domingo, 2 de agosto de 2009

Crítica a uso de bases militares explora antiamericanismo

São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009






ANÁLISE

Crítica a uso de bases militares explora antiamericanismo

Chávez conseguiu que América Latina desviasse atenção das armas vendidas pela Suécia à Venezuela encontradas com as Farc para reclamar de fato trivial

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente venezuelano Hugo Chávez é um gênio da propaganda. Conseguiu que a América Latina desviasse a atenção de um fato seríssimo -a Colômbia ter achado com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) foguetes antitanque AT-4 que foram vendidos pela Suécia ao Exército da Venezuela-, para começar a reclamar em uníssono contra um fato trivial: um pequeno aumento do número de militares americanos em cinco bases colombianas.
Chávez sabe explorar habilmente o antiamericanismo sempre latente na região.
Há vários motivos para um fato ser sério e outro, trivial. Armas das Forças Armadas de um país serem encontradas com a narcoguerrilha em um país vizinho é algo sério, ilegal e que mereceria investigação. Permitir que militares de um país amigo façam operações conjuntas e utilizem bases é algo trivial e legítimo em qualquer parte do mundo, desde que aprovado pelo governo local.
O aumento do número de militares e civis americanos na Colômbia já era esperado desde que o Equador decidiu não renovar a permissão para os EUA usarem a base aérea de Manta. Para os EUA poderem continuar fazendo voos com os aviões-radar de alerta antecipado E-3 Sentry AWACs e de patrulha marítima P-3 Orion, precisariam de novas bases.
Pode-se argumentar que os EUA vão mais que "triplicar" o número de militares. Mas o número em si é pequeno: de 250 para 800 militares, além de 600 contratados civis. Não é bem uma invasão.
A localização das bases também deixa claro que o foco é em operações contra traficantes, não um "cerco" à Venezuela, como reclamou Chávez. Há um fluxo de droga por mar e ar.
Duas das bases onde operam ou operarão os americanos estão no litoral do Caribe -a base naval Bolívar, em Cartagena, e a base aérea Alberto Pouwels, em Malambo (Barranquilla). Uma está no Pacífico -base naval Bahía Málaga, ideal para substituir Manta. E duas estão no interior -base aérea Palanquero, em Puerto Salgar, e base aérea Apiay, em Villavicencio.
Um detalhe óbvio está ausente: desde quando os EUA precisariam de bases na América Latina se quisessem intervir militarmente na região?
Há só uma superpotência militar no planeta hoje. Nenhum outro país tem o alcance global das Forças Armadas dos EUA.
Ter bases próximas de onde se queira atacar é útil, mas não essencial. Se quisessem bombardear Caracas e Chávez, não seria preciso uma base na Colômbia. Basta lembrar que os EUA usaram porta-aviões para atacar o Afeganistão em 2001.
Um porta-aviões nuclear USS Nimitz tem 100 mil toneladas de deslocamento. Carrega 85 aeronaves e quase 6.000 tripulantes. Basta um para varrer a Força Aérea Venezuelana do mapa. A Marinha dos EUA tem dez destes navios e um mais velho, o USS Enterprise.
O antiamericanismo era típico da época em que de fato os EUA intervinham militarmente na América Latina. Antes da Segunda Guerra, era rotina ter fuzileiros navais ocupando países como Cuba, Haiti, República Dominicana, Nicarágua. Depois, houve na Guerra Fria o apoio explícito a ditaduras para evitar novas Cubas.
Mas, com a redemocratização do continente a partir dos anos 80, desaparecem motivos e pretextos para intervenções.
Uma curiosa exceção aconteceu em dezembro de 1989, quando o então presidente americano George H. W. Bush ordenou a invasão do Panamá para derrubar o ditador e narcotraficante Manuel Noriega.
O mais novo porta-aviões nuclear dos EUA chama-se USS George H. W. Bush -nome que decerto desagrada a Chávez.



http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0208200905.htm


Inação de Obama acua imigrantes nos EUA

São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009


Inação de Obama acua imigrantes nos EUA

Grupos conservadores procuram dificultar a vida de irregulares para promover uma "autodeportação"

ANDREA MURTA
DA REDAÇÃO

Eleito com o apoio de grupos pró-reforma migratória e com um discurso favorável ao alcance da cidadania pelos estimados 12 milhões de irregulares nos EUA, o presidente Barack Obama não só protelou o debate do tema nos primeiros seis meses de governo como ainda fortaleceu algumas políticas da gestão anterior.
O resultado é que grupos conservadores se viram fortalecidos na tarefa de dificultar ao máximo a vida de imigrantes sem documentos, na esperança de que eles voltem voluntariamente a seus países -tática apelidada de "autodeportação".
Entre as ações mais polêmicas da nova Casa Branca estão aumento de acordos que permitem a policiais de municípios agir como agentes de imigração e o investimento em programas que checam o status legal de presos para deportar os que estão no país ilegalmente -ambas defendidas pelo ex-presidente George W. Bush.
No caso da checagem do status migratório dos presos, o governo recentemente alocou US$ 195 milhões para o próximo ano para expandir o programa dos atuais 70 condados (inclusive nas regiões de Miami e San Diego) para o restante do país até 2012, quando passará a custar US$ 1 bilhão por ano.
Mas a política mais criticada pelos grupos pró-imigrantes é mesmo a atuação de policiais locais como agentes de imigração. "Comunidades que ajudaram a eleger o presidente Obama acreditavam que haveria mudanças. Há uma crescente sensação de traição pelo fato de o governo estar abraçando e fortalecendo as políticas mais contraproducentes da era Bush", disse em comunicado na última semana Chung-Wha Hong, diretora da ONG Coalizão da Imigração de Nova York.

De grão em grão
O adiamento da reforma migratória favorece advogados como Kris Kobach, um dos líderes do movimento anti-imigração ilegal nos EUA. Kobach se tornou, nos últimos anos, o mais conhecido defensor de Estados e municípios interessados em coibir a presença de irregulares em seus territórios.
Ele acredita que a melhor forma de agir não é nem tentar deportar os 12 milhões de irregulares nem oferecer uma anistia. "O caminho é aumentar gradualmente a fiscalização, para que se torne mais difícil aos irregulares violar a lei. Assim, eles deixarão o país por conta própria", disse à Folha.
Nos tribunais, ele argumenta a favor de legislações regionais que, entre outros, punam proprietários que alugam imóveis a irregulares e empregadores que os contratam. Ele também defende a obrigatoriedade do uso do "e-verify", um programa de computador no qual empregadores checam na base de dados do governo se um empregado estrangeiro tem autorização para trabalhar nos EUA.
Kobach rejeita críticas de que usa os tribunais para mudar políticas federais. "O que faço é ajudar instâncias locais a definir a lei onde ela é vaga."
Segundo ele, não houve mudanças visíveis nos casos em que ele leva aos tribunais desde que Obama assumiu. Ele reclama, porém, da percebida diminuição do ritmo de batidas dos agentes de imigração em locais de trabalho em busca de ilegais, tática que sob Bush teve aumento de mais de 966% entre 2002 e 2008.
Até agora, os números não o decepcionaram. Dados da ICE (agência federal de imigração) indicam aumento de 18% nas deportações em entre outubro de 2008 e junho último, em relação ao mesmo período do ano fiscal anterior. O número assume nova dimensão quando se leva em conta que em 2008 houve recorde em deportações, com 349 mil casos.
Do outro lado da disputa, grupos pró-imigrantes alertam sobre riscos de deixar a questão migratória nas mãos de agentes locais. Segundo Foster Maer, advogado do grupo Latino Justice, "se policiais agem como agentes de imigração, as pessoas param de denunciar crimes por medo de ser questionadas sobre seu status legal, o que as torna mais vulneráveis a ataques e abusos".
O advogado, que já enfrentou Kobach nos tribunais, diz que "tornar a vida dos imigrantes mais difícil não os afastará dos EUA". "O que veremos é o crescimento de uma subclasse, especialmente de latinos, que vai se afundar cada vez mais em um submundo", disse à Folha


http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0208200906.htm