contra a manutenção do crucifixo localizado no plenário: Celso de Mello e Marco Aurélio. Significa dizer que as salas de audiência e Tribunais não são locais de culto, assim como nenhum outro órgão estatal. De fato, a Cruz afigura-se, desde sempre, um símbolo religioso específico da fé cristã, não podendo dissociar-se desse seu significado, o que afronta a opção constitucional pelo Estado laico que já se esperava ver consolidada.

No plano internacional, recentemente a Itália foi condenada pela Corte Européia de Direitos Humanos por ostentar crucifixos em Escolas Públicas no caso Lautsi v. Italy [15]. Já na Alemanha, o Tribunal Constitucional decidiu que a coerção de participar de uma lide sob a cruz, contrariando as convicções religiosas ou ideológicas do litigante, caracteriza uma intervenção na liberdade de crença do mesmo, que acabou por enxergar ali uma identificação do Estado com a fé cristã [16]. E em outra oportunidade, o Tribunal alemão decidiu que "a colocação de cruzes nas salas de aula ultrapassa os limites aceitáveis, pois a cruz não pode ser separada de sua específica referência ao conteúdo religioso da fé cristã" [17].

Considerações finais

O assunto tratado é polêmico justamente porque aborda a convicção religiosa das pessoas e trata de questões de fé. Entretanto, não se pode perder de vista que o Estado brasileiro é laico desde 1891, quando o catolicismo deixou de ser a religião oficial. Assim, a manutenção de ornamentos religiosos em repartições públicas que não sejam museus não faz mais qualquer sentido. É preciso dizer á exaustão que a sociedade brasileira não é composta apenas por cristãos. Representantes de outras religiões, agnósticos e ateus podem sentir-se constrangidos com a exibição ostensiva dos crucifixos. Estes merecem, como qualquer objeto religioso, todo o respeito, mas não precisam ter presença em edifícios oficiais.

Por outro lado, ainda que o número de cristãos supere em muito os adeptos das outras crenças, esse conflito "não deve ser resolvido segundo o princípio majoritário na medida em que o direito fundamental à liberdade de crença visa a proteção, de maneira especial, das minorias", conforme aponta Paulo Roberto Iotti Vecchiatti [18]. Aliás, a própria idéia de democracia é concebida como o regime jurídico de defesa dos direitos fundamentais das minorias.

Portanto, a linha adotada pelo Estado constitucional brasileiro deve ser de neutralidade absoluta frente às questões religiosas conforme estabelecido pela Constituição Federal. Dessa maneira, ostentar símbolos religiosos que fazem referência apenas a uma religião padece de qualquer carga de razoabilidade na medida em que o Estado deve tratar todas as crenças com igualdade, cabendo-lhe assegurar a coexistência pacífica entre as diversas religiões e mesmo diante do ateísmo.

|Notas

1. A idéia de "Idade das Trevas" foi concebida no Renascimento, reforçada pelo Iluminismo. Para o senso comum, uma prática do período, a alquimia - embrião da química -, relacionava-se normalmente à bruxaria. As práticas inquisitoriais da Igreja levaram à perseguição de pessoas e grupos que questionassem a instituição. A própria Igreja era vista equivocadamente como monopolizadora do saber, mas controlava principalmente o saber erudito. Outra instituição feudal era a servidão, lembrada negativamente como a submissão dos camponeses à exploração da nobreza (Cf. Veja Responde. Disponível em: http://veja.abril.com.br/vestibular/fuvest-2-fase-q02-historia.shtml, Acesso em 19/01/2010).
2. STF – Pleno – ADIN nº 2.076/AC – Rel. Min. Carlos Velloso, decisão: 15-8-2002. Informativo STF, nº 27.
3. Cf. Constituição do Brasil Interpretada, 7ª. Ed., São Paulo: Editora Atlas, 2007, p. 150.
4. Ob. cit.
5. Cf. Confederação Nacional dos Bispos do Brasil. A Igreja Católica diante do pluralismo religioso no Brasil. São Paulo: Paulinas, 1991, p. 13.
6. Ob. cit., grifei.
7. Cf. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969, t. V, p. 119.
8. Ob. cit.
9. CAPEZ, Fernando. "Laicidade não significa hostilidade contra fé", Consultor Jurídico, publicado em 01-09-2009, Acesso em 18/01/2010, Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-set-01/nao-religiao-oficial-nao-significa-hostil-crencas
10.
11. LOREA, O poder judiciário é laico. Folha de São Paulo, São Paulo, 24 set. 2005. Tendências/Debates, p.03. A condenação da Itália pela Corte Europeia de Direitos Humanos, por ostentar crucifixos em escolas públicas. Uma lição ao Brasil". Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2326, 13 nov. 2009. Disponível em: . Acesso em: 18 jan. 2010.
12. Cf. NOGUEIRA, Roberto Wagner Lima. O uso de crucifixos e bíblias em prédios públicos à luz da Constituição Federal . Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2123, 24 abr. 2009. Disponível em: . Acesso em: 19 jan. 2010.
13. O Estado Laico. O GLOBO, Primeiro Caderno, publicado em 14/04/2009.
14. Cf. Pedidos de Providência 1.344, 1.345, 1.346 e 1.362.
15. Cf. PINHEIRO, Maria Cláudia Bucchianeri. A condenação da Itália pela Corte Europeia de Direitos Humanos, por ostentar crucifixos em escolas públicas. Uma lição ao Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2326, 13 nov. 2009. Disponível em: . Acesso em: 19 jan. 2010
16. Cf. BverfGE 35, 366[375].
17. Cf. BVERFGE 93,1 de 16/05/1995.
18. (Cf. Laicidade Estatal tomada a sério. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1830, 5 jul. 2008. Disponível em: . Acesso em: 19 jan 2010.




Sobre o autor
Átila Da Rold Roesler é autor do livro Execução Civil – Aspectos Destacados (Editora Juruá, 2007); ex-Delegado de Polícia Civil do Estado do Paraná.

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Sobre o texto:
Texto inserido no Jus Navigandi nº2401 (27.1.2010)
Elaborado em 01.2010.
Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2000 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
ROESLER, Átila Da Rold. O Estado não tem o direito de ostentar símbolos religiosos . Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2401, 27 jan. 2010. Disponível em: . Acesso em: 27 jan. 2010.