terça-feira, 25 de maio de 2010

Minorias e positivismo


por: MARCUS ORIONE GONÇALVES CORREIA


Ações afirmativas, como as cotas para negros no ensino superior, podem ser eficiente meio para a queda de alguns desses mitos



ESTÁ PREVISTA para o início de março, no Supremo Tribunal Federal, audiência pública sobre políticas de ação afirmativa de reserva de vagas no ensino superior, em vista de ações judiciais que tratam do tema das cotas raciais. A relevância da matéria, e da manifestação a esse respeito pela suprema corte, é óbvia.


Enfrentando a questão das minorias, dentre elas a racial, percebe-se o seu tratamento na perspectiva essencialmente positivista.


Por minorias, entendem-se aqui grupos que, na perspectiva das relações de poder, encontram-se em estado de sujeição em face de outros a partir de certos aspectos, como racial, de gênero ou de etnia. Isso se dá ainda que tais agrupamentos sejam numericamente expressivos.


Já o positivismo, em apertada síntese, trata-se de método que almeja uma racionalidade para a explicação dos fatos sociais semelhante àquela típica das ciências naturais, prestigiando, com isso, as noções de organização e de uma suposta cientificidade hasteada na neutralidade axiológica.
O tema das cotas, não raro, sucumbe à tentação de ser tratado a partir de tais postulados. Para comprovar a assertiva, inicio pela ideia, advogada por vários, de que não existiria mais a noção de raça, o que seria confirmado pelo que há de mais moderno no estudo da genética. Com isso, não seriam possíveis ações afirmativas com base em algo que não existe.


Trata-se de constatação tipicamente positivista, que submete o tema da raça a uma investida meramente biológica, com clara insuficiência na resposta de matéria tão complexa. Aliás, o positivismo tem o costume de se apropriar das questões sociológicas a partir de categorias tipicamente biológicas, retirando a complexidade de algumas categorias e naturalizando as consequências mais nefastas.


Assim, quando se afirma que não existe mais sentido em falar em raça, especialmente em países como o Brasil, em que houve um elevado grau de miscigenação, olvida-se que, aqui, os principais centros de poder são ocupados por brancos.


Esquece-se, assim, que a matéria envolve o poder, o que afasta a disputa racial de meras ilações de natureza biológica -até mesmo porque a luta pelo poder se processa de forma distinta entre os animais irracionais.


Aliás, essa questão, para o direito e, portanto, em certa perspectiva do poder, já se encontra resolvida. A Constituição admite o conceito de raças em diversas oportunidades (como no seu artigo 3º, inciso IV).


Nos mesmos moldes, pode-se inserir, por exemplo, a discussão relativa às mulheres. Para essas, não raro se diz ser natural que, em vista da maternidade, sejam-lhes atribuídas mais funções no âmbito da vida privada do que ao homem.


Em um mundo tão competitivo e em que se fala constantemente em escassez de recursos, vive-se o pior pesadelo positivista: o de naturalizar a exclusão de alguns, por critérios como o racial ou o de gênero, para que outros possam melhor viver. E fica a triste constatação de que, se a natureza é seletiva porque é da sua essência, o mesmo jamais poderia se dar com seres humanos em suas relações sociais. Caso contrário, estaria autorizado, a partir de interpretações legalmente consentidas, verdadeiro estado de barbárie, em que se referendaria dissimulada antropofagia social.


Isso o direito não pode convalidar. Na realidade, o que se percebe é que tais argumentos, de índole positivista e que frequentemente assumem lugar no imaginário popular, escondem aspectos ideológicos de uma sociedade que pretende deixar claro o lugar que deve ser ocupado por cada um dos grupos eleitos como oprimidos. Redundam, portanto, em aspectos, aparentemente científicos para a preservação, por alguns, de seus espaços de poder, e precisam, para o bem de nossa sociedade, ser desmistificados.


Ações afirmativas, como as cotas para negros no ensino superior, podem consubstanciar, no contexto de uma política pública de inclusão social bem organizada, eficiente meio para a queda de alguns desses mitos.


O Brasil tem uma dívida social que precisa ser urgentemente resgatada.


Não podemos mais nos entregar a propostas que, de forma idealizada, sejam protraídas no tempo.


Afinal de contas, considerada a abolição da escravatura, o atraso para a solução do problema data de apenas mais de cem anos.


MARCUS ORIONE GONÇALVES CORREIA , 45, doutor e livre-docente pela USP, professor associado do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social e da área de concentração em direitos humanos da pós-graduação da Faculdade de Direito da USP, é juiz federal em São Paulo (SP).

FONT: Folha de São Paulo

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/indices/inde02032010.htm


segunda-feira, 24 de maio de 2010

PROFESSOR PARTICIPA DE OBSERVATÓRIO DA JUSTIÇA

PROFESSOR PARTICIPA DE OBSERVATÓRIO DA JUSTIÇA

O professor Paulo César Carbonari, do Instituto Superior de Filosofia Berthier (IFIBE), foi nomeado pelo Ministro da Justiça como membro do Conselho Científico do Observatório da Justiça Brasileira, que ficará sediado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenado pelo professor Leonardo Avritzer. A Portaria nº 823, que nomeou o Conselho, foi publicada no Diário Oficial da União de 24 de maio de 2010.

O Conselho Científico tem a responsabilidade de aprovar as áreas prioritárias de pesquisa e os editais de concursos das pesquisas sobre a Justiça Brasileira que serão desenvolvidas por instituições de ensino superior de todo o Brasil. O Conselho Científico é formado por 22 pessoas, entre elas, além do professor Carbonari, Paulo Abrão Pires Junior, Rogério Favreto, José Renato Nalini, Rogério Gesta Leal, Boaventura de Sousa Santos, José Geraldo de Sousa Junior, Antônio Carlos Wolkmer, Miracy Barbosa de Sousa Gustin e Oscar Vilhena Vieira.

O Observatório da Justiça Brasileira é baseado no Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, vinculado ao Ministério da Justiça de Portugal e coordenado pelo Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra. No Brasil, será implementado pela Secretaria de Reforma do Judiciário, em conjunto com a Secretaria de Assuntos Legislativos e a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Três eixos norteiam a criação do instituto: o aproveitamento das pesquisas acadêmicas para orientar futuras reformas, a avaliação dos seus efeitos por meio de diagnósticos e a construção de um banco de dados para replicar as boas práticas dos órgãos de Justiça e da sociedade civil. Também caberá ao Observatório analisar o desempenho das instituições que integram a Justiça brasileira, as recentes reformas aprovadas, além de sugerir novas formas gestão da Justiça e meios alternativos de resolução dos conflitos. A intenção é ampliar o acesso à Justiça, garantir maior celeridade processual e desenvolver políticas públicas que garantam os direitos fundamentais dos cidadãos.