Por Carlos Brickmann em 15/12/2009
O Flamengo ganhou o título, tendo no comando o grande Andrade. Imediatamente começou o noticiário vagamente ideológico sobre como os negros, embora sempre se destacassem no futebol, nunca chegaram a ser técnicos. Depois a coisa se sofisticou um pouco: admitiu-se a existência anterior de técnicos afrodescendentes e Andrade passou a ser apenas o primeiro negro a ganhar o título brasileiro. Pesquisa? Isso não, que dá trabalho.
É certo dizer que, no universo dos técnicos brasileiros, poucos são negros ou mulatos. Mas é falha de memória esquecer que Didi, por exemplo, foi técnico da seleção peruana; que Oto Glória, depois de vitoriosa carreira no Brasil, foi técnico da seleção portuguesa (aquela que nos eliminou da Copa de 1966); que Gentil Cardoso, o Moço Preto, cansou de ser campeão carioca numa época em que praticamente só havia torneios regionais no país (e chegou a dirigir a seleção brasileira por alguns jogos). Baltazar, o Cabecinha de Ouro, foi técnico; Serginho Chulapa é técnico; Zizinho e Coutinho foram técnicos de grandes clubes. Lula Pereira faz sucesso, especialmente no Nordeste. Cilinho, que montou excelentes times, é mulato; Bauer, O Monstro do Maracanã, era mulato, filho de suíça e africano; e mulato clarinho, mas longe de ser sueco, é Vanderlei Luxemburgo, que ganhou títulos brasileiros bem antes de Andrade (aliás, os dois jogavam no mesmo time, na década de 1980, época em que Vanderlei era Wanderley e ficava na reserva de Junior).
Foi Gentil Cardoso o autor de uma frase fantástica, válida no futebol e na vida: "Quem se desloca recebe, quem pede tem preferência." É dele também um pedido clássico, ao assumir a direção do Fluminense, em 1946: "Se me derem o Ademir eu lhes darei o campeonato." Deram-lhe Ademir Queixada, o grande ponta de lança, e o Fluminense ganhou o campeonato.
Racismo havia, e há: o número de técnicos negros é muito menor que o de brancos. Racismo já houve em maior intensidade: em 1960, Gentil Cardoso foi o primeiro negro a ser contratado por um clube que não aceitava negros, o Náutico do Recife. O que não há é, como se cansou de salientar o noticiário, a ausência total de negros em cargos de comando. Não são muitos, quando muitos teriam condições de exercê-los; mas existem e não é de hoje.
Força estranha
É interessante assistir ao futebol, hoje, e ver um negrão defendendo a seleção inglesa (como era fantástico ver Rudy Gullit na seleção holandesa). No Brasil, a presença do negro no futebol já foi muito contestada, e não faz tanto tempo assim. Friendereich, mulato de olhos verdes, não teve problemas; mas times como o Santos e o Palmeiras, por exemplo, demoraram a desistir das restrições raciais. O Santos, com seus uniformes brancos e jogadores brancos, chegou a ser conhecido como "As Melindrosas". No Palmeiras, fundado em 1914 com o nome de Palestra Itália, o primeiro negro foi Og Moreira, um craque, o regente do time, contratado em 1942. Depois viria o fantástico lateral Djalma Santos, já no fim da década de 1950; e só então se abririam de vez as portas do clube. Os três times do Recife rejeitaram negros até a década de 1960 (e o próprio técnico Gentil Cardoso só foi contratado pelo Náutico porque o presidente tinha dado plenos poderes aos diretores de futebol, e quando soube do caso e quis voltar atrás não havia mais jeito). Na seleção brasileira campeã do mundo em 1958, tentou-se ao máximo evitar negros no time titular – com exceção de Didi, cujo reserva, Moacir, também era negro, e Dida ou Pelé, que fosse quem fosse o titular seria preto. Já Garrincha e Djalma Santos entraram com o torneio em andamento.
A conquista do Flamengo (que, como o Corinthians, era chamado pejorativamente por algumas torcidas adversárias de "time de pretos"), e com um técnico negro no comando, poderia ter motivado os meios de comunicação para reportagens sobre o que resta de racismo no futebol. Nada de adjetivos, nada de ideológico, nem de conclusões apressadas sobre "o primeiro negro", essas coisas: reportagem mesmo. Nas peneiras dos clubes, há restrições a negros ou mulatos? E os salários da média dos jogadores (não, não vale colocar na lista ídolos como Adriano), variam conforme a cor da pele?
Andrade ganha bem menos que a média dos técnicos.
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=568CIR001
quarta-feira, 16 de dezembro de 2009
MÍDIA & PRECONCEITO : O racismo que é só um branco na cabeça
Postado por LUIZ FERNANDO MARTINS DA SILVA às 10:02
Marcadores: Discriminação, Notícias
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